Globo de Ouro 2020: muita série para pouco prêmio
No domingo o prêmio enfrenta o desafio de manter sua relevância em um mundo com cada vez mais produções
A Netflix publicou há alguns dias uma lista com os conteúdos mais vistos por seus usuários em 2019. À frente ficou Mistério no Mediterrâneo, um filme da casa, estrelado por Jennifer Aniston e Adam Sandler e visto, de acordo com a própria plataforma, por mais de 30 milhões de usuários depois de sua estreia em 14 de junho do ano passado. Em segundo lugar aparece a terceira temporada de sua principal série, Stranger Things, que —sempre segundo a plataforma— se tornou a mais assistida na história da Netflix em julho, com 40 milhões de reproduções no primeiro mês (das quais apenas 18,2 milhões terminaram todo o conjunto de capítulos). Foi seguida por um filme de ação de Michael Bay lançado por ela, 6 Underground; pela fantasia épica The Witcher, que conseguiu entrar na lista apesar de ter sido lançada em 20 de dezembro; por The Umbrella Academy, a série de uma família de super-heróis, e por alguns filmes lançados e criados pela Netflix: O Irlandês, de Scorsese, na quinta posição; Operação fronteira, com Ben Affleck e Oscar Isaac, na sétima, e Estrada sem lei, uma produção sobre Bonnie e Clyde com Kevin Costner na décima posição. Tirando o filme de Scorsese, que estreou nos cinemas, todos esses títulos têm algo em comum: nenhum deles aspira a um único Globo de Ouro, o prêmio mais internacional da televisão, que será entregue na noite de domingo em Los Angeles.
Em dezembro a Netflix se tornou o estúdio que mais recebeu indicações para uma única edição do Globo de Ouro: 17, por suas estreias no cinema e outras tantas por suas séries, entre as quais figuram as queridinhas dos críticos, como The Crown, Unbelievable, The Politician e O método Kominsky. Naquele dia, a plataforma também começou a encarnar a encruzilhada na qual, cada vez mais, está se concentrando a produção televisiva. O número de estreias de séries aumenta a cada ano, de 487 em 2017 ao recorde de 530 produções apenas nos Estados Unidos em 2019; com uma oferta cada vez maior é mais complicado não apenas dizer o que é o melhor de cada ano, mas alinhar público e crítica em tendências concretas. A relevância de um prêmio depende disso.
Até agora, a tradicional tensão entre as mais assistidas e as mais premiadas havia permanecido em um relativo equilíbrio. Mad Men, que teve uma audiência notavelmente baixa durante suas sete temporadas, acabou ganhando cinco Globos de Ouro (três como melhor série dramática e dois de melhor ator principal, Jon Hamm). Mas no outro extremo está The Walking Dead, a série de zumbis, considerada um produto minoritário, mas que está no ar há dez temporadas: cinco delas como a série mais assistida da televisão norte-americana e nove como a mais assistida por televisão a cabo. Ao menos foi indicada ao Globo de Ouro de melhor série dramática. Público e crítica se alinharam nisso. Foi em sua primeira temporada, em 2010. Naquele ano, 216 séries foram feitas.
Em 2019, o enorme número de produções teve especiais dificuldades para se encaixar nas cinco indicações dos 11 prêmios que a Associação da Imprensa Estrangeira de Hollywood entrega desde 1944. Desde que foram anunciadas, em 9 de dezembro, a crítica lamentou a falta de grandes favoritas: Olhos que condenam, sobre o racismo em Nova York dos anos oitenta, ou Boneca Russa, uma fantasia existencialista (ambas na Netflix). O público pergunta onde está Game of Thrones, de longe a série mais assistida no ano passado, ou Euphoria (ambas da HBO). E no meio, o Globo de Ouro, que durante anos foi a marca progressista que equiparava a televisão ao cinema, uma espécie de Oscar com menos espartilhos, ou seja, com mais liberdade. Em 2009, o prêmio da Academia aumentou para dez os indicados ao melhor filme, precisamente para não dar as costas aos favoritos do público. Agora, o Globo de Ouro deve decidir o que fazer com tantas séries.