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A amizade febril contada por Elena Ferrante chega às telas

Série sobre tetralogia napolitana, filmada na Itália, estreia no próximo domingo no Brasil. Escritora, reclusa, supervisionou roteiro

Ludovica Nasti e Elisa do Gênio, em 'A amiga estupenda'.
Álex Vicente

Depois de vender 30 milhões de livros em todo o mundo, a saga napolitana assinada por Elena Ferrante chega à televisão. A série inspirada no livro  A amiga genial, primeiro volume da bem-sucedida tetralogía da autora estreia nesta segunda-feira na HBO Espanha e no próximo domingo, dia 25, no Brasil. É a primeira entrega de uma adaptação em quatro temporadas, uma por livro, com um total de 32 capítulos. Os oito primeiros estão a cargo de Saverio Costanzo, diretor romano de 42 anos que já esteve a ponto de adaptar, há uma década, outra novela desta escritora cuja identidade foi desconhecida durante muito tempo até que a imprensa italiana assinalou em 2016 que se tratava da tradutora Anita Raja.

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A própria autora escolheu Costanzo para dirigir a série, coproducida pela italiana RAI e pela HBO. "Quando li os livros, não me imaginei dirigindo uma adaptação", reconheceu Costanzo no Festival de Veneza deste ano, onde foram apresentados os primeiros episódios da série. "Eu tinha acabado de levar ao cinema outro best-seller, A solidão dos números primos, e tinha proibido a mim mesmo de voltar a fazer algo parecido. Queria evitar as comparações e a decepção inevitável de alguns leitores", acrescenta o diretor. Que Ferrante impusesse seu nome o fez mudar de opinião em poucos segundos. "Na realidade, não me deu medo, porque compartilhamos o mesmo imaginário. Se me pedissem para fazer Blade Runner, eu certamente não saberia, mas isso é o que eu sei fazer. Foi como calçar uns sapatos confortáveis. Só tinha que começar a andar", diz Costanzo.

A primeira temporada se distingue por sua fidelidade às páginas escritas por Ferrante. Também pela forma gráfica de reproduzir a violência que rodeia as crianças protagonistas, a intensa e consciente Elena Greco, a Lenu, e sua melhor amiga, a impetuosa Raffaella Cerullo, e quem chamam Lila. Costanzo se esforçou para não adoçar o que o livro descreve, ambientado em um bairro humilde napolitano durante o pós-guerra italiano. Costanzo também não fez concessões para acomodar o enredo ao gosto norte-americano: a série foi rodada em italiano e contém numerosos diálogos em dialeto napolitano. "A HBO queria algo autêntico. Não me impuseram nada e pude ir para onde quisesse", assegura o cineasta. As protagonistas foram interpretadas por uma dúzia de atrizes diferentes em suas diferentes idades e foram selecionadas entre 9.000 aspirantes. Só uma delas, Gaia Girace, que encarna Lila aos 15 anos, tinha experiência de atuação.

É mais comum enfatizar que a saga de Ferrante é uma grande história sobre amizade feminina. Mas Costanzo está convencido de que o tema da tetralogia é outro. "Os livros de Ferrante falam sobre o poder da educação. Contam que um professor pode salvar sua vida e mudar seu destino", sustenta o diretor. "O conhecimento e a cultura são as únicas maneiras de construir uma alma sólida. Essa é a ideia mais política e provocadora do livro, embora esteja escondida dentro de uma história de amizade e sentimentos", agrega.

A série foi rodada em Caserta, nas proximidades de Nápoles, onde se reconstruiu o Rione Luzzatti, o bairro humilde onde se passam os livros. "Tentamos rodar em cenários naturais, mas não era possível tirar os vizinhos de suas casas durante tantos meses", afirma Costanzo. Como na saga literária, a adaptação televisiva se caracteriza por sua aparente simplicidade. O diretor parece abandonar suas marcas de estilo para utilizar uma deliberada sobriedade. Costanzo se compraz ao escutar o comentário. "Era um desafio, porque é preciso controlar o ego por mais de oito horas de filmagem. Mas o protagonista não era eu, mas a história. O diretor está em toda parte, mas sempre um pouco escondido. É exatamente o mesmo que Ferrante faz como narradora", sentencia.

Autora (e roteirista) nas sombras

Elena Ferrante participou da elaboração do projeto e supervisionou o roteiro da adaptação televisiva. "Ela só nos deu uma diretriz: tinha que ter um prólogo onde víssemos as protagonista em sua maturidade", conta Costanzo. A autora interveio unicamente por e-mail para não perder seu precioso anonimato. "Não sabemos quem é, apesar de termos trabalhado com ela durante um ano", confessa o roteirista Francesco Piccolo, colaborador habitual de Nanni Moretti e Paolo Virzì. A ideia de levar a saga napolitana à televisão foi de Lorenzo Mieli, produtor de The Young Pope, a série de Paolo Sorrentino sobre o primeiro Papa norte-americano, que também foi uma coprodução da RAI com a HBO. A única condição que propôs foi que fosse rodada em italiano. A companhia norte-americana, que nunca produzira uma série não falada em inglês, não colocou empecilhos: a vice-presidenta da emissora, Francesca Orsi, é filha de uma italiana nascida em Nápoles nos anos 50 e é fã absoluta dos livros.

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