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Vitória moral para o ‘insubmisso’ Mélenchon

O candidato da esquerda antiliberal obtém surpreendentes 19% dos votos na França

Álex Vicente
O candidato da França Insumisa, Jean Luc Melenchon, neste domingo em Paris rodeado pela imprensa.
O candidato da França Insumisa, Jean Luc Melenchon, neste domingo em Paris rodeado pela imprensa.Xavier Laine (Getty)

Ele pode ser considerado o vencedor moral das eleições presidenciais francesas. O insubmisso Jean-Luc Mélenchon conseguiu no domingo, dia 23 de abril, uma verdadeira proeza. Ultrapassou os 19% dos votos e quase igualou o resultado de François Fillon, apesar das dificuldades impostas pelas eleições, com o voto progressista dividido entre três candidatos diferentes e os sufrágios trabalhistas em plena migração para as terras da Frente Nacional. O aspirante ao Eliseu da esquerda antiliberal triplicou o resultado do até agora hegemônico Partido Socialista e praticamente igualou os resultados históricos do comunismo francês nos anos setenta.

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O candidato da França Insubmissa protagonizou uma ascensão espetacular nas últimas semanas, subindo mais de sete pontos em um mês nas pesquisas e absorvendo parte do eleitorado do socialista Hamon, mas também uma porção da de Emmanuel Macron. A imensa decepção em relação à ação de François Hollande e a reconfiguração da paisagem política durante os últimos meses teriam beneficiado Mélenchon. O fim do gregarismo habitual da maioria dos votantes de esquerda, fiéis durante as últimas décadas ao Partido Socialista, ampliaram seu horizonte eleitoral.

O motor de sua campanha, que seduziu especialmente jovens e as camadas mais modestas, foi a promessa de renovar radicalmente a classe política francesa. Depois das eliminações surpreendentes de Nicolas Sarkozy, Alain Juppé, Manuel Valls e da ecologista Cécile Duflot, somadas à retirada de Hollande em dezembro, Mélenchon entendeu que o eleitorado aspirava a uma mudança de rostos e de métodos. O candidato antiliberal denunciou com insistência a “monarquia republicana” e propôs terminar com o sistema institucional idealizado há mais de meio século pelo general De Gaulle. “Serei o último presidente da Quinta República. Convocarei uma assembleia constituinte para escrever uma nova Constituição”, dizia o programa do candidato, apoiado pelo Podemos e por Bernie Sanders na reta final.

Seu talento retórico nos debates televisivos e sua inventiva campanha conseguiram eclipsar os pontos de seu programa passíveis de afastar os votantes mais moderados. Por exemplo, seu “plano B para a União Europeia”, que implicava renegociar os tratados ou abandoná-la. Ou talvez a mudança de alianças no plano geopolítico, que teria exigido sair da OTAN para “não serem arrastados a guerras pelos Estados Unidos” e “unir-se a países não alinhados”, como os da Alternativa Bolivariana.

No passado remoto, Mélenchon foi senador e ministro com Lionel Jospin. Abandonou o Partido Socialista em 2008 com a clara intenção de transformá-lo em um Pasok à francesa. O resultado obtido no domingo empurra a formação adversária um pouco mais para o abismo e termina de consagrar este fogoso orador como personalidade central na vida política francesa.

SEM DECLARAÇÃO DE VOTO

Jean-Luc Mélenchon se negou neste domingo a aceitar o resultado anunciado a partir das estimativas, esperando que chegassem os números oficiais do Ministério do Interior, previstos para a meia-noite. De um local no norte de Paris, onde se reuniu uma multidão eufórica, Mélenchon também evitou dar declarações de voto diante de um segundo turno. Insinuou que será uma decisão coletiva de sua plataforma, França Insubmissa. Mélenchon também se destacou como responsável pela campanha mais original. Nela figuraram reuniões simultâneas graças ao uso de hologramas, um canal no YouTube, uma "rádio insubmissa" e até um videogame, Fiscal Kombat, no qual Mélenchon enfrentava adversários como Macron, Fillon e Sarkozy.

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