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Coluna
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Caldeirões populares

Septênio 2014-2020 será o de menor crescimento na América Latina em 40 anos

Mulheres protestam contra as políticas econômicas do Governo equatoriano em Quito, em outubro.
Mulheres protestam contra as políticas econômicas do Governo equatoriano em Quito, em outubro.Jonatan Rosas / Getty Images
Joaquín Estefanía

O papa Francisco, que muitos de seus inimigos chamam de peronista, se referiu várias vezes à América Latina como um “continente em chamas”, com “governos fracos que não conseguiram colocar ordem e paz em seu interior”. O Natal incluiu a região entre as que estão nas trevas do mundo. Declarações como essas e a extensão dos protestos nas ruas em lugares tão diferentes como o Chile, Bolívia, Equador, Colômbia etc., fazem pensar que a região está submersa em outra década perdida como a dos anos oitenta e que, da mesma forma que outros locais do planeta, está retrocedendo.

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E não é assim. A América Latina tem problemas estruturais que em muitos casos avançam sem trégua (a desigualdade, porque seus ricos são cada vez mais ricos e não porque seus pobres sejam os mais desfavorecidos do mundo; a violência cotidiana, a ponto de incluir alguns países dentro da espantosa categoria de “Estados falidos”; a corrupção,...) e justificam as críticas, mas em comparação com outras conjunturas tem muita força: níveis de inflação historicamente baixos, reservas internacionais relativamente elevadas, acesso aos mercados financeiros internacionais (com as exceções conhecidas), juros muito baixos, etc. Estas condições favorecem sua capacidade para aplicar políticas econômicas que estimulem a demanda, cuja ausência é uma das causas dos movimentos de protesto.

Acaba de ser publicado o tradicional Balanço preliminar das economias da América Latina e o Caribe 2019, elaborado pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), um organismo das Nações Unidas com sede em Santiago (Chile). Destacam nele dois vetores que se desenvolvem paralelamente: uma intensa desaceleração econômica generalizada e sincronizada, que fez com que 18 dos 20 países estudados apresentassem uma taxa de crescimento menor em relação a períodos anteriores; e um contexto de crescentes demandas sociais, pressões para reduzir as desigualdades e aumento da exclusão social, que explodiram “com uma intensidade incomum”.

Essas características, entretanto, não correspondem somente ao ano das mobilizações, começaram pelo menos desde 2014: queda da renda per capita, o investimento, o consumo per capita, as exportações, e uma deterioração contínua da qualidade do emprego. O septênio 2014-2020 (a não ser que no próximo ano ocorra um milagre que ninguém prevê) será, de acordo com a CEPAL, o de menor crescimento econômico na região nos últimos 40 anos. Nesse período, o número de desempregados da região superou 25 milhões de pessoas (um milhão a mais do que em 2018), em meio a um desgaste agudo das condições do mercado de trabalho: aumenta muito mais o trabalho por conta própria (autônomos e falsos autônomos) do que o emprego assalariado, aumentam o subemprego e o trabalho que se origina no interior da economia informal (submersa), e aumenta a diferença entre homens e mulheres em relação ao desemprego (e aos salários). Este septênio parece imerso no conceito de “paralisação secular” publicado pelo economista Larry Summers, secretário do Tesouro com Bill Clinton.

Diante dessa dupla dimensão (desaceleração e aumento dos protestos) há quem tenha ressuscitado o velho relatório sobre a governabilidade das democracias, que nos anos setenta do século passado foi escruto por Michel Crozier, Samuel Huntington e Joji Watanuki à Comissão Trilateral. Entre as principais ideias do mesmo, sobressaiam duas que podem ser colocadas novamente em circulação: a possibilidade de limitar a participação das pessoas na ação política, para evitar os excessos que podem colocar em perigo a extensão da própria democracia; e a diminuição da “sobrecarga governamental” que se manifesta na expansão dos gastos do Estado de Bem-estar como uma “fonte de crise”.

De acordo com os apologistas rejuvenescidos dessas ideias, a liberdade e a democracia estão ameaçadas pelas intrusões das ruas que pressionam as instituições. Mas isso dependerá do sucesso ou do fracasso dos caldeirões populares.

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