Presidente do Peru vive sangria em seu Governo por indulto a Fujimori

Funcionários do Ministério da Justiça renunciam por irregularidades no processo do perdão presidencial

Famílias das vítimas dos esquadrões da morte Grupo Colina, reunidos na terça-feira, em Lima.LUKA GONZALES (AFP)
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Editorial | Indulto para Fujimori

O presidente do Peru, Pedro Pablo Kuczynski, continua perdendo apoio após sua decisão de conceder um perdão humanitário ao autocrata Alberto Fujimori, chefe de Estado entre 1990-2000, condenado a 25 anos por graves violações dos direitos humanos e corrupção, preso desde 2005. Ao meio-dia da quarta-feira, depois de receber dezenas de mensagens de personalidades do mundo da cultura que exigiam sua renúncia, o ministro da Cultura, Salvador del Solar, conhecido ator e cineasta, comunicou sua decisão de deixar o cargo, via Twitter. O conselheiro presidencial ad honorem Máximo San Román também renunciou. San Román foi vice-presidente do primeiro Governo de Fujimori, e depois se afastou do autogolpe de 1992. Agora era um importante apoio de Kuczynski, e decide abandoná-lo como antes fizeram três parlamentares importantes e o ministro do Interior. Também renunciou o presidente executivo dos meios de comunicação do Estado, Hugo Coya.

Del Solar esteve de licença na Espanha por uma semana e conversou na terça-feira com o presidente. “Apresentei minha renúncia ao cargo de ministro da Cultura. Agradeço ao Presidente por ter me dado a oportunidade de servir ao nosso país”, disse o cineasta na rede social na quarta-feira, minutos antes da cerimônia de posse do novo Ministro do Interior, o ex-chefe da Polícia Nacional Vicente Romero, que deveria contar com a participação de todo o gabinete.

O antecessor no Ministério do Interior, Carlos Basombrío, apresentou sua renúncia antes da decisão do indulto, durante a crise política provocada pela maioria fujimorista ao defender o impeachment do presidente.

Os problemas estão se acumulando para PPK, que na quinta-feira deverá declarar à promotoria por suas ligações com o caso Odebrecht. Nesse mesmo dia também deverá depor Keiko Fujimori pelo suposto financiamento de suas campanhas eleitorais pela empresa brasileira. Parlamentares da Força Popular — o partido dos Fujimori — difundiram, há duas semanas, uma lista de depósitos da muiltinacional brasileira Odebrecht a duas empresas com sede nos Estados Unidos: uma de PPK e outra de seu sócio chileno Gerardo Sepúlveda. Os pagamentos foram feitos entre 2004 e 2013. Depois de divulgado o escândalo, pediram a “vacância” presidencial que foi discutida na quinta-feira, dia 21, no Parlamento. O presidente foi salvo pelos votos de dez fujimoristas dissidentes, liderados por Kenji Fujimori, o filho mais novo do autocrata, que negociou com Kuczynski o perdão em troca de não votar por sua remoção.

A sangria na equipe do presidente continua. O presidente executivo do Instituto de Rádio e Televisão do Peru, o escritor e jornalista Coya, enviou uma carta ao mandatário afirmando que “com uma mistura de emoções” comunicava sua renúncia. Na noite de segunda-feira, dia 25, durante um protesto no centro de Lima contra a decisão da Kuczynski de perdoar Alberto Fujimori, o cinegrafista da empresa estatal, Jesús Saavedra, foi espancado e chutado por agentes da Polícia Nacional. Os agentes tentavam evitar que ele filmasse os rostos dos policiais que agrediam os manifestantes.

Enquanto isso, familiares das vítimas do Grupo Colina, o destacamento do Exército que realizava execuções extrajudiciais e desaparecimentos durante o Governo de Fujimori, anunciaram em uma coletiva de imprensa que vão continuar as ações judiciais para conseguir a anulação do perdão.

“Fujimori matou meu filho, agora Kuczynski terminou de assassinar o resto da família”, lamentou Javier Roca, pai de Martín Roca, um estudante universitário desaparecido em 1993 depois de ser preso por membros da Marinha.

“Continuaremos denunciando que o Estado não atende aos direitos das vítimas e há cidadãos que parecem ter mais peso que outros”, acrescentou Gisela Ortiz, irmã de Luis Enrique Ortiz, um dos nove estudantes da Universidade La Cantuta que foram mortos e desaparecidos pelo Grupo Colina. O caso foi um dos que provocou a sentença a 25 anos de prisão para Fujimori.

Várias organizações internacionais rejeitaram a concessão do indulto. O representante de direitos humanos da ONU para a América Latina, Amerigo Incalcaterra, o secretário executivo da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, Paulo Abrão, e as ONGs norte-americanas Human Rights Watch, CEJIL e Washington Office for Latin America citam falhas no processo seguido pelo Ministério da Justiça.

Além disso, o diretor-geral de Direitos Humanos do Ministério da Justiça, Roger Rodriguez, renunciou ao cargo na terça-feira para protestar contra o perdão que classifica de “político” ao invés de humanitário. Dois outros funcionários da área dos direitos humanos da mesma entidade apresentaram sua renúncia pela mesma razão.

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