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Por que a ciência quer que façamos menos exercícios

Cada vez mais estudos recomendam o mínimo treino necessário. Será que os especialistas exageraram na dose?

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Esqueça aquela história de passar horas na academia, sem pressa, para conseguir uma melhora. Só quatro ou cinco minutos, uma vez por semana, menos repetições... A ciência nos dá cada vez mais opções para reduzir nossas rotinas de treinamento à mínima expressão. Mas por quê? Será que estavam exagerando nas recomendações?

“Quando você diz a uma pessoa sedentária que ela deve caminhar meia hora por dia, sua reação natural é achar que isso é impossível”, reconhece o médico Francisco Camarelles, do Grupo de Educação Sanitária e Promoção da Saúde da Sociedade Espanhola de Medicina de Família e Comunitária (semFYC). “Mas se lhe propusermos dividir a caminhada em pequenos fragmentos de tempo, ela muda de atitude. Passa a achar isso factível.”

Através de diversas pesquisas, a ciência demonstrou que, quando o assunto é treino, o que conta é a intensidade, não a duração. E, como não temos outra saída a não ser fazer exercício se quisermos minimizar a deterioração física do envelhecimento, combater as doenças associadas com o sedentarismo – hipertensão, cardiopatia, acidente vascular cerebral, determinados tipos de câncer – e a obesidade, propor a realização de exercícios em poucas doses leva a uma maior adesão do que se for em grande quantidade.

Contra o sedentarismo, tudo ajuda

“Devemos entender o conceito de atividade física num sentido global”, afirma Camarelles. “Não se trata de vestir uma roupa de ginástica e sair à rua para correr durante meia hora.”

Ou seja: segundo o médico, se a pessoa acha mais fácil caminhar 15 minutos duas vezes por dia do que fazer uma única caminhada de meia hora, não tem problema. E “se prefere três caminhadas de 10 minutos, tudo bem. Não é preciso que ela saia especificamente para caminhar. Pode sair para comprar pão ou para buscar os filhos na escola sem o carro. No final das contas, tudo isso ajuda.”

O médico enfatiza uma conduta tão comum quanto pouco saudável: ficar sentado várias horas seguidas, sem se levantar da cadeira. “Sabemos que as pessoas que passam muito tempo sentadas têm um pior perfil cardiovascular e metabólico do que as que fazem breves pausas para se mover ou alongar em sua jornada de trabalho”, afirma. Dica: coloque um cronômetro e se levante da cadeira um minuto e 40 segundos a cada meia hora.

Quanto ao treino, a ciência tem várias rotinas para as pessoas com tempo escasso, preguiça ou que preferem realizar o exercício em pequenas doses. Confira:

Só quatro minutos

Das 24 horas do dia, você só tem que reservar quatro minutos. Mais ou menos o que dura a sua música favorita. Mas se prepare para sofrer.

Em 1996, uma equipe de pesquisadores do Instituto Nacional de Fitness e Esportes do Japão, liderada por Izumi Tabata, chegou a uma conclusão que mudaria os desígnios do treino no novo século: fazer exercício durante 60 minutos com intensidade moderada tem os mesmos efeitos sobre a capacidade aeróbica que se exercitar com grande intensidade durante 20 segundos, seguidos de outros 10 de recuperação, repetindo essa sequência sem parar durante quatro minutos.

O estudo mostrou que essa rotina concentrada consegue aumentar em até 28% a capacidade anaeróbica. E assim nasceu Tabata, a base teórica do treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT).

20 minutos

Segundo os críticos, o método idealizado pelos japoneses tem um problema: apesar de conseguir melhorar a saúde dos sedentários, não envolve um grande consumo de calorias. Para dar uma solução, pesquisadores da Universidade de Wisconsin - La Crosse (EUA) decidiram juntar quatro sequências de Tabata – com exercícios como saltos pliométricos, agachamentos, burpees e pesos tipo kettlebel (bola de ferro fundido com uma alça) – a um minuto de descanso.

