_
_
_
_

Thiago Peixoto, as batalhas por trás do homem do apito

O árbitro que cometeu um erro estrondoso no Dérbi da última quarta coleciona altos e baixos dentro e fora do campo

Thiago e a esposa Gabriela, que faleceu no ano passado.
Thiago e a esposa Gabriela, que faleceu no ano passado.Reprodução

Thiago Duarte Peixoto ficou com seu nome marcado após o clássico entre Corinthians e Palmeiras, disputado na última quarta-feira, em Itaquera, e vencido pelo time alvinegro por 1 a 0. O árbitro de 37 anos cometeu um erro marcante no confronto, fato que resultou em uma enxurrada de críticas ao seu trabalho, além do seu afastamento temporário das partidas. O juiz confundiu o autor de uma falta e expulsou o jogador Gabriel que sequer participava do lance. A confusão deixou o time da casa com um a menos, o que causou muita irritação entre os corintianos e a torcida. Um episódio a mais numa carreira marcada por outra polêmica e por dramas familiares. Em um período de cinco anos, Thiago perdeu a mãe para o câncer, e a esposa, que acabara de dar a luz ao filho Gael num parto prematuro.

Mais informações
Corinthians vence o Palmeiras por 1 a 0 com gol no fim e jogo polêmico
‘Menino anjo’ da Chapecoense realiza o sonho de conhecer James Rodríguez

“Sei da qualidade dele, e nós aceitamos as críticas construtivas. Mas o que entristece é quando duvidam da idoneidade do meu filho”, afirma Onilson Carlos Duarte Peixoto, pai de Thiago, ao EL PAÍS Brasil. Dois anos atrás Onilson viu o filho conviver com a primeira controvérsia de sua carreira, também num jogo entre Corinthians e Palmeiras. Em abril de 2015, uma foto de Thiago com a camisa do Timão doada à Santa Casa de Barretos foi divulgada nas redes sociais, e assim se espalharam os boatos de que seria um corintiano a apitar o clássico. “Foi aí que vimos a maldade do ser humano. A foto tinha sido tirada quatro anos antes, e era por uma boa causa. Não nos arrependemos, mas agora evitamos esse tipo de exposição”, diz o pai. Um mês depois, ele viria a ser promovido à categoria de Aspirante FIFA, abaixo apenas dos juízes da federação internacional, o patamar mais alto a ser alcançado na profissão.

Natural de Barretos, interior paulista, e árbitro formado desde 2003, Thiago vive há anos na cidade de São Paulo, onde também exerce a função de personal trainer – ter dois empregos é comum entre os juízes brasileiros de futebol, uma vez que o trabalho não é profissionalizado no país. Foi a capital o lar dele e de Gabriela Maia, sua esposa, e lá moraram por dois anos até que o imponderável atravessou seu destino. Em março de 2016, com seis meses de gestação, Gabriela contraiu o vírus H1N1, não reagiu bem aos medicamentos e, para segurança do filho, os médicos decidiram, já no sétimo mês, antecipar o parto. Dois dias depois, a mãe sucumbiu ao vírus e não resistiu.

A perda da família fez com que Onilson mudasse sua rotina. “Enquanto eles moravam na capital, eu ficava quase um mês por aqui [Barretos] e só uns quatro ou cinco dias por lá. Depois do que aconteceu, é o contrário. Fico muito mais lá do que aqui. A gente se uniu muito”, contou o pai de Thiago.

Onilson, Ivo Duarte (captador de recursos) e Thiago, na entrega da camisa à Santa Casa de Barretos.
Onilson, Ivo Duarte (captador de recursos) e Thiago, na entrega da camisa à Santa Casa de Barretos.Reprodução

Ele foi e continua sendo uma presença essencial para a recuperação do árbitro. Além de ser pai, ele entende a dor da viuvez, pois a viveu cinco anos antes. Em fevereiro de 2011, vítima de câncer, Neide Maria, mãe de Thiago e esposa de Onilson, não resistiu à doença e faleceu. O pai conta que Neide esteve hospitalizada na Santa Casa de Barretos. A instituição vive de doações. Thiago conseguiu, com a ajuda de um amigo, uma camisa do Corinthians com autógrafos dos jogadores e, em forma de gratidão ao hospital pelos cuidados com a mãe, a doou para que fosse leiloada e ajudasse a arrecadar dinheiro. A foto do árbitro com essa camiseta foi resgatada nas redes sociais quatro anos depois, alvo da primeira polêmica.

O fatídico erro

Após o jogo, Thiago enfrentou vários jornalistas e, num ato incomum, se pronunciou e admitiu seu erro, além de dizer que nada poderia justificar a falha. “Espero que minha carreira continue”, declarou, com a voz embargada, pouco antes de pedir espaço para deixar a improvisada entrevista. Onilson não se omite das críticas. “Ele errou, e todas as críticas são bem-vindas. Não é porque é meu filho, mas ele é bem preparado e está buscando seus objetivos. A vida segue”, disse.

No dia seguinte ao jogo, a Federação Paulista de Futebol (FPF) anunciou o afastamento temporário de Thiago, que agora passará por avaliações psicológicas, físicas e técnicas, feitas pela entidade. “Se acabarem com a carreira dele, ele vai ficar frustrado, assim como eu. Mas não por muito tempo. Depois de tudo que passou, ele é capaz de superar isso também”, garantiu o confiante Onilson.

"A culpa não é só dele. É um problema estrutural", afirma Simon

Guilherme Padin

Carlos Eugênio Simon, ex-árbitro com presença em três Copas do Mundo e comentarista de arbitragem no canal FOX Sports, afirma que não adianta direcionar a responsabilidade só em uma pessoa. "Se tirarem o Thiago, não vai mudar. Em pouco tempo o Pedrinho ou o Joãozinho vão passar pela mesma situação. A culpa foi de todos: os assistentes e o quarto árbitro poderiam ter entrado no gramado para alertá-lo sobre o erro. Falar só pelo fone poderia resultar numa interpretação errada. Além disso, a comissão também falhou ao mandá-lo falar em público após o jogo, não poderiam deixá-lo exposto como fizeram. Há muitos erros para crucificar apenas um", diz ele.

"Eu defendo a profissionalização. Não apenas pelo salário fixo (árbitros recebem por partida no Brasil), mas também, por exemplo, por todo o cuidado psicológico, médico e físico que os jogadores recebem e os juízes não. Se ele já vive nessa pressão, a possibilidade de errar é maior. Mas, se for profissionalizado, ele se sentirá mais valorizado e seguro. O problema está na raiz, na estrutura", encerrou.

Tu suscripción se está usando en otro dispositivo

¿Quieres añadir otro usuario a tu suscripción?

Si continúas leyendo en este dispositivo, no se podrá leer en el otro.

¿Por qué estás viendo esto?

Flecha

Tu suscripción se está usando en otro dispositivo y solo puedes acceder a EL PAÍS desde un dispositivo a la vez.

Si quieres compartir tu cuenta, cambia tu suscripción a la modalidad Premium, así podrás añadir otro usuario. Cada uno accederá con su propia cuenta de email, lo que os permitirá personalizar vuestra experiencia en EL PAÍS.

En el caso de no saber quién está usando tu cuenta, te recomendamos cambiar tu contraseña aquí.

Si decides continuar compartiendo tu cuenta, este mensaje se mostrará en tu dispositivo y en el de la otra persona que está usando tu cuenta de forma indefinida, afectando a tu experiencia de lectura. Puedes consultar aquí los términos y condiciones de la suscripción digital.

Mais informações

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_