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OCDE melhora de novo sua previsão de crescimento global graças ao forte empurrão dos Estados Unidos

Projeção para o PIB mundial fica em 5,8%, enquanto Brasil deve crescer 3,7% em 2021, e 2,5% em 2022. Organização alerta para o papel crucial da vacinação em massa para o crescimento dos países

Pessoas aproveitam o Centra Park, em Nova York no último dia 23 de maio. REUTERS/Caitlin Ochs
Pessoas aproveitam o Centra Park, em Nova York no último dia 23 de maio. REUTERS/Caitlin OchsCAITLIN OCHS (Reuters)
Ignacio Fariza

Os anglo-saxões utilizam o termo game changer para se referir a eventos ou decisões que viram o jogo, mudando o curso natural dos acontecimentos, quase sempre para melhor. Os enormes estímulos mobilizados pela nova Administração norte-americana estão a caminho de ser algo assim para o mundo todo: a economia dos Estados Unidos crescerá 6,9% neste ano, segundo a projeção publicada nesta segunda-feira pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), puxada pelas transferências de dinheiro – que conseguiram reavivar o consumo – e os abundantes planos de infraestrutura – que prometem modernizar um capital físico deteriorado, ao mesmo tempo em que volta a pôr em marcha a engrenagem da atividade.

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Bangkok (Thailand), 24/05/2021.- Taxi drivers display a message on their cars indicating that they received a COVID-19 vaccine, in front of the Bang Sue Grand Station in Bangkok, Thailand, 24 May 2021. The message will be displayed on about 3,000 cabs of the Smart Taxi group, after their drivers received a vaccine to speed up the inoculation program against the COVID-19 coronavirus pandemic for public service workers, to ensure safety and confidence for customers. (Tailandia) EFE/EPA/NARONG SANGNAK
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As projeções para o Brasil também são otimistas. Diante da histórica retração de 4,1% no ano passado, o PIB neste ano deve crescer 3,7% segundo a organização, e 2,5% no ano que vem. O crescimento é atribuído ao “aumento progressivo do consumo das famílias e do investimento”, de acordo com o relatório divulgado nesta segunda-feira. O otimismo, no entanto, necessita de um esforço de vacinação em massa, para que seja cumprido. “A recuperação dependerá de uma redução drástica na propagação do vírus”, diz o relatório. “São fundamentais medidas que controlem a epidemia com rapidez, como uma aceleração da campanha de vacinação e um melhor rastreamento dos contatos”, afirma o documento, que aponta também para o “ritmo lento” da vacinação “apesar da capacidade de produção nacional de vacinas”. A organização também defende uma reforma fiscal para fortalecer o investimento público e elevar o potencial de crescimento da economia.

Nos Estados Unidos, o espetacular desempenho, que pouco depois da metade deste ano já deve ter recuperado todo o terreno cedido durante a crise, somado à capacidade de resistência da China (+8,5%, 0,7 ponto acima do previsto até agora) levará no seu rastro a zona do euro, que despontará 4,3% (0,4 ponto a mais do antecipado), apesar do seu maior acanhamento na hora de gastar. Acima de tudo, empurrarão a economia mundial em seu conjunto, que crescerá 5,8%, 0,2 ponto percentual a mais do que se previa antes. A melhora global não é tão intensa como a aplicada na revisão de março, quando o crescimento foi elevado em 1,4 ponto, mas os prognósticos continuam aumentando cada vez que é preciso atualizar o quadro.

“Continua sendo o momento de gastar”, dizia neste domingo o ainda secretário-geral da OCDE, Ángel Gurría, em uma entrevista ao EL PAÍS. E isso é exatamente o que os EUA estão fazendo, desafiando inclusive quem alerta para o risco de superaquecimento ou descontrole inflacionário. O pacote norte-americano de resgate agregará entre três e quatro pontos ao seu próprio PIB no primeiro ano completo após o lançamento, (2021), e um ponto a mais ao crescimento mundial. Todas as economias se beneficiarão da maior demanda norte-americana, mas há graus: o benefício será mais intenso para as mais interconectadas com o gigante norte-americano (Canadá e México), e um pouco menos para Europa, Japão e China.

Fonte: OCDE
Fonte: OCDE

“O impulso da economia norte-americana se fortaleceu, ajudado pelos estímulos e a vacinação”, dizem os economistas do organismo com sede em Paris na sua última revisão da economia mundial. “Seu grande estímulo fiscal ajudará a fortalecer a recuperação global.”

