O último lar de nove cabeças da repressão de Pinochet
Imagens inéditas de um canal de TV exibem o traslado ao cárcere de um grupo de violadores de direitos humanos durante a ditadura
Nove ex-chefes da polícia secreta de Augusto Pinochet, cabeças dos órgãos de repressão da ditadura, foram transferidos de prisão no dia 28 de setembro do ano passado. O então presidente Sebastián Piñera determinava o fechamento do Penal Cordillera - onde os ex-militares cumpriam suas condenações com confortos excepcionais - e seu traslado à prisão Punta Peuco, um recinto que reunia 44 violadores de direitos humanos. Na época, os detalhes da mudança não se tornaram públicos e somente neste domingo, em uma reportagem do Canal 13 da televisão local, os cidadãos puderam conhecer a operação e ver nas imagens alguns dos principais responsáveis pelas mortes e desaparecimentos de cerca de 3.000 chilenos entre 1973 e 1990.
Entre os ex-militares trasladados encontravam-se Manuel Contreras (1929), ex-diretor da Dirección de Inteligencia Nacional (DINA), condenado a duas prisões perpétuas e trezentos anos de cárcere privado por crimes de lesa humanidade. Junto a seus oito colegas, deixou o Penal Cordillera de madrugada e, apesar do horário, em torno de 200 pessoas os esperavam na saída. “Assassinos! Adeus criminosos!”, gritavam as pessoas. A investigação de Canal 13 revela a chegada dos ex-colaboradores de Pinochet a seu novo destino, a 60 quilômetros ao norte de Santiago de Chile, na localidade de Tiltil. Mesmo oferecendo melhores condições que o resto dos cárceres chilenos, tem mais medidas de segurança e uma infraestrutura adequada a um recinto penal. De início, como mostra a reportagem televisiva, os presos devem compartilhar os sanitários, como a totalidade dos presos nas prisões chilenas.
“Não posso carregar nada, tenho outra hérnia na coluna”, disse Contreras quando os encarregados do centro penitenciário de Punta Peuco lhe pediram para recolher seus pertences e levar até sua habitação.
Miguel Krassnoff (1946), que cumpre prisão perpétua, filho e neto de integrantes da brigada especial da antiga URSS, que em 1947 foram fuzilados no pátio da Cárcel de Lefortovo após ser condenados pelo tribunal supremo daquele país, recorreu a ironia: “Há pebolim?”, perguntou quando viu o jogo em uma das salas. “Que maravilha!”, exclamou. O fechamento do Penal Cordillera, que era semelhante a um centro recreativo, era esperado há anos pelos grupos de direitos humanos e a decisão de Piñera foi um sinal potente no meio das comemorações pelos 40 anos do Golpe de Estado de 1973, que surpreendeu seu grupo político. O ex-presidente foi um dos poucos dirigentes de direita que votou não no plebiscito de 1988. E, com o objetivo de entregar novos ares a seu bloco, que não pôde se desfazer das heranças da ditadura, irritou a direita chilena quando em setembro passado falou da existência de “cúmplices passivos” do regime de Pinochet.
Piñera tomou a decisão de fechar o Penal Cordillera, localizado na base de Los Andes, na zona oriente de Santiago de Chile, depois das declarações de Contreras, que em uma entrevista negou ter participação em qualquer delito e assinalou que os servidores públicos de prisões estavam para “lhe sustentar a bengala”. As palavras do ex-militar irritaram as famílias das vítimas e abriu-se um intenso debate social sobre as condições nas quais vivia este grupo: banheiros privados, água quente, televisão, computadores e jardins com grama.
Os ex-militares resistiram à medida e um deles, aproveitando uma permissão penitenciária, se suicidou em seu domicílio antes do traslado. Era Odlanier Mena (1926), ex-chefe da Central Nacional de Informaciones (CNI) que atuou entre 1977 e 1990. Os outros presidiários transferidos são Hugo Salas Wenzel, César Manríquez, Jorge del Río, Marcelo Moren Brito, Pedro Espinoza, David Miranda y José Zara.
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