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Homem negro é libertado nos EUA após passar 43 anos preso por crime que não cometeu

Kevin Strickland foi condenado em 1978 a cadeia perpétua, quando tinha apenas 19 anos, por triplo assassinato

Kevin Strickland, de 62 anos, depois de ser solto nesta terça-feira, 23 de novembro, nos EUA.
Kevin Strickland, de 62 anos, depois de ser solto nesta terça-feira, 23 de novembro, nos EUA.Rich Sugg (AP)
Yolanda Monge

Kevin Strickland foi condenado a cadeia perpétua quando tinha apenas 19 anos por um triplo assassinato ocorrido em Kansas City, em 1978. Aos 62 anos, e depois de passar 43 deles atrás das grandes, um juiz do Estado de Missouri o absolveu nesta terça-feira por considerar ter havido um erro judicial. Strickland, um homem negro, é o réu que mais anos passou preso no Missouri por causa de um erro e um dos que mais tempo ficou injustamente preso na história dos Estados Unidos.

Em sua sentença, o magistrado James Welsh conclui que não existiu “nenhuma prova física que implicasse Strickland diretamente” no assassinato de 25 de abril de 1978 de Sherrie Black, Larry Ingram e John Walker em Kansas City. Eles foram amarrados e fuzilados por um grupo de quatro pessoas na ocasião.

“Strickland foi condenado unicamente pelo depoimento de uma testemunha, [Cinthya] Douglas, que mais tarde voltou atrás em suas declarações, nas quais havia identificado como um dos quatro autores” do crime, argumenta Welsh em sua resolução. O juiz pediu então “a soltura imediata” do preso.

O primeiro julgamento de Strickland foi nulo, já que o único membro negro do júri popular não o considerava culpado. Em um segundo processo, no qual o júri popular estava composto somente por brancos, o então jovem de 19 anos foi considerado culpado. Strickland, que foi detido quando sua filha tinha apenas sete semanas de vida, sempre se disse inocente.

Tanto uma das sobreviventes do crime, Cinthya Douglas, como um dos autores do triplo homicídio, Vincent Bell, contaram em varias ocasiões que estava atrás das grandes o homem errado. No caso de Douglas, morta em 2015, um advogado chegou a dizer a ela que não tentasse reabrir o caso para que não fosse acusada de perjúrio.

Quatro meses depois da prisão de Strickland, Bell disse em um tribunal que Douglas “havia cometido um erro do demônio” ao confundir Strickland com outro adolescente que formava parte do grupo de assassinos. Bell insistiu várias vezes durante seu processo que Strickland nunca esteve na cena do crime.

Citado pelo jornal The Washington Post, L. R. Strickland, irmão do preso, relata que o veredito da época não o surpreendeu dada a situação de violência e aversão pelos negros que se vivia em Kansas City e seu entusiasmo pela “justiça bíblica”. “Acredito que esta cidade queria que alguém fosse responsável”, disse. “Só sei que senti um grande alívio que meu irmão não fosse condenado a morte.”

Segundo o Registro Nacional de Exonerações, das universidades de Irvine em Califórnia e Michigan, e citado pela agência France Press, cerca de 2.500 pessoas absolvidas pela justiça nos últimos 30 anos passaram uma média de quase 14 anos em prisão, com um máximo de 47 anos e dois meses.

Finalmente, Douglas, a mulher que sobreviveu ao crime escreveu um e-mail em 2009 ao Midwest Innocence Project, uma ONG que ajuda indivíduos presos e condenados injustamente. Em seu texto, Douglas solicitava informação sobre como ajudar “alguém acusado erroneamente”. “Isso aconteceu em 1978, fui a única testemunha visual e as coisas não estavam claras naquele momento, mas agora sei mais e, se possível, quero ajudar a essa pessoa.”

Quando Strickland soube que Douglas morreu sem se retratar formalmente do depoimento que resultou em sua prisão, sentiu que a possibilidade de ser solto desapareceria para sempre. A partir desta terça-feira, Strickland é um homem livre que declarou que seus dois desejos eram ir à tumba de sua mãe, falecida no último verão, e ver o mar pela primeira vez em sua vida.

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