Entenda quem a metralhadora giratória de Delcídio acertou
Delação de Delcídio atinge de Lula e Dilma ao oposicionista Aécio Neves e o vice Michel Temer
A delação de Delcídio do Amaral, senador que está de saída do PT, foi mais um terremoto em terra devastada para o Governo. Ao contrário de outras delações, desta vez a presidenta Dilma, que passou ilesa ao longo de dois anos das investigações da Lava Jato, é citada em diversas ocasiões. O mesmo acontece com o ex-presidente Lula e o senador Aécio Neves. O vice Michel Temer, assim como senadores petistas e do PMDB também foram mencionados por Delcídio, embora sem riqueza de detalhes. Todos negam as informações. Acompanhe abaixo as principais acusações a personagens decisivos da República brasileira.
Dilma Rousseff
Em sua delação, Delcídio acusa a presidenta Dilma de ter agido no sentido de influenciar a libertação de réus presos pela Operação Lava Jato. Primeiro, ela teria se reunido em Portugal com os ministros do Supremo Tribunal Federal Ricardo Lewandowski e Teori Zavaski (relator da Lava Jato no STF) para discutir os rumos da Operação Lava Jato. O senador afirma que se tratou “de uma primeira investida frustrada”, uma vez que a resposta dos ministros foi “árida” e “sem feedback”. Posteriormente o então ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, teria dito a Delcídio que a nova “estratégia seria buscar a nomeação de Marcelo Navarro Dantas” para o Superior Tribunal de Justiça. O objetivo da manobra seria "esvaziar a Operação Lava Jato” na corte. Posteriormente, o magistrado “cumpriu o "compromisso" e deu um voto favorável à liberação de réus da Operação Lava Jato, enquanto o restante da turma votou contrariamente”. Questionado pelos procuradores qual o interesse do Planalto em “esvaziar” a operação, Delcídio afirma que “existiam figuras na operação de importância para o Governo, o que trazia uma série de receios, de caráter político, econômico para as empresas, de proteção aos doadores de campanha, sobre os partidos políticos, de revelação de informações, dentre outros interesses”.
O delator também afirma que a presidenta (à época ministra chefe da Casa Civil) teria agido em 2008 para concretizar a indicação de Nestor Cerveró para a diretoria financeira da BR Distribuidora. Dilma teria ligado para Delcídio e questionado se Cerveró “estaria sendo indicado ou não para a diretoria”. O senador disse que não sabia, e a ministra respondeu “que aquilo poderia ser uma iniciativa de José Gabrielli para indicar alguém dele no lugar”. No final, “Dilma teve atuação decisiva” para a confirmação do nome de Cerveró.
Outro ponto em que Dilma é citada pelo senador é com relação à aquisição da refinaria de Pasadena. O negócio, que deu prejuízos milionários à Petrobras, teria sido fechado com o conhecimento da petista, que era presidenta do conselho de administração da Petrobras. De acordo com o senador, houve “aquiescência do conselho em relação ao qual (...) não há qualquer possibilidade de isenção de responsabilidade”. Delcídio diz que ao conhecer a operação de compra da refinaria entendeu “que haviam sido cometidos ilícitos”.
Propina de Belo Monte em campanhas de Dilma
As licitações e obras envolvendo a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte também aparecem na delação de Delcídio. O senador aponta que “a propina de Belo Monte serviu como contribuição decisiva para as campanhas eleitorais de 2010 e 2014”. Segundo o petista, os valores pagos para o PT e PMDB chegaram a 45 milhões de reais. As propinas pagas ao PMDB teriam ido para o grupo de José Sarney, “do qual fazem parte Edison Lobão (...), Renan Calheiros, Romero Jucá, Valdir Raupp e Jader Barbalho”. Renan, que é presidente do Senado, o ex-ministro das Minas e Energia e hoje senador Edison Lobão, além dos senadores Raupp e Jucá, são alvos de inquéritos na Lava Jato.
Já o dinheiro pago ao PT teria abastecido as duas campanhas de Dilma Rousseff e “outras” da legenda. Os principais articuladores do esquema por parte do Governo seriam os ex-ministros Antonio Palocci, Erenice Guerra e Silas Rondeau, a quem Delcídio se refere como sendo um “triunvirato” em Belo Monte. Da parte das empreiteiras, o agente negociador do consórcio encarregado das obras foi o empreiteiro Flavio Barra, da Andrade Gutierrez. Além disso, o senador petista também cita a “influência direta do ex-governador Eduardo Campos [morto em 2014] a favor, especificamente, da empresa IMPSA”.
