Macron tenta desativar revolta dos ‘coletes amarelos’ sem mudar alta nos combustíveis
Presidente francês aceita estabelecer um diálogo com setores prejudicados pela tributação, mas não atende às principais reivindicações do movimento
Escutar, sim; ceder, não. Emmanuel Macron tenta desativar o movimento dos coletes amarelos, que nasceu em protesto contra o preço dos combustíveis e virou uma expressão da insatisfação do interior francês contra a elite de Paris. O presidente, desconcertado por essa revolta sem líderes nem ideologia, defendeu nesta terça-feira, 27, suas medidas ambientais, mas admitiu a necessidade de alterar o método e estabelecer um diálogo com a sociedade. A única concessão: o Governo ajustará as alíquotas sobre a gasolina e o diesel conforme a flutuação do preço do petróleo.
A França enfrenta o mesmo dilema que outros países industrializados, entre a necessidade de combater a mudança climática e o custo econômico e social desses esforços. Ou, segundo a fórmula que Macron citou, a tensão entre “o fim do mundo” (a ameaça do aquecimento global) e “o fim de mês” (a perda de poder aquisitivo dos trabalhadores). “Abordaremos os dois”, prometeu ele num discurso no Palácio do Eliseu.
Macron não retrocedeu no substancial: nem no programado aumento da tributação sobre o diesel a partir de 2019 nem em qualquer outra reivindicação dos manifestantes, como a readoção do imposto sobre fortunas. O presidente acredita que o erro de alguns de seus antecessores foi recuar diante de pressões das ruas: ceder agora, calcula, deixaria sua credibilidade e sua presidência abaladas. Mas ele adotou um tom humilde, empático com as classes médias que, crise após crise, viram seu poder aquisitivo ser erodido e não entendem a necessidade de assumir a fatura da luta contra a mudança climática. E ofereceu algumas promessas para apaziguar os descontentamentos.
A nova atitude se traduzirá, primeiro, em um processo de acordo descentralizado a ser desenvolvido nos três próximos meses nas regiões e municípios. O gesto indica uma correção da verticalidade que caracteriza o estilo de governo de Macron: ele decidia, o resto obedecia.
O objetivo é escutar propostas dos franceses comuns, incluindo os coletes amarelos, esse movimento organizado nas redes sociais que tem como símbolo o colete fosforescente obrigatório em todos os automóveis. O ministro da Transição Ecológica, François de Rugy, receberia na tarde desta terça em Paris uma delegação dos coletes amarelos, seu primeiro contato com o Governo nacional.
A segunda medida consistirá em levar em conta a cotação do petróleo para atenuar o impacto do imposto dos combustíveis sobre o bolso dos motoristas. O objetivo, nesse caso, é evitar que a coincidência de um aumento do preço do petróleo e da tributação acarrete um ônus excessivo para os consumidores. Um mecanismo semelhante foi aplicado em 2000 e abandonado dois anos depois: a escassa redução do preço do combustível não compensava a perda de arrecadação para o Estado.
“Não é preciso renunciar ao rumo da transição ecológica, que é justa e necessária”, disse Macron no Eliseu. “Mas se trata de mudar o método, porque muitos concidadãos consideraram que estava sendo imposto de cima e não lhes oferecia soluções.”
O presidente manifestou o desejo de atender a França periférica, a França das cidades médias e pequenas, onde o automóvel é uma ferramenta de sobrevivência e onde alguns centavos de euro a mais no litro da gasolina ou diesel pode representar um peso para o orçamento familiar.
Esta é a França onde eclodiu o movimento dos coletes amarelos. Eles se manifestaram pela primeira vez em 17 de novembro. No dia 24, convocaram uma manifestação em Paris, ofuscada pelos confrontos com a polícia e pelo incêndio de barricadas. O Governo atribuiu os distúrbios a grupos radicais.
Os bloqueios de rodovias, que começou há dias e no sábado, 24, derivou em violência na avenida Champs Elysées, teve um “impacto severo” sobre vários setores, segundo o ministro da Economia, Bruno Le Maire. Ele calculou em 60% a 70% o prejuízo para alguns comércios nas zonas bloqueadas em 17 de novembro, o dia com mais piquetes, e até 35% para o setor do grande varejo.
As concentrações preocupam Macron, cuja popularidade é inferior à de seus antecessores a esta altura da presidência. Os coletes amarelos contam com o apoio de 7 de cada 10 franceses, segundo algumas pesquisas. Os líderes de esquerda Jean-Luc Mélenchon e de extrema-direita Marine Le Pen, ambos derrotados por Macron nas eleições de 2017, já deram declarações favoráveis ao movimento, pegando carona nas críticas ao presidente.
O discurso governamental foi confuso até agora. Às vezes parecia minimizar o movimento, ou o associava à violência de ultradireita, ou então sinalizava a expectativa de que se extinguiria por exaustão. Macron, que desde sua posse, em 2017, já superou protestos contra a reforma trabalhista e a ferroviária, ainda não encontrou a fórmula para anulá-lo.
Plano ambiental com energia nuclear
O discurso no Palácio do Eliseu, perante uma plateia de representantes institucionais e políticos, serve ao presidente Emmanuel Macron para detalhar o programa de transição ecológico. A França fixou 2050 como data-limite para abandonar a produção e o consumo de energias que emitem CO2. O presidente alegou se tratar não só de uma questão ambiental, mas também de soberania nacional. O plano inclui o fechamento das centrais de carvão em 2022. Também contempla triplicar a produção de energia eólica terrestre e quintuplicar a fotovoltaica. A energia nuclear, que não produz gases do efeito estufa, continuará sendo uma parte fundamental da produção elétrica, embora deva ser reduzida em 50% até 2035, 10 anos mais tarde que o previsto. Hoje, representa 75% da matriz energética.
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