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Ativismo nos EUA aflora diante da ameaça de Donald Trump

O medo de retrocessos sociais une a mobilização dos grupos progressistas do país

Dois cartazes sobre marchas contra Trump, no centro de Washington
Dois cartazes sobre marchas contra Trump, no centro de WashingtonPAUL J. RICHARDS (AFP)

É fácil ver cartazes de protesto por esses dias nas ruas de Washington. "Pare o governo Trump-Pence antes do início", diz um deles, da organização Diga não ao Fascismo. "Defenda-se contra Trump", pedem os Socialistas Democráticos da América. O medo de retrocessos sociais no mandato do republicano Donald Trump uniu os ativistas nos Estados Unidos. Não há precedentes, no início de uma presidência, de uma mobilização tão grande nas bases progressistas.

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Estão previstos inúmeros protestos antes, durante e depois da cerimônia de posse, na sexta-feira. Logo depois que Trump fizer o juramento, entrará em ação uma onda de protestos que tem sido preparada por diversas organizações sociais, diante do temor de que o novo presidente possa dilapidar os avanços do democrata Barack Obama. O magnata já insultou mulheres, minorias raciais e religiosas, imigrantes e ecologistas. Muitos grupos encontraram em Trump um argumento para juntar suas ações, que no sábado serão transformada em uma manifestação de milhares de pessoas em Washington, menos de 24 horas depois que ele assuma o poder. O encontro, apoiado por figuras como Gloria Steinem e Harry Belafonte, pode inspirar uma nova era no ativismo nos Estados Unidos, com uma maior participação popular, algo que não acontece desde os anos 1970.

Os sintomas de uma nova etapa de reivindicações chegaram muito cedo. Nos dias seguintes à eleição de 8 de novembro, as manifestações contra a vitória de Trump multiplicaram-se em dezenas de cidades. A União Americana pela Liberdade Civil, uma das maiores organizações de defesa dos direitos civis, recebeu na época mais de 7 milhões de dólares em doações e ganhou mais de 150 sócios.

O exemplo repetiu-se no caso de Planned Parenthood, a organização que oferece atendimento médico a mulheres sem recursos e que tinha sido alvo de ataques de muitos políticos republicanos, que ameaçam retirar a verba pública da instituição.

A história dos Estados Unidos tem apenas dois antecedentes parecidos de protestos antes da cerimônia de posse de um presidente, ambas também de republicanos. A primeira foi em 1973, quando cerca de 60.000 pessoas protestaram contra Richard Nixon, e, em menor escala, em 2001 contra o presidente George W. Bush. Na época, dez pessoas acabaram presas na capital. Mas, em ambos os casos, os protestos aconteceram apenas no dia da posse. Neste sábado, mais de 100.000 pessoas são esperadas na manifestação que desfilará do Capitólio até a Casa Branca.

Cercas de segurança, nesta quarta-feira, no centro de Washington
Cercas de segurança, nesta quarta-feira, no centro de WashingtonBRENDAN SMIALOWSKI (AFP)

Adam Greenberg é um dos organizadores dos protestos ambientalistas que acontecerão na cerimônia de posse e estará também na manifestação de sábado. "É um momento muito crítico. Muitas comunidades estão sendo atacadas", disse. Greenberg participou na quarta-feira de uma reunião de dezenas de grupos de ecologistas em Washington. O encontro visava a pactar uma estratégia comum diante das possíveis políticas do republicano sobre novos oleodutos, acesso a água e proteção de paisagens naturais. O ativista assegura que os grupos já tinham previsto um reforços de suas ações, fosse quem fosse o vencedor das eleições, mas admite que a vitória de Trump "eletrizou" muita gente. "As linhas de batalha estão mais afiadas", afirma. A área do meio ambiente é onde existe um maior temor de retrocesso. Trump ameaça tirar os Estados Unidos do Acordo de Paris, e considera que o aquecimento global é uma invenção da China para prejudicar as indústrias norte-americanas. O republicano colocou gente que nega a mudança climática em sua equipe e aumentou o medo de uma "caça às bruxas" ao pedir informações sobre os funcionários que participaram da agenda ambiental de Obama.

O presidente que está de saída respondeu às ameaças com novas medidas que tratam de blindar seu legado contra a mudança climática. E os cientistas mobilizaram-se para copiar dados do governo sobre o tema, com medo de que a nova administração pudesse apagá-los e que decida cortar gastos de pesquisa a respeito.

A Marcha das Mulheres, como ficou conhecido o evento de sábado, conseguiu reunir várias organizações com um objetivo comum: defender os direitos adquiridos. "Queremos que seja o mais inclusiva possível, ao mesmo tempos que queremos que as mulheres estejam no centro da marcha", disse Bob Bland, uma das organizadoras.

Protesto de uma multidão

A manifestação – como as marchas que acontecerão em outras 100 cidades do país – é um exemplo de como os interesses de todas as minorias se juntaram para pedir mudanças no sistema de Justiça e carcerário, igualdade salarial entre gêneros, fim da violência doméstica, o aumento do salário mínimo e a proteção de direitos reprodutivos, de minorias raciais e imigrantes. Há quem defenda que este vigor ativista deveria ser levado à política, inclusive usar as técnicas de bloqueio frontal que o subgrupo republicano do Tea Party empregou contra o Governo Obama. Três ex-assessores de congressistas estão promovendo um projeto, chamado Guia Indivisível, que defende que o Partido Democrata, em minoria no Congresso, repita a tática do Tea Party, mas com um enfoque defensivo.

"A mudança da política federal nos próximos quatro anos não depende de Trump, mas sim de que nossos representantes o apoiem ou batam de frente", escreveram, no início de janeiro, em um artigo no The New York Times. "Diante da pressão em âmbito local, teremos o poder de moldar o que considerem possível".

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