_
_
_
_

DNA do falso alienígena do Atacama revela os seus segredos

Pesquisadores concluíram que a criatura era uma menina com um desenvolvimento ósseo anormal

Miguel Ángel Criado
A menina foi encontrada mumificada atrás da igreja de um povoado mineiro abandonado
A menina foi encontrada mumificada atrás da igreja de um povoado mineiro abandonadoBhattacharya S et al. 2018
Mais informações
Árvore genealógica gigante revela novos segredos da história da humanidade
O DNA de uma menina reescreve a história dos primeiros americanos
DNA revela os segredos dos antigos habitantes da Ilha de Páscoa

O humanoide de 15 centímetros de altura e cabeça alongada que foi encontrado no começo do século no deserto do Atacama deixou definitivamente de ser um mistério. O sequenciamento do seu genoma revela que foi uma menina mestiça. A genética também explica sua forma extraordinária. Seu DNA continha diversas mutações, algumas desconhecidas até agora, em genes relacionados com o desenvolvimento de ossos e cartilagens. A criatura, com um desenvolvimento ósseo equivalente ao de uma criança de seis a oito anos, mas com comprimento muito inferior ao normal, provavelmente nasceu morta e foi abandonada atrás de uma igreja. Essa idade óssea anormal, determinada pelas características do esqueleto, e não por seu tamanho, foi causada pelas mutações.

Em 2003, Oscar Muñoz, um morador de Iquique (Chile) que tinha como hobby procurar objetos antigos nas localidades dedicadas à extração de salitre no interior do deserto do Atacama, encontrou nos arredores da igreja de La Noria, um povoado abandonado há muito tempo, um tecido branco enrolado e amarrado com uma fita roxa. Ao abri-lo, descobriu um pequeno ser com a cabeça ovalada e uma protuberância no crânio. Parecia completamente formado, e estava mumificado. Os primeiros que viram a criatura acharam que se tratava de feto ou dos restos de uma criança prematura. Outros opinaram que podia ser um personagem não humano desconhecido.

Muñoz vendeu o humanoide a um empresário local, que cobrava alguns pesos de curiosos que queriam tirar fotos com Ata, como a múmia começou a ser chamada. Em pouco tempo as primeiras informações sobre a descoberta começaram a sair na imprensa nacional e internacional. A notícia chegou ao espanhol Ramón Navia-Osorio, um aficionado dos discos voadores, que o comprou e o levou a Barcelona. Desde então, se tornou uma celebridade entre os que acreditam em alienígenas. Em 2013, um exame preliminar do seu DNA mostrou que Ata era humano, mas nem isso esvaziou a crença de que vinha do espaço. No ano passado, por exemplo, foi uma das atrações de um Congresso Mundial de Ufologia realizado em Barcelona.

A múmia foi comprada por um espanhol que acredita em discos voadores

“O espécime é 100% humano”, afirma Carlos Bustamante, pesquisador de genética médica e populacional da Universidade de Stanford (EUA), que participou do sequenciamento e análise de Ata. “Era uma bebezinha, e o mais provável é que tenha morrido ao nascer”, acrescenta. Entretanto, como já viram em 2013, o desenvolvimento ósseo da criatura não correspondia ao de um feto. “Seu crescimento ósseo era o de uma criança de vários anos, o que nos diz muito sobre as mutações que portava”, completa.

Após cinco anos de profunda análise genética, publica-se agora o genoma completo de Ata. Além de Bustamante, participaram em sua elaboração alguns dos autores do relatório preliminar de 2013, como o imunologista Garry Nolan, também professor de Stanford (Califórnia), e o radiologista pediátrico do Centro Médico Cedars-Sinai de Los Angeles, Ralph Lachman, autor de um manual sobre enfermidades ósseas pediátricas.

“Ata apresenta mais de uma mutação nociva, e os genes afetados estão envolvidos na morfologia humana”, explica Bustamante. De fato, os pesquisadores identificaram mutações em sete genes diferentes, algumas desconhecidas até agora. Todos esses genes têm um papel no desenvolvimento dos ossos, e seu caráter defeituoso explicaria essa espécie de nanismo extremo, porém proporcional, e a ausência de quatro costelas na caixa torácica.

Durante a produção do documentário ‘Sirius’, do ufólogo norte-americano Steven Greer, foram feitos vários exames na múmia, inclusive radiografias
Durante a produção do documentário ‘Sirius’, do ufólogo norte-americano Steven Greer, foram feitos vários exames na múmia, inclusive radiografias'SIRIUS' DOCUMENTARY

Quanto à sua origem, “era uma menina mestiça, com parte europeia e parte nativa”, comenta María Ávila-Arcos, especialista em genética populacional da Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM) e coautora do estudo. “Quando comparamos seu genoma com o de populações de todo o mundo vimos que se agrupava com as populações latino-americanas, em particular as sul-americanas e, dentro destas, com as populações andinas”, acrescenta. De fato, segundo seu genoma, seus parentes mais próximos deveriam ser indígenas chilotes chilenos.

Os resultados da pesquisa, publicados na revista científica Genome Research, estão disponíveis a partir desta sexta-feira para a comunidade científica. O que, além de enterrar de uma vez o engano alienígena, mostra a potência da genética aberta. Como diz a primeira autora do estudo, a bióloga Sanchita Bhattacharya, da Universidade de Califórnia em San Francisco, “a análise bioinformática desta pesquisa mostra a potência e riqueza da informação aberta ao domínio público que leva ao descobrimento de novas e estranhas variantes mortíferas nos genes associados com o fenótipo de Ata”.

Quanto ao destino da pequena criatura, os pesquisadores acreditam que, depois de servir desta maneira à ciência, deveria retornar ao Atacama e “ser enterrada segundo os costumes de seu povo”.

Tu suscripción se está usando en otro dispositivo

¿Quieres añadir otro usuario a tu suscripción?

Si continúas leyendo en este dispositivo, no se podrá leer en el otro.

¿Por qué estás viendo esto?

Flecha

Tu suscripción se está usando en otro dispositivo y solo puedes acceder a EL PAÍS desde un dispositivo a la vez.

Si quieres compartir tu cuenta, cambia tu suscripción a la modalidad Premium, así podrás añadir otro usuario. Cada uno accederá con su propia cuenta de email, lo que os permitirá personalizar vuestra experiencia en EL PAÍS.

En el caso de no saber quién está usando tu cuenta, te recomendamos cambiar tu contraseña aquí.

Si decides continuar compartiendo tu cuenta, este mensaje se mostrará en tu dispositivo y en el de la otra persona que está usando tu cuenta de forma indefinida, afectando a tu experiencia de lectura. Puedes consultar aquí los términos y condiciones de la suscripción digital.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_