Sindicatos franceses declaram guerra à reforma trabalhista de François Hollande
O projeto mais simbólico do Governo abre uma batalha da qual depende o futuro do socialismo francês
A dura reforma trabalhista do Governo francês já é o projeto mais simbólico e polêmico do mandato de François Hollande, embora o texto ainda não tenha sido apresentado oficialmente. O futuro do socialismo francês ficará marcado por essa iniciativa. A ala esquerda do Partido Socialista –atualmente no poder–, os radicais, os movimentos estudantis e os sindicatos iniciaram um confronto com o Executivo para que este retire o projeto ou modifique-o radicalmente. Nesta quarta-feira acontecerá o primeiro grande protesto de rua, mas os sindicatos estão preparando uma greve e uma mobilização geral no dia 31. Assim comunicaram na segunda-feira, no palácio de Matignon, ao primeiro-ministro, Manuel Valls, um dos principais defensores reforma qualificada como “liberal” por seus detratores.
Apesar de não revogar a sagrada lei das 35 horas de trabalho semanal, o projeto a dinamita por meio dos fatos. Além disso, amplia e facilita as demissões por motivos econômicos –quatro trimestres de prejuízos ou declínio no faturamento– e reduz os tetos das indenizações por demissão –15 meses de salário em vez de 24 a 27 para os trabalhadores com mais de 20 anos de casa. Além disso, os acordos entre a comissão sindical e os patrões em cada empresa ficarão acima dos acordos setoriais, o que enfraquece as organizações de trabalhadores.
Se para a França é “vital” uma reforma como essa, nas palavras de Valls, para os sindicatos é mais um passo para a “precariedade empreendida por muitos Governos europeus”, segundo Philippe Martinez, líder da CGT, o principal sindicato francês. E para a ala radical dos socialistas, é o exemplo mais claro do “desvio liberal” do Governo. Somente a entidades patronal e vários líderes do partido conservador de Nicolas Sarkozy, os Republicanos, apoiaram o conteúdo do projeto.
Num país que resistiu às profundas reformas exigidas pela União Europeia, pela Alemanha e por vários fóruns econômicos internacionais, a aposta nessa reforma trabalhista chega apenas 14 meses antes das eleições presidenciais, quando a popularidade de Hollande volta a estar em mínimos históricos (17 % de aprovação). Por isso o presidente tentou acalmar os ânimos: atrasou até o dia 24 a apresentação do projeto –prevista inicialmente para o dia 9– para dar tempo para organizar consultas com os sindicatos como a desta segunda-feira e prometeu que suas posições serão levadas em consideração.
Proposta amplia e facilita as demissões por motivos econômicos, entre outros
De acordo com várias informações divulgadas nos últimos dias, Valls ameaçou demitir-se caso o projeto sofra mudanças profundas, embora o primeiro-ministro negou ter tido essa reação diante de Hollande. A entidade patronal, que na terça-feira será recebida por Valls, já manifestou seu medo de “descontos” numa reforma “que vai na direção certa”.
Junto com Valls, participam das reuniões com líderes sindicais a ministra do Trabalho, Myriam El Khomri, e o ministro da Economia, Emmanuel Macron, o outro membro do Executivo que a esquerda culpa por esse “desvio liberal”.
Um mês para negociar e pressionar
Estas são as datas-chave que o Governo e os sindicatos determinaram no que se refere à reforma trabalhista:
- Dias 7 e 8: Valls conversa separadamente com os sindicatos e a entidade patronal. Reunião do Partido Socialista.
- Dia 9: Protestos de estudantes e sindicatos. Greve de trabalhadores ferroviários.
- Dia 14: Valls se reúne conjuntamente com os sindicatos e a entidade patronal.
- Dia 17: Reunião dos 7 sindicatos mais críticos.
- Dia 24: Apresentação do projeto pelo Governo.
- Dia 31: Greve geral.
Nem o atraso nem a abertura de negociações acalmaram os ânimos. Organizações estudantis, apoiadas por sindicatos, mostrarão sua capacidade de mobilização na quarta-feira, em 120 atos de protesto em toda a França. Enquanto isso, um manifesto de repúdio ao projeto, promovido por uma ex-colaboradora de Hollande e por vários ministros, já recolheu mais de 1,1 milhão de assinaturas num fenômeno inédito nos últimos anos no país.
A batalha apenas começou, mas tem todos os ingredientes para ser a maior dos cinco anos de mandato de Hollande, a que mais consequências terá para o socialismo francês, para a luta entre socialdemocratas e liberais-sociais e para o futuro do presidente e do primeiro-ministro. A luta também servirá para conhecer o limite das reformas, até agora tímidas, que o Executivo quer ou pode fazer. Ou pelo menos sua ala menos socialdemocrata.
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