Prefeitura de Itu nomeia interventor para concessionária privada de água
Gestão será fiscalizada em 180 dias e, se houver problemas, empresa pode perder contrato


A Prefeitura de Itu, município do interior paulista que tornou-se símbolo de revolta contra a falta de água em São Paulo, acaba de dar um duro golpe à concessionária responsável pelo abastecimento hídrico dos seus 155.000 habitantes. O prefeito Antonio Tuíze (PSD) decidiu pela intervenção administrativa na concessiónaria Águas de Itu, do Grupo Bertin pela falta de transparência na gestão da empresa e para garantir o abastecimento de água. "Acabou o relacionamento amigável entre o poder concedente, que é a prefeitura, e a concessionária. Com essa intervenção, nós vamos fazer uma auditoria contábil e fiscal em toda a empresa", disse o prefeito à imprensa. O interventor nomeado pelo prefeito, Elso Marques, vai assumir temporariamente, até 180 dias, a gestão dos serviços e as obras de saneamento na cidade.
Durante a estiagem do ano passado, na mais grave crise de água pela que passou o município, os moradores sofreram um rodízio de dez meses que se traduziu em severos cortes de abastecimento de até semanas em alguns bairros, houve protestos violentos e os caminhões-pipa passaram a ser escoltados pela polícia. Itu é um dos 304 municípios brasileiros que delegou sua gestão de água total ou parcialmente a uma empresa privada.
Se a auditoria da Prefeitura concluir que os investimentos que entraram na Águas de Itu não foram aplicados diretamente na cidade, o prefeito afirma que pode chegar até a caducidade do contrato e à extinção da concessão da controladora, com quem foi assinado um contrato de 30 anos em 2007. Em agosto, conforme noticia o portal G1, a prefeitura já havia anunciado que um novo grupo iria assumir o abastecimento de água no município, a Águas do Brasil, que iria criar a concessionária Águas da República. As negociações se sucederam mas, em novembro, um novo anúncio informava que a empresa havia desistido de comprar o direito à prestação dos serviços da atual concessionária e Águas de Itu continuaria com a gestão.
Se a Prefeitura resolver cancelar seu contrato com a companhia e não houver mais interessados em assumir o serviço, Itu poderia ser um dos poucos municípios do Brasil a remunicipalizar seu serviço de abastecimento. Hoje, a prefeito afirma que a administração municipal não teria condições de assumir a tarefa, mas não descarta essa hipótese no futuro. A recuperação da gestão pública da água é considerada uma tendência global que, desde 2000, vem se repetindo em 235 cidades, como Paris, Berlim ou Buenos Aires.
A intervenção é mais um desdobramento do atrito que protagonizam a companhia e a Prefeitura durante esta crise hídrica. O último enfrentamento veio por conta do reajuste da tarifa e que deve ser decidido na Justiça. A concessionária havia anunciado um aumento de 11% mas a Prefeitura o rebaixou, por meio de decreto, a 4,4%.
A companhia diz não conhecer detalhes sobre as intenções da Prefeitura, mas afirmou, por meio de nota, que tem agido de "forma correta não só na efetivação dos investimentos – mais de 150 milhões de reais – mas especialmente no respeito à população". A empresa afirmou também que, nos últimos três anos, não conseguiu autorização para praticar "os reajustes previstos no contrato de concessão, o que gerou envolvimento da Justiça, que decidiu que atualizar os valores das tarifas tem mérito e não contraria qualquer cláusula contratual".
A Águas de Itu, que garante que nunca houve qualquer irregularidade na concessão, completou seu posicionamento lançando uma alfinetada à gestão municipal. "O ato de intervenção de hoje teve cenas agressivas, que colocaram em risco colaboradores da concessionária". Questionada sobre o que estabelece o contrato de concessão diante uma possível rescisão por parte da Prefeitura, a companhia não respondeu.
Enquanto o conflito se resolve nos bastidores, os relatos de falta de água voltam a ocupar as conversas nas ruas de Itu. Depois de alguns meses de respiro, graças às chuvas de verão, um novo inverno sem nada nas torneiras ameaça se repetir.