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Crivella se vê ganhador no Rio e desaparece na reta final da campanha

Imune a acusações, senador preserva 26 pontos de vantagem frente a Marcelo Freixo

A jornalista Ana Luiza Guimarães, sozinha na bancada do RJTV após a ausência de Marcelo Crivella.
A jornalista Ana Luiza Guimarães, sozinha na bancada do RJTV após a ausência de Marcelo Crivella.Reprodução/TV Globo
María Martín

A apresentadora do RJTV Ana Luiza Guimarães, o principal da TV Globo no Rio, entrevistou na última terça-feira uma poltrona de couro bege vazia, que fazia as vezes de Marcelo Crivella (PRB), favorito nas pesquisas para conquistar a Prefeitura do Rio de Janeiro.

Estas perguntas e outras muitas que questionavam sobre um incidente policial do candidato ou sobre intolerância religiosa foram formuladas ao vivo, mas não respondidas. Crivella recusou o convite na última hora. Era sua forma de mostrar sua “indignação” pela “cobertura tendenciosa da emissora” contra ele, disse. O candidato, bispo licenciado e sobrinho do fundador da Igreja Universal Edir Macedo, controladores da TV Record, cancelou no mesmo dia mais dois encontros com jornalistas, na rádio CBN e no portal G1.

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Confortável com sua vantagem frente a Marcelo Freixo (PSOL) -  lidera com 63% dos votos válidos, Crivella já se vê como futuro prefeito do Rio. Assim, resolveu se recolher, não informar da sua agenda, descumprir seus compromissos com a imprensa, insultá-la, e não se expor diante as acusações que, no final da campanha, questionam a versão moderada que se empenhou em transmitir durante toda a eleição.

Uma reportagem da revista Veja revelou que, 26 anos atrás, Crivella acabou sendo preso ao tentar retirar uma família de um terreno onde a Igreja Universal pretendia construir um templo. O boletim de ocorrência desapareceu dos arquivos policiais. Após a divulgação, Crivella negou ter sido preso e afirmou que apenas foi lá pra conferir um muro que tinha risco de queda. A revista, no entanto, revelou os áudios onde ele detalha a ação: “Cara, teve um dia que eu tava tão revoltado, eu acordei de manhã, levei os caminhões que a gente tinha, fui pra lá, arrebentei aquela cerca, entrei lá dentro, comecei a tirar as coisas do cara, botar em cima do caminhão, não toquei nas pessoas”.

– Por que o senhor não recorreu à Justiça ao invés de fazer justiça com as próprias mãos?, perguntou a repórter do RJTV.

– (silêncio).

Também saíram à luz trechos de um livro do senador, lançado no Brasil em 2002, no qual demoniza outras religiões e classifica a homossexualidade de “conduta maligna” e de “terrível mal”. Crivella desculpou-se e se defendeu dizendo que aprendeu dos erros do passado e que antes era intolerante, mas hoje prega pelos direitos para todos. Um vídeo mais recente, de 2012, registra Crivella associando a homossexualidade a tentativas frustradas de aborto e sofrimento do feto.

– Candidato, o seu pedido de desculpas se sustenta de pé se a intolerância se repetiu em 2012, quatro anos atrás?

– (silêncio).

Em um outro vídeo, datado em 2011, Crivella aparece dizendo que foi escolhido pela Igreja Universal a entrar em política e que algum dia “esta nação vai eleger um presidente evangélico”. “E aí, queridos irmãos”, diz ele, “nós poderemos ser a igreja evangelizadora dos últimos dias e levar o evangelho a todas as nações da terra”.

Para se defender das repetidas denúncias, Crivella tem xingado os jornalistas da Veja e do jornal O Globo com termos como "pateta", "patife" e "vagabundo". Além da animosidade comum da campanha, há um pano de fundo que complica ainda mais o relacionamento do senador com a imprensa em geral: o enfrentamento entre conglomerados de comunicação. Crivella é ligado à TV Record, a principal concorrente da TV Globo, a joia da coroa do grupo Globo.  

Campanha de ataques e sem propostas

As inserções publicitárias tem sido também alvo de polêmica e são um exemplo de como o segundo turno trocou o debate de propostas para a cidade por ataques. A troca de farpas entre Freixo e Crivella fez mais que triplicar o número de ações por direitos de resposta em tramitação na Justiça, segundo o portal UOL. Se no primeiro turno, quando 11 candidatos concorriam à Prefeitura, houve 32 processos, essa cifra chegou a 109 no segundo turno.

Freixo tem aproveitado seu tempo de televisão para associar Crivella ao fanatismo religioso e aos pensamentos do tio, Edir Macedo, recolhidos num livro, organizado pelo senador, no qual prega que a Igreja Católica é “a maior praga do Terceiro Mundo” e que a “mulher de Deus” deve cuidar do lar e da família. Crivella não ficou atrás e reforçou todos os preconceitos que os setores mais radicais, entre eles a família Bolsonaro, têm sobre Freixo, sobre tudo a afirmação falsa de que o deputado, com um amplo histórico de defesa dos direitos humanos, "defende bandidos".

O juiz responsável pela fiscalização eleitoral e o deferimento do direito de resposta, Marcello Rubioli, vêm criticando o tom de uma campanha que já qualificou “de barraco”, de “nível baixo” ou “briga de gangues”.

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