O vice-presidente dos EUA vai se reunir com Rousseff durante a Copa do Mundo
O encontro pode dar início à reconciliação diplomática entre os dois países depois do escândalo da NSA
A incipiente reconciliação diplomática entre os Estados Unidos e o Brasil, depois do golpe da espionagem em massa da NSA, ficará mais clara em junho, em alto nível, numa reunião entre o vice-presidente norte-americano, Joe Biden, e a presidenta brasileira, Dilma Rousseff.
Desde meados de abril era sabido que Biden visitará o país em junho para assistir a um jogo da Copa do Mundo e havia muitas especulações sobre uma hipotética reunião com Rousseff, mas esta ainda não era anunciada oficialmente. Até que nesta quarta-feira a secretária de Estado adjunta de Assuntos do Hemisfério Ocidental dos EUA, Roberta Jacobson, confirmou a informação durante sua intervenção na assembleia anual do Conselho das Américas. “O vice-presidente tem previsto assistir à Copa e vai se reunir com a presidenta Rousseff quando o faça”, revelou Jacobson.
O Itamaraty evitou confirmar o anúncio do Departamento de Estado. “De fato, Joe Biden virá assistir a um jogo do Mundial, não se sabe se no Recife, ou em Natal [cidades sede da Copa]. Mas se vai se encontrar com Dilma não podemos confirmar. Pode ser que sim, ou não. Há uma possibilidade porque representa um chefe de Estado. Mas há muitos representantes que vêm, e temos que ver se as agendas vão casar nesse período”, disse um representante da assessoria de imprensa, informa Carla Jiménez, de São Paulo.
A responsável pelo Hemisfério Ocidental admitiu que a relação bilateral viveu um “período difícil” pelas revelações de que os EUA monitoraram o e-mail da mandatária brasileira, mas ela mostrou-se confiante de que a aproximação ganhará vigor nos próximos meses. “A relação continua, embora alguns meios digam que ela está congelada”, afirmou depois de ser perguntada sobre o clima atual de entendimento entre os dois gigantes do continente.
Jacobson insistiu que para os Estados Unidos a aproximação do Brasil é vital e que por isso, à margem do distanciamento governamental, mantém-se uma sólida vinculação econômica, turística, cultural ou esportiva. Nesse sentido, lembrou que, junto com a China, o Brasil é o único país no qual Washington está abrindo novos consulados e destacou que há uma “crescente interação” entre as populações.
Tomando como exemplo a visita de Biden, a diplomata avaliou que a relação “está melhorando” em nível governamental e previu que ganhará velocidade depois das eleições presidenciais no Brasil em outubro.
Em 2011 o presidente dos EUA, Barack Obama, visitou o Brasil e em 2012 Rousseff foi aos EUA. Foi o reflexo da melhora progressiva nas relações depois do mal-estar em Washington com a mediação, em maio de 2010, do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na crise nuclear iraniana. Há cerca de um ano o vice-presidente Biden e Rousseff já haviam se reunido em Brasília. O clima de entendimento entre os dois gigantes era enorme. O momento da consolidação definitiva das relações que aspiram a ser do mais alto nível entre as duas maiores economias e democracias do continente americano teria seu ápice com a distinta visita de Estado de Rousseff a Washington em outubro de 2013.
No entanto, as revelações em setembro do ex-analista da NSA Edward Snowden da espionagem em massa sobre a presidenta e seu círculo próximo fizeram saltar pelos ares todo o progresso alcançado e dilapidaram a confiança de Brasília com Washington. Depois de saber que era amplamente escrutada pelos EUA, Rousseff decidiu cancelar sua reunião com Obama. À margem de suas consequências políticas, a espionagem da NSA foi um fator chave para que o Governo brasileiro se decidisse pelo fabricante sueco Saab, em vez da norte-americana Boeing, para fechar uma encomenda milionária de aviões de combate.
Desde então, uma melhoria gradual foi-se consolidando até o ponto em que no final de março o embaixador do Brasil nos EUA, Mauro Vieira, disse que a mandatária “deseja muito vir” a Washington para recuperar a entrevista pendente com Obama. Mas deu a entender que dificilmente se produzirá antes das eleições presidenciais de outubro em Brasil.
O Governo de Obama deu explicações para o assunto Rousseff, sobre os longos tentáculos da NSA e seus planos de reforma, mas não chegou à preciosa desculpa oficial reclamada por Brasília. Em paralelo, produziram-se alguns gestos conciliadores de ambas as partes: em dezembro as autoridades brasileiras descartaram categoricamente qualquer possibilidade de conceder asilo a Snowden, enquanto os EUA somaram-se à iniciativa brasileira na ONU de debater a importância da privacidade na Internet, além de participar em abril da conferência internacional sobre a governança na rede, promovida por Rousseff. Também em março viu-se um novo gesto de aproximação por parte da Administração norte-americana com as visitas do secretário do Tesouro, Jack Lew, e também de Jacobson, a Brasília.
Apesar deste incipiente degelo, as duas potências mantêm alguns pontos de fricção em diversos assuntos à margem da NSA. O Brasil, por exemplo, tem que decidir se impõe represálias comerciais contra os EUA por seu contencioso pelos subsídios à produção de algodão. E, no terreno diplomático, Washington gostaria que Brasília abraçasse uma atitude bem mais crítica com a repressão do Governo venezuelano contra os protestos de oposição.
Em paralelo às esferas políticas, os empresários de ambos países têm pressionado os dois Governos a deixar para trás o escândalo Snowden e relançar a relação bilateral, conscientes da magnitude e do potencial do vínculo econômico. Segundo os últimos dados do Departamento de Estado, o Brasil é o oitavo parceiro comercial dos EUA, que são os primeiros investidores estrangeiros no gigante emergente; enquanto os EUA são o segundo destino das exportações brasileiras. Em 2012, o intercâmbio comercial bilateral alcançou os 76 bilhões de dólares.
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