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Preocupados com o coronavírus até nos sonhos

Apesar de serem desagradáveis, os pesadelos nos ajudam a enfrentar situações difíceis

É preciso manter (ou recuperar) rotinas para dormir bem.
É preciso manter (ou recuperar) rotinas para dormir bem.Elena Shikova (Getty Images)
Jaime Rubio Hancock

Alguns de nós estão tendo problemas para dormir durante o confinamento: há noites em que é mais difícil conciliar o sono e outras em que despertamos antes da hora. Às vezes até dormimos mais horas, e ainda assim acordamos mais cansados. A tudo isso são adicionados, em muitos casos, pesadelos nos quais o coronavírus aparece.

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Nestes dias de confinamento, dormir pior é normal, segundo a neurologista Milagros Merino, membro do comitê científico da Sociedade Espanhola do Sono. A médica observa que estamos passando por “muita ansiedade” e “estresse permanente". Além da preocupação com a situação, sobrevém a incerteza: “Não sabemos quando isso terminará ou como será nossa vida quando terminar”.

Diego Redolar, neurocientista e pesquisador dos estudos de Ciências da Saúde da Universitat Oberta de Catalunya, a UOC, concorda e observa que, com o confinamento, “perdemos sinais externos que ajudam nosso cérebro a regular os ritmos circadianos”. A luz e os hábitos sociais (como sair à rua para ir trabalhar ou parar para almoçar) ajudam nosso cérebro a “saber em que momento do dia estamos”. O que inclui a hora de dormir. Muitos desses hábitos se perderam nos últimos dias “e os sinais externos falham”, o que pode acabar afetando a qualidade do sono.

Um sono mais leve e fragmentado

A incerteza e a ausência de rotinas claras podem fazer com que seja mais difícil dormir ou que o sono se torne fragmentado, com mais despertares. Como lembra Redolar, podemos acordar angustiados como também é comum que em nossos sonhos e pesadelos apareça a Covid-19. Rastreando o Twitter, vemos que há pessoas que sonham que enfrentam o vírus com um exército, que vão trabalhar em um hospital (sem ter nem ideia de como é isso, claro), que chegam a ter 51 graus de febre e até que um aspirador de pó tipo robô pode espalhar a doença.

Redolar lembra que os sonhos têm um papel importante na regulação das emoções. Esses devaneios são um mecanismo adaptativo que facilita o gerenciamento das emoções e nos ajuda a enfrentar situações novas. Qualquer conflito com um alto conteúdo emocional é suscetível de aparecer em nossos sonhos. Isso inclui, é claro, a preocupação com um vírus que se espalha facilmente e parece estar em toda parte, incluindo lugares e objetos que sempre foram inócuos para nós, como os aspiradores de pó do sonho mencionado.

Embora os pesadelos sejam desagradáveis, Redolar explica que nosso cérebro está treinando ao simular situações emocionalmente difíceis, para que ensaiemos e antecipemos as reações. Se no dia seguinte nos deparamos com uma condição semelhante, “o impacto será menos” e lidaremos melhor com o problema, tendo pois já nos colocamos na pior situação enquanto dormíamos. O preço que às vezes pagamos em troca desse treinamento é uma qualidade de sono pior.

Guardando as distâncias, é algo parecido com o momento em que os estudantes na época dos exames sonham que estão atrasados ​​para a aula, sem ter estudado e sem ao menos levar um mísero lápis.

Recuperar e manter hábitos saudáveis

Apesar das circunstâncias não serem fáceis, a dra. Merino mostra otimismo moderado e ressalta que, em muitos casos, o confinamento pode ser uma oportunidade para adotar “hábitos razoáveis ​​e regulares”, especialmente no caso de crianças, “que toleram menos as mudanças de rotina”.

A neurologista aponta a higiene do sono, que é sempre essencial e que especificamente nestes dias pode facilitar nosso descanso. Tanto ela como Redolar recomendam manter horários regulares, evitar jantares pesados ​​e, à tarde, não consumir estimulantes como cafeína, tabaco e chocolate. Eles também lembram da necessidade de fazer algum exercício, mas não no final do dia, para não nos energizarmos perto da hora de dormir.

Outro hábito que devemos criar é o de fugir das telas antes de ir para a cama. Como lembra Redolar, nosso cérebro interpreta a luz azul de celulares e tablets como se fosse a luz do dia e se ativa. Embora o modo noturno desses dispositivos não nos afete tanto, o neurologista acrescenta outra recomendação: tentar não ler nem comentar notícias sobre o coronavírus antes de ir para a cama (nem sobre nada que nos preocupe em geral). Se continuamos a pensar no assunto na cama, será mais difícil adormecer e também mais provável que o problema entre em nossos pesadelos.

Obviamente, o confinamento tem alguma vantagem relacionada ao sono: Merino lembra que as pessoas que passaram a trabalhar online de casa podem dormir um pouco mais, pois tiveram encurtado o tempo do trajeto para o trabalho, e até tirar uma soneca na metade do dia, de 15 ou 20 minutos. Para alguns, pode parecer muito pouco tempo para uma sesta de verdade, mas é o que os especialistas recomendam: se dormirmos mais de meia hora, podemos cair em um sono profundo e nos levantar menos revigorados.

A dra. Merino alerta que, quando retornarmos à normalidade, teremos que passar a introduzir mudanças graduais alguns dias antes, para voltar a madrugar sem perder horas de sono. Mas, com sorte, até lá não teremos mais pesadelos.

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