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Greve dos caminhoneiros tem apoio nas ruas: “É um mal necessário”

"Sou favorável" é a frase mais ouvida quando se fala da paralisação. Daí para frente, há desde defesa de intervenção militar a sugestões de aproveitar o momento para parar tudo no país

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Nesta segunda-feira atípica, com baixa circulação de automóveis e a maior parte dos postos ainda sem combustível, o EL PAÍS foi às ruas de São Paulo e Recife para ouvir opiniões sobre a paralisação dos caminhoneiros, que já está na segunda semana. Seja no centro da capital pernambucana ou em diferentes pontos da cidade paulista, a reportagem ouviu uma mesma afirmação: “Sou favorável às manifestações”. A partir daí, contudo, os discursos mudam. Há quem acredite que a solução para a atual crise brasileira seja uma intervenção militar, há quem refute esse pedido enfaticamente. Entre uma opinião e outra, contudo, sobressai uma falta de interesse pelas eleições de outubro, uma descrença generalizada na política brasileira e a impressão de que o que foi iniciado pelos caminhoneiros ganhou outra proporção.

No centro do Recife, a 50 quilômetros do o porto de Suape (epicentro das paralisações no Estado), o apoio da população aos caminhoneiros se misturava a um sentimento de esgotamento. “Estou aqui apoiando a greve porque não tenho mais gás para trabalhar”, diz a cozinheira Vera Lúcia dos Santos, enquanto batia panela na avenida Dantas Barreto. “O botijão está custando 150 reais, é impossível comprar”. Ela se juntou a cerca de 50 pessoas, a maioria vestidas de verde e amarelo, que caminharam pelo centro em apoio aos caminhoneiros e pedindo “fora Temer”. Parte dos manifestantes carregava uma faixa pela intervenção militar, mas ela logo foi recolhida, por “não haver consenso na pauta”.

O comerciante Cleber Souza Lira era um dos que apoiavam o pedido de intervenção na marcha. “Já esperamos muito dos políticos”, dizia. Ele apoiava a greve, mesmo registrando movimento mais baixo em sua loja desde a semana passada. “Não tem problema. Estamos com eles [os caminhoneiros]”. A opinião é compartilhada, em partes, pela vendedora de água mineral, Izandra Karina da Lima Silva, 24, em frente ao terminal de ônibus. “É um mal necessário”, diz ela, sobre a paralisação. “Mas tudo tem um limite. A hora que começar a faltar leite para os meus filhos, eu acabo com essa greve”, conta ela, grávida do terceiro filho. Em um dia normal de movimento, ela diz vender 15 fardos de água mineral. Desde o meio da semana passada está vendendo em média seis fardos. “A vida das pessoas precisa voltar ao normal”.

Os prejuízos contabilizados pela costureira Idaiara Soares, 45, também não foram suficientes para que ela fizesse oposição ao movimento. “A semana está parada, mas é por uma boa causa”, dizia. “Faz muitos anos que temos prejuízos, não é por causa dos caminhoneiros”. Na manifestação, que foi do centro à praça do Derby, o comerciante George Brandão, 32, estava indignado com a apatia da população. “A gasolina com esse preço e as pessoas andando de carro”, disse. “As coisas estão paradas faz tempo. Parou de chegar remédio aqui faz muito tempo”. O encarregado de estoque Manoel Lira, 40, dizia que a população precisava pegar carona no protesto. “Os caminhoneiros começaram defendendo as bandeiras deles, a gente tem que aproveitar o barco e parar tudo”.

Assim como na capital pernambucana, na avenida Paulista, em São Paulo, havia quem pedisse uma intervenção militar. A mobilização, contudo, era mais coesa, puxada por motoristas de vans escolares que interditaram parcialmente a via desde as primeiras horas desta segunda-feira. Fabio Lelis, 37, acredita que a paralisação dos caminhoneiros acabou virando uma manifestação contra o Governo e que o presidente Michel Temer, mesmo cedendo às reivindicações, já não tem mais legitimidade para negociar. “Tem que ter uma intervenção para tirar esse Governo, acabar com a corrupção, fazer a lei valer para todos”, diz Lelis em um discurso que passa longe da questão do preço do diesel.

