Rotas alternativas ao bloqueio do canal de Suez não são viáveis para todos e oferecem risco de ataques
Operação para resgatar o ‘Ever Given’ será reforçada no domingo enquanto 248 navios estão engarrafados. Volta pelo Cabo da Boa Esperança serve apenas para grandes navios e é alvo de piratas
A crise comercial global desatada na terça-feira, quando o navio porta-contêineres Ever Given bloqueou o canal de Suez, se agrava. Com a navegação suspensa desde quinta até novo aviso, e diante da possibilidade de que a delicada operação para fazer com que o barco encalhado volte a flutuar possa demorar dias e até semanas, algumas empresas navais já começaram a desviar seus barcos através da rota que circunda a África, apesar de ser mais longa e complicada.
O engarrafamento no canal de Suez atrapalha as grandes empresas navais. E estas, diante da incerteza, já se movem e mudam as rotas de seus navios. “A perspectiva é, no mínimo, de 10 dias de espera. Por isso os barcos que estão saindo agora da Ásia receberam outra rota para não entrar na fila de Suez até que o engarrafamento seja resolvido”, dizem fontes de uma das grandes do setor. A Autoridade do Canal de Suez, dizem as fontes, tenta não perder tráfego futuro, e afirmam que quando a passagem for reativada circularão pelo canal 85 barcos por dia no lugar dos 50 habituais. Apesar disso, os clientes pressionam as empresas e estas escolhem alternativas seguras.
Um dos primeiros barcos que optaram por desviar sua rota foi o Ever Greet, um navio de carga operado pela empresa EverGreen, a mesma que a do barco preso no canal de Suez, de acordo com Michelle Wiese, uma analista de transporte marítimo e editora da empresa especializada em informação sobre comércio marítimo Lloyd’s List. Na direção contrária, na rota de regresso à Ásia, o primeiro meganavio que tomou o caminho do Cabo da Boa Esperança para evitar o canal de Suez foi o HMM Rotterdam, seguido depois pelo HMM Dublin, segundo Wiese, que destaca que a Hyundai Merchant Marine, uma das principais empresas de contêineres do mundo, parece ser a primeira a desviar seus serviços.
A empresa alemã Hapag-Lloyd, que tem seis barcos bloqueados no canal de Suez, também anunciou na sexta-feira que outros seis de seus navios foram redirecionados à rota africana. Além disso, a dinamarquesa Moller-Maersk, uma das maiores empresas navais de transporte de contêineres do mundo —possui 22 barcos parados no canal de Suez—, também desviou dois barcos pelo Cabo da Boa Esperança, de acordo com confirmação de um porta-voz da empresa.
O dilema para as empresas navais neste momento é o tempo estimado em que o Ever Given continuará encalhado no canal de Suez bloqueando sua circulação nas duas direções. Se as empresas acharem que a operação se resolverá rapidamente, um cenário que parece cada vez mais distante, podem decidir esperar. Por outro lado, se calcularem que irá demorar muito e que a fila que está provocando a paralisação será muito longa, podem optar, então, por circundar o Cabo da Boa Esperança, uma viagem que, em média, leva 10 dias a mais do que a que atravessa o canal de Suez.
Ameaça dos piratas
Por enquanto, o objetivo da operação de resgate liderada pela Autoridade do Canal de Suez passa por dragar para eliminar a areia e o lodo da área da proa do Ever Given, tarefa para a qual foi enviado ao local três dragas, segundo um comunicado do porta-voz da empresa Bernhard Schulte Shipmanagement, encarregada das questões técnicas do navio.
Também estão tentando reduzir os níveis de água no espaço vazio de proa do navio e na sala de hélice de proa. Apesar disso, todas as tentativas de fazer o navio voltar a flutuar fracassaram, de acordo com o mesmo comunicado. A empresa afirma que a equipe se prepara para receber outros dois rebocadores no domingo, o que sugere que a operação aumentará. De acordo com a Lloyd’s List, já há 248 barcos na fila esperando.
A opção de dar a volta pelo Cabo da Boa Esperança, entretanto, não parece viável para todos os navios, somente aos grandes petroleiros e grandes porta-contêineres que têm uma capacidade de combustível suficiente para fazê-lo, como diz Soledad Álvarez, professora e especialista em negócio marítimo. Por outro lado, os barcos menores, que representam “um número importante”, não poderão fazê-lo ou terão que parar em escalas intermediárias para reabastecer para consegui-lo, acrescenta Álvarez.
Outro aspecto que algumas empresas navais devem contemplar no caso de se desviarem pela rota africana é a ameaça que a pirataria representa para alguns navios, especialmente os barcos que precisam parar para reabastecer. Em 2020, os incidentes de pirataria no mundo, 195, aumentaram em relação aos 162 registrados em 2019, segundo um relatório do International Maritime Bureau, que atribui o aumento principalmente ao golfo da Guiné, onde se concentraram mais de 95% do número de tripulantes sequestrados, assim como o estreito de Singapura.
Apesar disso, a Marinha dos Estados Unidos afirma que sua comunicação com empresas navais sobre as preocupações no âmbito marítimo da região se manteve constante e nega que tenha ocorrido um aumento nos últimos dias. A comandante Rebecca Rebarich, porta-voz da 5ª Frota dos Estados Unidos, afirmou ao EL PAÍS que seu diálogo com o transporte marítimo comercial sobre ameaças como a pirataria foi “contínuo nos últimos dias”. Porta-vozes da Maersk e da Hapag-Lloyd também disseram que não é uma grande preocupação.
OS ESTADOS UNIDOS OFERECEM SUA AJUDA AO EGITO
Os EUA oferecem seu apoio ao Egito nos trabalhos para desbloquear o canal de Suez. A Casa Branca disse na sexta-feira que está negociando com o país árabe para ver como poderia ajudar “da melhor forma” nos esforços para reabrir o canal. Enquanto isso, cresce a preocupação pelo dano que o engarrafamento do Ever Given pode causar nas redes de abastecimento globais. Segundo a assessoria Euler Hermes, o fechamento do canal pode custar entre 6 e 10 bilhões de dólares (34 a 56 bilhões de reais) por semana ao comércio mundial.
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