Os resultados desse experimento mostraram que era possível queimar entre 240 e 360 calorias, segundo o peso da pessoa. E o melhor: a queima de calorias continua uma vez terminado o exercício. Assim, as aulas de HIIT de apenas 20 minutos viraram sensação nas academias do mundo todo.

Cinco minutos

Um dos grandes problemas enfrentados pelos profissionais do esporte é conseguir a adesão à atividade física de pessoas que não têm uma mentalidade voltada para ela. Ao que parece, se os momentos de atividade moderada a intensa são divididos em frações de cinco minutos, em vez dos 10 sugeridos pelo Departamento de Saúde dos EUA, o exercício fica psicologicamente mais fácil de fazer.

Essas são as conclusões de um estudo realizado por diversas instituições, incluindo a Universidade Harvard (EUA) e a University College of London (Reino Unido). A pesquisa indica que caminhar rápido durante cinco minutos, parar e retomar a marcha funciona melhor do que fazê-lo por 10 minutos até perder o fôlego. E, com essa técnica, pode-se duplicar o número de pessoas entre 70 e 93 anos que conseguem completar os 150 minutos de exercício por semana recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

15 minutos

Se você acha que esses 150 minutos são inalcançáveis, mas não quer morrer de infarto, pode começar com 92 minutos por semana. Ou seja: só 15 minutos por dia. Com esse tempo, segundo cientistas do Departamento de Saúde de Taiwan, é possível reduzir em 14% a incidência todos os tipos de doenças não genéticas associadas com o sedentarismo.

Uma vez por semana

Se você tem mais de 65 anos, dedicar só dois dias por semana ao treinamento de força é suficiente para não perder potência músculo-esquelética, segundo a Academia Americana de Medicina Esportiva. E mais: você ainda pode conseguir os mesmos efeitos malhando só uma vez por semana, conclui um estudo do Veterans Affairs Medical Center (EUA).

A Universidade de Massachusetts obteve resultados semelhantes com crianças de sete a 12 anos. “Reduzir pela metade os períodos semanais [de exercícios] consome menos recursos econômicos e envolve menos tempo, tornando mais provável a adesão dos indivíduos. E os resultados sugerem que é possível obter o mesmo aumento do tônus e do desenvolvimento da força muscular que os observados com a prática feita duas vezes por semana”, dizem os autores.

Aos poucos

Os 150 minutos de atividade física moderada semanal ou os míticos 10.000 passos diários são recomendações mais do que conhecidas. Até pouco tempo atrás, pensava-se que o exercício de cada dia devia ser feito todo de uma só vez. Com as pulseiras inteligentes, porém, é possível monitorar não só os passos dados ao longo do dia, como também os períodos de sedentarismo e atividade. E, em alguns casos, esses aparelhos revelam que existem pessoas que não ficam quietas nunca, embora não façam especificamente nenhum exercício.

Exemplo disso são os que realizam tarefas domésticas. Aqui tudo ajuda: ir às compras, passar o aspirador, pendurar a roupa, etc. Especialistas da Universidade Harvard (EUA) concordam com seus colegas do Instituto Karolinska (Suécia): as pessoas que levam uma vida moderadamente ativa reduzem de 50% a 70% as chances de morrer de problemas cardíacos. Também ressaltam a importância de não passarmos mais de uma hora sem atividade, ou seja, sentados diante do computador ou da TV, ainda que façamos academia depois.

Menos repetições

Se você está acostumado com o exercício físico, saiba que passar mais tempo na academia levantando peso não vai te deixar com mais músculos. Um artigo publicado na revista Physiological Reports revela melhores resultados em séries de quatro a cinco repetições a 90% da intensidade máxima do que em 10 ou 12 repetições a 70%. Em outras palavras: levante mais peso, menos vezes, e verá melhores resultados do ponto de vista do aumento de força e da hipertrofia.

Em suma, a ciência parece deixar claro: é melhor fazer pouco exercício e ser constante do que não fazer nada.

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