Paralisação de motoristas de vans escolares, em São Paulo
Paralisação de motoristas de vans escolares, em São Paulo

Para Lelis, que reverbera um discurso comum nessa mobilização da avenida Paulista, intervenção militar, contudo, não significa ditadura. “Acho que o povo brasileiro tem noção e as coisas não chegariam a esse ponto, só é preciso tirar esse Governo. Se tiraram o Collor e a Dilma, por que não pode tirar o Temer?”, questiona. A falta de legitimidade que o motorista confere a Temer e o discurso pró intervenção militar ressoa pesquisas recentes sobre democracia no Brasil. Em outubro de 2017, um levantamento realizado em dezoito países latino-americanos, pelo instituto de pesquisa Latinobarómetro, apontava que somente 13% dos brasileiros estavam “muito satisfeitos” e “satisfeitos” com a democracia. Além disso, segundo os dados, o país tinha o menor índice de aprovação do Governo Federal: apenas 6%.

No terminal Bandeira, no centro de São Paulo, o discurso era diferente do repercutido na manifestação da avenida Paulista. Ali, os colegas de telemarketing, Karla Rodrigues, 28, e Matheus Oliveira, 19, também se dizem favoráveis à paralisação dos caminhoneiros e a possíveis novas greves de outras categorias. “Sei que talvez tenha protesto de professores e petroleiros esta semana e eu acho que a coisa tem que crescer mesmo, o Governo precisa saber do valor da população”, diz Oliveira. Contudo, não acreditam que uma intervenção militar seja uma saída desejável e dizem fugir de discursos extremistas, “como os do Bolsonaro”. Karla diz que se as eleições fossem hoje, ela gostaria de votar em Lula. “Se ele fosse presidente, isso não estaria acontecendo”, defende ela que diz ter anulado o voto nas últimas eleições. Oliveira, por sua vez, diz não saber em quem votaria, não acredita em nenhum dos candidatos colocados até agora.

Manuel Messias, 41 anos, motorista de ônibus fretado
Manuel Messias, 41 anos, motorista de ônibus fretado

Já na na zona oeste de São Paulo, trabalhando em um mesmo ponto de táxi na região do Largo da Batata, Manuel Messias, 41 anos, e Gilson Lourenço, 37, discordam em quase tudo quando o assunto é política. Ex-metalúrgico, Messias diz sempre ter votado no PT, acredita que o impeachment de Dilma Rousseff foi um golpe parlamentar e defende que não há provas para a prisão do ex-presidente Lula. Hoje, ele votaria em Ciro Gomes. Lourenço, por sua vez, acredita que os eleitores de Rousseff são responsáveis pela atual crise brasileira, já que, ao elegerem ela, também elegeram seu vice, Michel Temer. Hoje, ele, que defende que o Brasil precisa de alguém com pulso firme - “que interrompa a vinda de imigrantes haitianos e venezuelanos para cá” -, votaria em Bolsonaro. Ambos taxistas, contudo, concordam no mesmo ponto que todos os entrevistados pelo EL PAÍS: os caminhoneiros estavam certos desde o começo.

As demonstrações de apoio da população à paralisação, contudo, parecem ter a ver mais com uma insatisfação geral contra o Governo do que com o preço dos combustíveis. A poucos metros do ponto de táxi, o motorista de ônibus fretados Manuel Edgar, 64, resume um pouco a confusão do momento. Cansado, ele diz que a situação não estaria assim se “a Dilma não tivesse sido forçada a sair”, contudo, acredita que uma intervenção militar seja uma solução. Mas não há um incongruência em defender o governo da ex-presidente e ser favorável a uma intervenção? “É verdade, pode ser que a gente sofra com isso, mas chegou numa situação que não tem mais para onde correr”, diz.

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