_
_
_
_
_

Ciclista italiano Scarponi morre atropelado durante treino

Atleta, de 37 anos, era líder da equipe Astana e ganhou o Giro d’Itália em 2011

Carlos Arribas
O ciclista italiano Michele Scarponi em um treinamento, em 2014.
O ciclista italiano Michele Scarponi em um treinamento, em 2014.LUK BENIES (AFP)
Mais informações
Ciclista iraniano morre após grave queda nos Jogos Paralímpicos
França pretende pagar para quem for trabalhar de bicicleta

Perto de casa, às 8h da manhã, quando saia pra treinar, o ciclista profissional italiano Michele Scarponi bateu de frente em um furgão. Morreu poucos minutos depois. Tinha 37 anos. Na noite anterior, sexta-feira, havia chegado tarde em casa, em Filottrano, nas Marcas, perto de Ancona, na costa adriática. Chegava de Trento, no norte, longe do seu mar, onde acabara de correr o Tour dos Alpes. O ciclista chegara feliz. Havia terminado em quarto lugar na prova geral e na segunda-feira, inclusive, tinha vencido a etapa de Innsbruck, sua primeira vitória em quase quatro anos. Dedicou o triunfo no ciclismo, emocionado, a todas as vítimas e pessoas afetadas pelos últimos terremotos em sua região, um rincão entre os Abruzos e o mar. Em casa, tirou uma foto com seus filhos gêmeos montando cavalinho em suas costas e publicou no Twitter. Sua última mensagem. Pareciam ser bons agouros para o Giro d’Itália, que começa dentro de duas semanas e que Scarponi disputaria na posição de líder da equipe Astana devido à lesão de Fabio Aru.

Scarponi era uma voz muito aguda e brincalhona no pelotão. “Uma risada contagiante”, escreveu o espanhol Alberto Contador em sua conta no Twitter. E um generoso gregário de luxo para seus líderes, para Roberto Heras há mais de uma década, para Vincenzo Nibali e Aru depois. Também passou alguns anos carregando a responsabilidade de uma equipe, a Lampre, e chegou a ganhar um Giro d'Itália, em 2011, depois da desclassificação de Contador. Nunca deu uma importância extrema a essa vitória conseguida fora das competições, nunca se vangloriou dessa camiseta rosa. Sua idade e sua experiência, sua trajetória por todos os lados do ciclismo, o obscuro, o brilhante e o turvo, lhe permitiam relativizar qualquer circunstância.

Scarponi foi contratado há mais de 12 anos por Manolo Saiz para sua equipe Liberty, na qual correu até maio de 2006, quando a Operação Porto (escândalo de dopping no ciclismo) acabou com os sonhos de grandeza do técnico espanhol e quase com a carreira de Scarponi, que então passou a ser mais conhecido como Sapateiro, o apelido com o qual Eufemiano Fuentes, grande etimólogo (scarpa, em italiano, é sapato) o designava em suas listas de bolsas de sangue congeladas. “Nunca esquecerei Pajares”, escreveu no Twitter Saiz, que lembrou a maior exibição tático-estratégica de sua equipe. Aconteceu em uma etapa da Volta da Espanha de 2005, que era dominada por Denis Menchov. No dia seguinte à etapa dos Lagos, quando tudo já parecia perdido para sua Liberty, Saiz enviou meia equipe ao ataque. Chovia. A etapa era marcada pelos vales de mineração asturianos, com descidas perigosíssimas. Os ciclistas de Saiz escaparam e foram se colocando estrategicamente à frente, esperando o ataque de seu líder, Roberto Heras. Alguns, inclusive, desceram da bicicleta e se abrigaram na lateral da estrada sob mantas oferecidas pelos moradores.

Quando Heras, que aproveitou o medo de Menchov nas descidas, os alcançou, um a um, Caruso, Beloki, Vicioso e Scarponi organizaram um trem azul, a cor da Liberty, que dominou a prova. Heras tirou mais de cinco minutos de Menchov. Scarponi foi o último que resistiu a seu lado. Acabou a Volta em 12º, a mais de meia hora de Heras, que semanas depois foi desclassificado por doping.

Scarponi confessou sua implicação na Operação Puerto e passou 16 meses suspenso. Depois se transformou em um personagem único de um ciclismo italiano envelhecido e em crise. Tão único como os vídeos que tuitava de seus treinamentos de inverno, pedalando com um papagaio falante no ombro.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_