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Que fim levou uma das primeiras startups de sucesso do Brasil

O Buscapé foi vendido em 2009, adquiriu outras empresas, desfez-se na sequência, e agora investe para crescer com consistência, gerenciando 60 milhões de visitas ao mês

O CEO do site Buscapé, Sandoval Martins, junto com sua equipe na sede da empresa.
O CEO do site Buscapé, Sandoval Martins, junto com sua equipe na sede da empresa. Toni Pires

Há quase 20 anos, no tempo em que a internet no Brasil ainda era lenta, cara e discada, o estudante Rodrigo Borges resolveu comprar uma impressora pela web. A tentativa, no entanto, foi frustrada. Ele não conseguiu localizar nos sites das lojas disponíveis especificações sobre o produto nem os preços. Era simplesmente impossível pesquisar qual era a melhor oferta naquela época. Conversando sobre a dificuldade enfrentada por ele com três amigos do curso de Engenharia Elétrica, da Universidade de São Paulo (USP), o grupo percebeu que não havia ainda um serviço de busca e comparação de preços na internet no país. A descoberta levou os estudantes, com veia empreendedora, a criar um site que suprisse o problema.

Depois de um ano de estudo para o desenvolvimento da plataforma, um investimento inicial de 4.800 reais e algumas tentativas fracassadas - já que lojas físicas ainda eram resistentes em fornecer os valores dos produtos-, nasceu em 1999 o Buscapé, um site de comparação de preços online. Com um serviço inédito no Brasil, não demorou muito para que a plataforma conseguisse um número importante de usuários e clientes. O modelo era simples, os sites pagavam uma comissão ao Buscapé quando os usuários do comparador de preço fossem direcionados às suas lojas online.

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O timing do lançamento também era perfeito. Em 2000, com o boom da internet e o avanço do comércio eletrônico, o Buscapé conseguiu investimentos importantes - de mais de 6 milhões de dólares - para sua expansão. No ano seguinte, os sócios conquistaram sua primeira receita com o empreendimento. A empresa, então, se tornou uma das primeiras startups de sucesso no país.

Hoje, o site recebe mensalmente 60 milhões de visitas, compara mais de 25 milhões de produtos vendidos por 8.500 lojas, segundo dados da empresa que hoje é líder em comparação de preços no Brasil e foi comprada pelo gigante de mídia sul-africano Naspers em 2009. O Buscapé não divulga balanços, mas diz que, em 2016, o faturamento da Buscapé Company, que hoje é dona de 15 empresas ligadas ao comércio eletrônico, foi de 300 milhões de reais ( 79 milhões euros). No segundo semestre deste ano, a companhia se reinventou e passou a adotar também um novo modelo de negócios. Depois de quase duas décadas sendo um comparador de preços, a empresa se transformou em um marketplace, uma espécie de shopping virtual que vende produtos de distintas lojas online.

"Na minha visão não mudamos a essência do Buscapé, eu simplesmente coloquei um botão novo para o consumidor: compre comigo agora. Ele consumiu conteúdo, comparou preço, entendeu se aquele produto é adequado para ele e não precisa sair mais do Buscapé, ele compra ali mesmo", explica o atual CEO do grupo Sandoval Martins.

A intenção, segundo o CEO, é que o modelo híbrido seja equilibrado em termos de receita. "Não acredito que o marketplace se torne a maior fonte do faturamento. O bom é ter os dois em níveis similares. Vamos continuar forte no comparador de preço também", conta Martins ao EL PAÍS na sede da empresa de 3.000 metros quadrados, em Santana de Parnaíba, na região metropolitana de São Paulo. O prédio tem ambientes com decoração temática geek e pop, de Breaking Bad a Star Wars, e espaço de convivência com instrumentos musicais, sala para os funcionários fazerem "brainstorm" e um terraço para happy hour.

No dia que a reportagem visitou a sede, Martins e grande parte da equipe tinham virado a noite acordados, e a euforia no local era grande. Não era um dia qualquer. Tratava-se da Black Friday, o dia de maior acesso do site, com os usuários ensandecidos para achar a melhor oferta. Neste ano, a empresa bateu inclusive recorde de audiência na madrugada da Black Friday. Chegou a registrar 32 vezes mais acessos na comparação com a média do horário em um dia comum.

Apesar do otimismo com a notícia, a empresa não passa pela sua fase mais rentável e enfrentou altos e baixos nos últimos anos. Quando foi comprada, em 2009, pela Naspers por cerca de 342 milhões de dólares, o Buscapé investiu em um plano de crescimento agressivo, com aquisições de empresas (18 até 2013) e investimentos em startups. O quadro de funcionários chegou a 1.200 e o site chegou a ter 14 vice-presidentes. A mudança tirou a companhia da rota do crescimento e na fase da expansão, o Buscapé começou a dar prejuízo. Os fundadores também foram deixando, um a um, o comando da empresa entre 2009 e 2015. "Foi um momento em que se teve muita entrada de capital e aquisições. Aí se perdeu um pouco o foco. É muito difícil comprar diversas empresas e integrá-las, é um desafio muito grande", explica Martins.

Não demorou muito para o site fechar algumas operações e começar a cortar custos, demitindo centenas de funcionários. Em março de 2016, promoveram Martins, que estava na empresa desde 2013. Hoje, mais enxuta, a empresa conta "apenas" com 350 funcionários e passa por uma mudança estratégica e, por isso, não deve ter crescimento neste ano. "Deixamos de investir para crescer, estamos focados no crescimento sustentável. A fase agora é focar na comparação de preços e na implementação do marketplace. Outros grandes players, como o Ebay, já fizeram isso. Congelaram dois anos para reconstruir a plataforma dele", explica Martins, que afirma que neste ano a empresa não deve apresentar crescimento.

Já em 2018, com a nova estrutura estabelecida, o objetivo financeiro do Buscapé é crescer duas vezes mais do que o e-commerce – um mercado que deverá avançar 12% neste ano. Segundo, Martins, a companhia também pretende expandir internacionalmente. A empresa chegou, no passado, a abrir escritórios no México, Argentina, Chile e Colômbia, mas as operações nesses países estão congeladas, segundo o CEO. "A ideia é expandir no exterior só em 2019. Primeiro precisamos estabelecer a no Brasil para depois ampliar. Queremos aplicar o mesmo modelo. Mas sem estabilizar o modelo no mercado local fica difícil sair para fora", diz.

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