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Pedro Castillo força seu primeiro-ministro a renunciar após 69 dias de Governo no Peru

O presidente decide pela mudança de Guido Bellido “a favor da governabilidade” após vários confrontos em seu Gabinete

Pedro Castillo e Guido Bellido, juntos em 29 de julho passado.
Pedro Castillo e Guido Bellido, juntos em 29 de julho passado.ANGELA PONCE (Reuters)

O presidente do Peru, Pedro Castillo, impôs nesta quarta-feira a renúncia de seu primeiro-ministro, Guido Bellido. Em mensagem à Nação, o presidente ratificou o compromisso do seu Governo com o investimento privado e com a resolução dos problemas de “saúde, fome e pobreza”, e na sequência anunciou a saída do político “a favor da governabilidade”. Bellido representava no gabinete a posição do político de esquerda radical Vladimir Cerrón, líder do partido com o qual Castillo chegou à presidência, e havia gerado inúmeros confrontos internos nos dois meses de sua vida no Executivo. Com esse movimento, Castillo parece querer bater na mesa diante daqueles que duvidam de quem realmente detém o poder no Governo: o presidente ou o próprio Cerrón, por meio do primeiro-ministro.

A última altercação ocorreu na semana passada. O primeiro-ministro tuitou uma mensagem dirigida ao consórcio que opera o maior campo de gás do país, para avisá-los de que, se não concordassem em renegociar o percentual que pagam ao Estado, o Governo nacionalizaria ou recuperaria o recurso. Com a ameaça, o primeiro-ministro dilapidou em poucas horas a confiança empresarial que Castillo conquistara dias antes em uma visita aos Estados Unidos, onde se reuniu com presidentes executivos de mineradoras e farmacêuticas, convidando-os a manter seus investimentos e oferecendo garantias de estabilidade, e com os presidentes do Banco Mundial e do BID. A taxa de câmbio atingiu seu máximo histórico na última semana, com 4,12 soles por dólar.

O primeiro-ministro também convidou publicamente o ministro das Relações Exteriores, Oscar Maúrtua, a renunciar depois que o vice-chanceler comentou que o Peru não reconhecia nenhuma autoridade legítima na Venezuela desde janeiro. O congressista do Peru Libre compartilha da posição ortodoxa de esquerda de Cerrón a favor do Governo de Nicolás Maduro. Na sexta-feira à noite, em uma reunião de três horas no Palácio do Governo, mais da metade dos ministros questionou os anúncios de Bellido sobre questões que não haviam sido previamente tratadas ou debatidas no gabinete.

Em sua mensagem à nação, Castillo reiterou que, conforme anunciou em sua passagem pelos Estados Unidos, ratifica o compromisso do Governo com o investimento privado, para que opere “sem corrupção e com responsabilidade social”. “Pelo compromisso do meu Governo de abordar como prioridade os grandes problemas que o país tem —saúde, fome, pobreza—, decidi tomar algumas decisões a favor da governabilidade”, acrescentou em mensagem televisiva na qual questionou a maneira de fazer política do Bellido, embora tenha lhe agradecido por seus serviços.

“O equilíbrio de poderes é a ponte entre o Estado de direito e a democracia, deve garantir a tranquilidade e a coesão do Governo. A interpelação, a questão da confiança e da censura não devem ser utilizadas para criar instabilidade política. O Peru espera muito de suas autoridades, é hora de colocar o Peru acima das ideologias e posições isoladas“, disse o professor rural e sindicalista de esquerda.

Castillo anunciou que um novo gabinete será empossado nesta noite. A imprensa peruana antecipa que o substituto de Bellido será a advogada de Cajamarca Mirtha Vásquez, ex-presidente do Congresso entre novembro e julho. Vásquez também é defensor dos direitos humanos há mais de uma década e político moderado de esquerda.

A primeira reação da oposição veio da presidenta do Congresso, María del Carmen Alva, que apoiou a decisão do chefe de Estado. “Após vários dias de incerteza desnecessária e ministros altamente questionados, saudamos a decisão do presidente Castillo de mudar o Gabinete ministerial”, tuitou. Bellido retornará ao seu assento na bancada parlamentar do Peru Libre.

Uma nomeação polêmica

Desde que Bellido chegou ao Governo, gerou desconforto na elite política e econômica por sua falta de experiência na gestão pública, mas também porque o consideravam o representante de Cerrón no Governo. Alguns analistas duvidaram de quem realmente tinha poder: se o presidente Castillo ou Cerrón, por meio do primeiro-ministro. A fratura dentro do Gabinete também ficou clara desde o primeiro dia. Em julho, a posse de dois ministros teve de ser adiada quando se soube que Bellido lideraria o Gabinete. Pedro Francke, ministro da Economia, e Aníbal Torres, ministro da Justiça e Direitos Humanos, pediram a Castillo garantias de que Cerrón não interviria nos assuntos do Gabinete.

Esta é a segunda baixa no Gabinete em 69 dias. Dezenove dias após a posse como chanceler, o Governo pediu a demissão do sociólogo e escritor Héctor Béjar, após a polêmica que gerou devido as declarações que fez antes do mandato como ministro. Béjar comentou em um chat na internet que o Sendero Luminoso não foi o primeiro a ter atividades terroristas no Peru, referindo-se a sabotagens e crimes cometidos por membros da Marinha na década de 1970.

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