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DNA revela os segredos dos antigos habitantes da Ilha de Páscoa

Não há restos genéticos do contato entre os rapanuis e os nativos americanos antes da chegada dos europeus

Miguel Ángel Criado
Ainda há mistérios a serem elucidados sobre os construtores dos moais da Ilha de Páscoa.
Ainda há mistérios a serem elucidados sobre os construtores dos moais da Ilha de Páscoa.Terry Hunt

Os rapanuis, que povoaram a Ilha de Páscoa, não tiveram nenhum contato com os nativos americanos até a chegada dos europeus. Ou, se tiveram, isso não deixou rastro em seus genes. É o que afirma um estudo que analisou DNA antigo dos habitantes da ilha. Esses resultados questionam pesquisas anteriores que defendem que houve contato e que pode ter ocorrido vários séculos antes.

A história dos rapanuis como povo estava cheia de mistérios que a ciência vem revelando nas últimas décadas. A arqueologia estimou que chegaram à Ilha de Páscoa por volta do ano 1200 da nossa era. A genética demonstrou mais tarde que a teoria sobre sua origem polinésia estava certa. Mas esses navegadores que vieram do oeste se aventuraram ainda mais longe, até a América? Os ameríndios chegaram à costa da ilha? Ou nunca houve contato entre os rapanuis e os nativos americanos antes de os europeus começarem a visitar a ilha, a partir de 1722? E se nunca houve, como entre 6% e 8% de seus genes são de origem americana?

Pela primeira vez, um grupo de pesquisadores conseguiu estudar o DNA antigo de cinco rapanuis encontrados no sítio arqueológico de Anakena, no norte da ilha. Os cientistas conseguiram isolar o material genético de pequenos cortes de apenas 200 miligramas feitos nas costelas dos restos. Três deles foram datados como muito anteriores ao ano de 1722, em torno do século XIV-XV, e os outros dois pertenciam a indivíduos nascidos no século XIX ou no início do XX. Ou seja, tinham dados genéticos anteriores e posteriores à chegada dos ocidentais.

O rapanuis atuais têm cerca de 8% do genoma originário dos americanos nativos

“Não encontramos evidênciaa de um fluxo de genes entre os habitantes da Ilha de Páscoa e os da América do Sul”, diz em um comunicado o antropólogo da Universidade da Califórnia em Santa Clara e principal autor do estudo, Lars Fehren-Schmitz. “Estamos realmente surpresos de não termos encontrado nada. Existem muitas pistas que apontam para essa possibilidade, tantas que estávamos convencidos de que encontraríamos evidências do contato anterior aos europeus com a América do Sul, mas não havia nada”, acrescenta.

Entre as pistas que sugeriam o contato estão os estudos náuticos sobre a viabilidade de navegar até a ilha a partir da costa americana com a tecnologia do passado, uma viagem de mais de 3.500 quilômetros. Também o enorme trabalho do antropólogo norueguês Thor Heyerdahl, que, empenhado em demonstrar que os polinésios realmente vieram da América, fez a mítica travessia do Kon-Tiki em meados do século passado. Alguns antropólogos sustentam que a cultura rapanui, criadora dos majestosos moais, tem mais a ver com os povos pré-colombianos do que com as outras ilhas polinésias. A evidência arqueológica mais forte é a presença de batata-doce em várias ilhas polinésias há quase 1.000 anos. Mas a pista mais conclusiva é que várias pesquisas recentes revelaram a presença de genes ancestrais americanos nos rapanuis atuais.

No entanto, este novo estudo, publicado na Current Biology, não encontra vestígios (uma porcentagem inferior a 1%) de genes ameríndios nos três rapanuis anteriores à chegada dos europeus. No entanto, eles encontraram tais genes nos dois posteriores e em porcentagens em torno de 6%, de acordo com trabalhos anteriores. Embora a possibilidade de contato cultural não possa ser descartada, “não deixou rastros genéticos”, diz Fehren-Schmitz.

A principal evidência arqueológica de contato é a presença de batata-doce na Polinésia há 1.000 anos

O mexicano José Víctor Moreno Mayar é um dos que defendem que houve contato e miscigenação entre os dois povos antes da chegada dos europeus. Pesquisador de paleogenética do Museu de História Natural da Dinamarca, Moreno realizou um estudo há três anos cujos resultados o trabalho de Fehren-Schmitz agora questiona. A pesquisa de Moreno, publicada na mesma revista, analisou o genoma de 27 rapanuis atuais, encontrando 8% de genes americanos. Aplicando um modelo estatístico, concluíram que esses genes não entraram no povo rapanui com os europeus, mas muito antes: entre 1280 e 1495. A data mais baixa é apenas algumas décadas posterior à chegada dos polinésios à ilha.

“O trabalho de Fehren-Schmitz é uma pesquisa de grande valor, são os primeiros dados de DNA antigo dos rapanuis que são obtidos”, reconhece Moreno. No entanto, ele questiona a principal conclusão do trabalho, que considera “exagerada e precipitada”. A fragilidade reside, de acordo com o especialista mexicano, na proximidade temporal entre a data do possível contato e a datação dos restos analisados. “Se você tem um contato entre duas populações hoje e faz uma amostragem de indivíduos dessa população mista, você terá alguns indivíduos com a mistura genética e outros sem, uma vez que a miscigenação não é imediata. Com três amostras, é apressado descartar que houve um contato pré-colombiano entre nativos americanos e polinésios. A controvérsia será resolvida quando encontrarmos mais DNA antigo dos rapanuis”, conclui o pesquisador mexicano.

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