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Rafael Correa enfrenta primeiro grande julgamento por corrupção no Equador

Corte nacional do país sul-americano inicia julgamento do ex-presidente, nove de seus altos funcionários e 11 empresários por uma rede de subornos em troca de contratos públicos

O ex-presidente do Equador, Rafael Correa, durante uma entrevista em Bruxelas, em outubro de 2019.
O ex-presidente do Equador, Rafael Correa, durante uma entrevista em Bruxelas, em outubro de 2019.Francisco Seco (AP)

Há dois dias-chave nos próximos meses para o futuro do ex-presidente equatoriano Rafael Correa, embora nenhum tenha ainda uma data concreta. O primeiro será aquele em que a Corte Nacional de Justiça do país sul-americano ditará a sentença pelas acusações de corrupção e suborno, iniciado na segunda-feira e que tem o objetivo de desvendar uma suposta rede de financiamento ilegal do Alianza PAIS, partido com o qual Correa governou durante dez anos no Equador. O segundo, que ainda não se sabe se será em setembro ou em outubro, será a abertura da fase de inscrição de candidatos às eleições presidenciais de 2021, às quais Correa pretende se apresentar como número dois.

Se a sentença por suposta corrupção for adiantada, complicaria a intenção de Correa de participar do processo eleitoral como número dois de um candidato de sua confiança, imitando a fórmula de Cristina Fernández de Kirchner na Argentina, conforme anunciado pelo ex-presidente há três meses em uma entrevista ao EL PAÍS. O ex-presidente latino-americano, processado à revelia já que reside na Bélgica e tem uma ordem de prisão no Equador, declarou agora ao canal russo RT que o processo criminal tem o objetivo claro de complicar seu retorno à linha de frente da política equatoriana, mas calcula que o tempo corre a seu favor. “Mesmo que a sentença saia em novembro, seria em primeira instância”, disse, ponderando que poderia recorrer e se inscrever como candidato nas eleições. “Estão desesperados para evitar minha participação porque sabem que vamos derrotá-los”.

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O processo penal contra Correa e outros 20 acusados de um suposto crime de suborno punido com até cinco anos de prisão durará vários meses, levando em conta as mais de 800 provas que as partes anunciaram que apresentarão. Também há cerca de cem testemunhas chamadas a confirmar a teoria da acusação fiscal de que Correa era líder de uma “rede criminosa” que pressionava as grandes empresas a pagar propinas se quisessem obter contratos com o Estado ou, caso contrário, a desmontar essa tese com a estratégia da defesa de desvirtuar todo o processo criminal. Segundo os advogados, o caso foi forçado pelo Ministério Público e não existe uma única prova. É uma perseguição política, defendem os advogados de Correa. Para tentar dilatar as fases processuais, a defesa lançou mão de inúmeros recursos e formalidades jurídicas.

O Ministério Público iniciou a investigação em abril do ano passado, depois de uma publicação jornalística do portal MilHojas na qual foram expostos os nomes em código dos altos funcionários e dos empresários supostamente envolvidos na rede, os valores entregues em subornos e a forma de pagamento: em dinheiro ou com notas fiscais em troca de serviços que não foram prestados ou cujos valores foram inflados.

Naquele momento o caso se chamava Arroz Verde, pois era o nome do documento em que, segundo a publicação, as entregas de dinheiro eram contabilizadas e se referia à cor corporativa do partido de Correa, Alianza PAIS. Depois foi rebatizado de caso Subornos 2012-2016, os anos durante os quais, segundo o Ministério Fiscal, atuou a rede de aportes financeiros irregulares de campanha no valor de mais de sete milhões de dólares (cerca de 30 milhões de reais).

A Procuradoria Geral do Estado, que atua como acusação por um prejuízo ao país estimado em 21 milhões de dólares (aproximadamente 90 milhões de reais), afirmou que “demonstrará que Rafael Correa desempenhou dois papéis: um no topo da pirâmide, como ordenador de gastos; e outro na base, como beneficiário”. Juntamente com Correa e os empresários, também estão sendo processados seu vice-presidente, Jorge Glas; seu secretário jurídico, Alexis Mera; seus ministros Vinicio Alvarado, Walter Solís e María de los Ángeles Duarte –mais um ex-assessor desta última–; os membros da assembleia de seu partido Viviana Bonilla e Christian Viteri e duas funcionárias da presidência.

Pamela Martínez, assessora de Correa em Carondelet, e a assistente desta, Laura Terán, são duas peças-chave do caso. Elas mantinham uma contabilidade dos pagamentos e das instruções que seguiam para fazer com que os empresários pagassem um “pedágio”, termo usado pelo Ministério Público, em troca da obtenção de contratos de obras públicas. Entregaram, em colaboração com a investigação, um caderno com anotações precisas dos valores e documentos de apoio, como arquivos de Excel e e-mails.

A relação com a Odebrecht

Um dos empresários acusados de pagar subornos, Pedro Verduga, admitiu na segunda-feira perante a Corte Nacional que entregou dinheiro e que o fez sob pressão da assessora presidencial Pamela Martínez. Na investigação jornalística inicial constava também a Odebrecht como uma das empresas que pagaram propinas a altos funcionários do Governo de Correa, mas a construtora brasileira finalmente ficou de fora da acusação.

“Uma imprensa um pouco séria estaria investigando como um ex-presidente pode ter 30 processos criminais, vice-presidente na prisão, chanceler com ordem de prisão, secretária jurídica, ministros etc. sem que se tenha encontrado um centavo de dinheiro sujo, nenhuma conta secreta, exceto as do próprio Governo atual, que escondem descaradamente. (...) Objetivo: impedir-nos de participar das próximas eleições. Falam de subornos da Odebrecht, mas nem sequer a acusam”, questionou Correa em janeiro em sua conta no Twitter quando foi feita a convocação formal do julgamento e a Odebrecht ficou definitivamente fora do processo criminal.

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