As 186 citações a Lula
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem o nome citado 186 vezes na delação de Delcídio. O senador afirma, por exemplo, que Lula “pediu expressamente” que ele “ajudasse” o pecuarista José Carlos Bumlai - amigo pessoal do ex-presidente -, a convencer o ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, preso na Lava Jato, a não incluir o nome do empresário em sua delação. Delcídio afirma ter entregue pagamento de 250.000 reais para comprar o silêncio do ex-diretor, dinheiro este que “partiam da família de Bumlai”.
Também afirma que Lula “teve participação em todas as decisões relativas às diretorias das grandes empresas estatais, especialmente a Petrobras”. De acordo com o senador, o ex-presidente articulou a nomeação de Nestor Cerveró para a diretoria internacional da estatal: "houve uma reunião com o presidente Lula" para cravar o nome do diretor. Delcídio disse ter participado de encontro com "Lula e Zeca do PT em que foi sacramentada a nomeação de Nestor Cerveró para a diretoria internacional da Petrobras".
Lula também teria pedido a Delcídio que “visse” a questão da convocação de Mauro Marcondes e de sua esposa, amigos do ex-presidente, para depor na CPI do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CPI), que gerou a operação Zelotes. Além disso, o senador afirma que Lula também agiu para comprar o silêncio do publicitário Marcos Valério durante o escândalo do mensalão.
Mercadante
O ministro da Educação foi diretamente atingido pela delação de Delcídio do Amaral. Ex-ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante foi apontado pelo senador como um agente do Governo Dilma Rousseff contra o andamento das investigações da Operação Lava Jato. “A mensagem de Aloisio Mercadante, a bem da verdade, era no sentido do depoente não procurar o Ministério Público Federal para, assim, ser viabilizado o aprofundamento das investigações da Lava Jato”, relata o texto da delação tornada pública nesta terça. O impacto foi tão forte que Mercadante convocou uma entrevista coletiva para dizer que o encontro com Eduardo Marzagão, assessor de Delcídio, não tinha a intenção de fazer a “ameaça velada” alegada por Delcídio no depoimento à PGR. Segundo Mercadante, a iniciativa de oferecer ajuda ao senador partiu dele, e não do Governo, e não passava de um gesto de “solidariedade pessoal”.
Aécio Neves: Furnas e mensalão tucano
A principal acusação feita pelo ex-petista contra o colega senador envolve um antigo fantasma dos tucanos: a lista de Furnas, divulgada em 2006. O texto trazia uma relação de 156 políticos que, nas eleições de 2002, teriam recebido dinheiro de caixa 2 da Furnas Centrais Elétricas, empresa de capital misto subsidiária da Eletrobras. Segundo Delcídio disse aos procuradores da força-tarefa, “um dos beneficiários dos valores ilícitos [de Furnas] sem dúvida foi Aécio Neves”. Estima-se que 5,5 milhões de reais tenham irrigado sua campanha para o Governo de Minas. Delcídio detalha o que teria ouvido de Lula em 2005, quando ele era presidente: “Eu assumi e o Janene [José Janene, ex-líder do PP na Câmara, morto em 2010] veio me pedir pela permanência dele, depois o Aécio e até o PT, que era contra, já virou a favor da permanência. [Dimas] Deve estar roubando muito!". Na interpretação de Delcídio, a frase de Lula indica que “seria necessário muito dinheiro para manter três grandes frentes de pagamentos [de propina] a três partidos".
Além disso, o petista acusa o tucano de ter agido para atrasar investigações da CPI dos Correios, de 2005, que poderiam jogar luz no mensalão tucano, até então apontado o embrião do mensalão petista. O chamado mensalão tucano foi um esquema de corrupção no qual o Banco Rural teria sido usado para financiar de forma fraudulenta a campanha de Eduardo Azeredo (PSDB) nas eleições de MG em 1998. Durante a CPI, Delcídio era presidente da comissão, que havia aprovado a quebra do sigilo do banco. “Curiosamente, quando foi feito este pedido de quebra dos sigilos do Banco Rural começou a surgir um certo incômodo por parte do PSDB”. Mais à frente, ele afirma que “o então governador Aécio Neves era uma dessas pessoas incomodadas com essa quebra (...) Aécio Neves enviou emissários para que os prazos de entrega das quebras de sigilo fossem delongados". A desculpa apresentada pelo tucano foi a de que "não haveria tempo hábil para preparar essas respostas”.
Renan Calheiros e a bancada do PMDB no Senado
Delcídio conta em sua delação que “a bancada do PMDB no Senado tem um núcleo duro” composto pelo presidente da Casa, Renan Calheiros, e por Romero Jucá, Eunicio Oliveira, Valdir Raupp e Edison Lobão. De acordo com o delator, “esse núcleo monopoliza as indicações, não apenas nas empresas de energia, mas também nas agências reguladoras e Ministérios”. Os interesses do grupo seriam, “não apenas políticos, mas também próprios”. