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‘La Bombonera’ resolverá a ‘trilogia de maio’ do futebol argentino

River ganha por 1-0 o segundo superclássico argentino seguido A volta no estádio do Boca resolverá a eliminatória da Libertadores

Carlos E. Cué
Carlos Sánchez celebra seu gol contra o Boca Juniors.
Carlos Sánchez celebra seu gol contra o Boca Juniors.GUIDO BECK (EFE)

A trilogia de maio, como os argentinos chamam os três jogos Boca-River seguidos, já está pronta para o episódio final. O Boca ganhou o primeiro, o do campeonato, com um 2 a 0 definitivo em casa. O River devolveu e ganhou ontem à noite o segundo, a ida das oitavas de final da Copa Libertadores, com um 1 a 0 de pênalti depois de uma partida dificílima. Tudo será decidido na Bombonera na próxima quinta-feira. Dessa trilogia sairá um campeão da batalha eterna entre os dois grandes times argentinos.

O River entrou para ganhar e sobretudo para defender seu gol. Isso incluiu entradas duríssimas, que o levaram a ficar com dez no fim, quando já não importava. O Boca, que se acreditava favorito, poderia ter marcado várias vezes, mas não conseguiu. Depois de 18 partidas invicto, escolheu o estádio menos adequado para sua primeira derrota de 2015. Uma partida em que podia acontecer de tudo, mas que no fim foi decidida por um pênalti claro e bem absurdo aos 37 do segundo tempo, marcado por Carlos Sánchez. O River dominou, sobretudo no primeiro tempo, mas não o suficiente para ficar tranquilo até o apito final.

River e Boca, dois estádios, duas torcidas, dois mundos que começaram juntos, na região da Boca, o bairro dos imigrantes, perto do rio, tão contaminado que ninguém queria morar ali e por isso era para onde mandavam os recém-chegados, os que desciam dos barcos que fugiam da fome europeia com esperança, mas sem dinheiro, e só podiam arcar com um quarto dividido em um conventillo (cortiço). O River deixou o sul de Buenos Aires onde nasceu e mudou-se para o rico norte. Desde então é dos milionários, que não querem saber nada do bairro em que o time nasceu e onde continua seu eterno rival.

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O acesso aos dois estádios denota diferenças evidentes. À Bombonera se chega por terrenos baldios cheios de lixo. Ao Monumental o acesso é feito pela Avenida del Libertador, uma das mais caras de Buenos Aires. Na Bombonera tudo é apertado, inclusive os radicais da camisa 12, fechados por um vidro blindado que, visto do outro lado, dá a sensação de se estar observando uma criatura perigosa e cheia de vida. No Monumental todos os espaços são abertos e entre o público e o campo há uma pista de atletismo, o que impede essa sensação de peso nas costas descrita pelos jogadores na Bombonera, onde mal há lugar para bater os escanteios.

Aparentemente, a torcida do River não canta muito menos do que a do Boca. Pelo menos quando o arquirrival está à sua frente. É um falso mito. Gritam e têm longas músicas que todo o estádio canta, como os outros. Mas têm um grande problema: são muito menos ouvidas. Seus cânticos simplesmente se elevam ao vento, os cânticos dos rivais se apertam e podem ser notados no corpo nessa caixa de bombons inacabada que é o estádio do Boca. Uma caixa de ressonância perfeita. Mas os milionários também gritam, tanto que os aviões que passam a cada cinco minutos para aterrissar no vizinho Aeroparque mal são ouvidos.

Os cartazes que enchem o estádio são dos mesmos bairros populares que se vê na Bombonera. Com algumas diferenças, sobretudo devido à localização norte-sul, as duas equipes são interclassistas, grandes e ricas. Mas nem tanto quanto seus irmãos na Espanha, Itália ou Reino Unido, que levam quase desde crianças as melhores estrelas argentinas, deixando o futebol local nas mãos de promessas ultrajovens, descartes e estrelas veteranas que voltam à terra para passar seus últimos anos. Acima de tudo, as duas equipes, que antes anunciavam cervejas argentinas, agora usam na camiseta a marca de um conhecido banco espanhol, um dos mais importantes da Argentina, onde os espanhóis dominam boa parte do mercado financeiro.

O River e o Boca se unem por outras semelhanças, como o nível dos crimes cometidos pelos chefes de suas torcidas organizadas, as barras bravas. Os do Boca acabam de criar um conflito entre o Governo e o time, porque queriam voltar ao estádio depois de cumprir pena. Um deles foi processado por homicídio. O que foi líder da torcida do River, Alan Schlenker, acaba de ser condenado por assassinato.

Alheios à guerra nas arquibancadas, River e Boca passaram pela primeira fase de testes com o domínio do River. Era como se três superclássicos seguidos fossem demais e os jogadores estivessem cansados de tanta pressão. Mas logo depois de começar a segunda parte, a emoção voltou. O Boca saiu a toda, e esteve a ponto de marcar duas vezes no primeiro minuto. Dominava. Mas aí estava a torcida milionária.

Em todos os estádios do mundo, jogar em casa ajuda. Mas na Argentina, onde o público todo não para de cantar a partida inteira, a torcida é um jogador chave. E aí estava o Monumental para ajudar. “Vamos, milionários, é preciso botar mais ovos, esta noite custe o que custar, temos que ganhar”, gritavam. “Eu só quero é ser campeão na Bombonera”, animavam com o canto de sempre para o superclássico. E o River reagiu.

Durante um bom tempo, o Boca parecia sem fôlego. Mas o River perdoava. Como aconteceu na semana passada antes dos dois gols nos últimos cinco minutos, a coisa parecia encaminhada a um empate. Até que veio o pênalti e o gol. E aí, depois do 1 a 0, o River pôde encerrar a partida. Mas o Boca foi salvo por seu goleiro, que conseguiu deixar as coisas prontas para que a Bombonera decida. E ali de novo a torcida fará sua parte, o que, na Argentina, está muito acima da média.

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