Nota em defesa do Estado Islâmico é achada junto ao corpo do atirador de Paris
Extremista foi identificado como Karim Cheurfi, um francês de 39 anos recentemente radicalizado
A imprensa francesa identificou nesta sexta-feira o autor do ataque terrorista que na noite de quinta-feira deixou um policial morto na avenida Champs-Élysées, em Paris, como Karim Cheurfi, um francês de 39 anos com antecedentes penais e que pelo menos desde o começo do ano estava na mira das forças antiterroristas por sua possível radicalização. Segundo Le Monde, em sua residência, em um subúrbio de Paris, os investigadores acharam “elementos de radicalização”. A agência France Presse afirma, por sua vez, que perto do corpo de Cheurfi foi encontrada uma nota defendendo o Estado Islâmico, que na véspera se apressara em reivindicar a autoria do ataque qualificado como terrorista pelas autoridades francesas.
Cheurfi era, como já havia antecipado o Ministério do Interior na noite de quinta-feira, um homem “conhecido” da polícia e com uma “pesada” ficha policial: esse homem, nascido em 1977 em Livry Gargan, em Seine-Saint-Denis, ao norte de Paris, foi condenado a 15 anos de prisão em 2015 por ter tentado matar três homens, dois deles policiais, em 2001. Saiu da cadeia em 2013, mas um ano depois voltou a ser condenado, desta vez, por roubo agravado. Apesar de a pena ser de quatro anos, Cheurfi saiu em 2015 em liberdade condicional.
Possível radicalização
Segundo Le Monde, Cheurfi começou a ser vigiado por sua possível radicalização no final de 2016. Uma pessoa alertou que ele havia manifestado a “intenção de matar policiais para vingar os muçulmanos mortos na Síria”, assinalou o jornal, citando fontes não identificadas. Também havia tentado adquirir armas e procurou contatar uma pessoa que combatia com o Estado Islâmico na região sírio-iraquiana.
Em 23 de fevereiro foi preso, embora tenha sido solto um dia mais tarde por falta de provas, de acordo com a France Presse. Desde março era alvo de uma investigação da Direção Geral de Segurança Interna (DGSI) por suas tentativas de entrar em contato com combatentes do Estado Islâmico, mas, segundo Le Monde, não se considerou que sua periculosidade fosse caso prioritário. Atualmente, a DGSI tem em sua mira cerca de 2.000 pessoas vinculadas às redes sírio-iraquianas, o que dificulta a vigilância constante, recorda o jornal.
A France Presse informa, com base em uma fonte próxima à investigação, que perto do corpo de Cheurfi, que foi abatido pela polícia depois de matar o agente Xavier Jugele, de 37 anos, e ferir outros dois, foi encontrada uma nota manuscrita na qual o Estado Islâmico era defendido.
No carro, que usou para se deslocar até a altura da Champs-Élysées, onde estava estacionado o furgão policial contra o qual disparou, foram achados uma espingarda, duas grandes facas e tesouras de poda. Havia também um Corão.
O Estado Islâmico assumiu rapidamente a autoria do atentado, mas o fato de ter identificado como autor um homem com um nome diferente do de Cheurfi provocou muitas dúvidas sobre a veracidade de suas afirmações. Em uma mensagem de sua “agência de comunicação”, a Amaq, o Estado Islâmico afirmou que o terrorista se chamava Abu Yusuf al Beljiki ('o belga'). Esse pseudônimo ou nome de guerra é utilizado também em circunstâncias em que os terroristas não são necessariamente nascidos na Bélgica, mas que possam ter se radicalizado nesse país.
Nesta sexta-feira foi informado que as autoridades belgas tinham alertado seus colegas franceses sobre um suspeito do qual lançaram uma ordem de busca e captura. Pouco depois, o porta-voz do Ministério do Interior francês, Pierre-Henry Brandet, confirmou que esse homem se apresentou voluntariamente em uma delegacia da cidade belga de Antuérpia. Não foi revelada sua identidade. A procuradoria belga destacou que não há nenhum vínculo entre o ataque terrorista de Paris e a Bélgica, embora tenha afirmado que as investigações prosseguem. O ministro belga do Interior, Jan Jambon, insistiu em que o principal suspeito é francês.
O extremista saiu de um carro no início do anoitecer da quinta-feira e disparou contra um agente que se encontrava em um veículo policial estacionado de um lado da Champs-Élysées, um dos lugares mais turísticos de Paris, repleto de lojas e restaurantes. Depois de matar o primeiro policial, o agressor foi para a calçada, de onde disparou contra outros dois agentes, até ser abatido por outro policial. Apesar da gravidade de seus ferimentos, a vida dos dois agentes atingidos, disse o porta-voz da Polícia Nacional, Jérôme Bonet, à rede BFM-TV.
"Não podemos ceder ao medo"
“Nada deve impedir este momento democrático fundamental para nosso país”, declarou nesta sexta-feira o primeiro-ministro francês, Bernard Cazeneuve, que fez um chamado também a que se combata “o obscurantismo e a intolerância”. “Não podemos ceder ao medo e à intimidação, à manipulação que faria o jogo dos inimigos da República”, insistiu Cazeneuve ao término de uma reunião do Conselho de Defesa realizada à primeira hora da manhã no Palácio do Eliseu. No encontro, convocado à noite pelo presidente, François Hollande, e do qual participaram os ministros da Defesa, do Interior e da Justiça, foram revisados e reforçados os dispositivos de segurança preparados “há meses” para as eleições e que implicam o deslocamento de mais de 50.000 membros das forças de segurança por todo o país.
Uma nova estratégia do Estado Islámico?
A identificação do suposto autor do ataque em Paris no comunicado do Estado Islâmico é, sem dúvida, uma novidade, já que a organização terrorista não costuma operar desse modo. Surpreendem tanto a rapidez com a qual a agência Amaq difundiu o comunicado nomeando Abu Yusuf al Beljiki como também a identidade citada. Serve de exemplo o atentado de 13 de novembro de 2015: o Estado Islâmico levou dois meses para identificar e elogiar os autores do massacre por intermédio de seu órgão mensal de propaganda, a revista Dabiq. Praticamente todos os extremistas do 13 de novembro estavam mortos, por isso não havia risco de captura.
Entre as hipóteses aventadas pelos especialistas sobre essa nova mudança está a tentativa de que o efeito do terror do ataque seja mais rápido, faltando apenas dois dias para as eleições, ou até o esforço do aparato de propaganda jihadista de despistar os serviços de inteligência franceses. De qualquer modo, e apesar da magnitude dos ataques jihadistas mais letais dos últimos anos na França, os atentados contra o Charlie Hebdo, com o selo da Al Qaeda, e a matança de 13 de novembro, organizada a partir da Síria pelo Estado islâmico, o modus operandi do atacante de Paris se encaixa no terrorismo de linha islâmica que há 30 anos vem golpeando a França, desde os atentados de inspiração argelina: as forças de segurança como alvo de ataques não indiscriminados. Além disso, o autor do atentado que matou na quinta-feira o policial francês seguiu a tendência apontada pelo professor Olivier Roy para definir a última geração de jihadistas, seu aparente desejo de morrer no ataque.
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