Apoio público sem precedentes

A reboque dos EUA, a sala de máquinas da economia mundial está muito melhor do que se poderia imaginar em dezembro do ano passado, quando Biden ainda não tinha tomado posse e faltavam duas semanas para que se inoculasse a primeira vacina contra a covid-19 nos EUA, e uma para que se injetasse a primeira dose no Reino Unido. Na época se esperava que o crescimento global rondaria 4,2% neste ano, superando com muita dificuldade o nível do PIB pré-crise, mas a melhora substancial das previsões desde então joga aqueles vaticínios por água abaixo: o mundo crescerá mais graças à imunização maciça nos países que até agora puderam oferecê-la, e graças também a uma resposta mais keynesiana do que nunca em Washington, que continua deixando simpatizantes e adversários boquiabertos.

Em março de 2020, quando o mundo se enchia de incógnitas à medida que os países iam entrando no túnel dos confinamentos, a economista-chefa da OCDE, Laurence Boone, já antevia o que estava por vir e apelava a um “big bang orçamentário” para evitar uma depressão econômica de grandes proporções: “Não são os bancos centrais que vão nos salvar desta vez, mas os orçamentos dos Estados podem fazê-lo”, dizia. Um ano e dois meses depois, seus apelos foram atendidos, e a economista francesa utiliza nesta segunda-feira o adjetivo “impressionante” para se referir ao desempenho previsto para este 2021, com um apoio dos países (fiscal e monetário) que “em nenhuma outra crise tinha sido tão rápido e efetivo”.

Contudo, observa Boone, alguns importantes ventos contrários continuam soprando, como a desigual distribuição da vacina, muitíssimo mais rápida no bloco rico que nos países em vias de desenvolvimento. “O mundo navega hoje para a recuperação, embora com muitas fricções. O risco de que o crescimento pós-pandemia não seja globalmente compartilhado é elevado e depende em grande medida da cooperação internacional”, escreve a principal responsável por análise desse think tank, recordando que, em muitas economias (inclusive muitas das avançadas), até o final de 2022 o nível de vida ainda não terá retornado aos padrões pré-pandêmicos. Em síntese: quem tem possibilidades deve se preocupar com a situação do resto, ou há o risco de fundo de uma recaída global com novas mutações do vírus que poriam todos em xeque.

A inflação e o risco de exagerar na dose

A rápida reativação da economia é uma boa notícia em si, pelo que representa, mas também porque dá confiança a empresas e consumidores para investir e gastar sem tanta preocupação e temor, o que por sua vez gera um nível adicional de otimismo sobre o crescimento em médio prazo. As economias acumuladas pelas famílias que tiveram a sorte de manterem suas fontes de renda são vastas, “e o gasto unicamente de uma fração desse excesso de economia acumulada elevaria significativamente o PIB”. “Os lares”, opinam os técnicos do organismo, “poderiam normalizá-lo antes do previsto”.

Mas essa conversão em bloco da poupança em consumo também cria dilemas importantes: com a recuperação assentando-se com uma consistência maior que a prevista, multiplicam-se as advertências de quem antevê uma saída inflacionária da crise. E esse pode ser o estopim definitivo.

A OCDE não descarta totalmente essa possibilidade e recorda que nos próximos meses esse indicador provavelmente continuará tendendo à alta por uma combinação de efeito-base (a comparação interanual é estabelecida com o mesmo período do ano anterior, quando os preços haviam caído muito devido à paralisia econômica provocada pelo vírus), alta das matérias-primas e gargalos nas cadeias de suprimento de alguns produtos essenciais nos dias de hoje, como os semicondutores. Entretanto, acredita que a pressão sobre os preços será “temporária” e que o maior risco é que certos mercados financeiros, muito temerosos, reajam de forma exagerada e provoquem um aumento das taxas de juros com as quais Estados e empresas se financiam.

“Nos últimos meses apareceram sinais de maior pressão pelo lado dos custos”, admitem os técnicos do organismo. “Mas a capacidade ociosa continua sendo considerável e isso deveria evitar uma alta significativa e sustentada na inflação subjacente [a que não leva em conta nem a energia nem os alimentos, de longe os elementos mais voláteis da cesta de cálculo]. É pouco provável que as taxas de desemprego retornem a níveis pré-pandemia antes do final de 2022, então a pressão deveria ser apenas modesta nos 18 próximos meses”, raciocinam. “A política monetária atual, muito acomodatícia, deveria ser mantida, permitindo ultrapassar temporariamente a inflação, desde que a pressão sobre os preços subjacentes continue contida”. O erro de 2011, quando o Banco Central Europeu subiu os juros muito antes do que deveria para afastar um suposto risco inflacionário, continua muito fresco na memória.

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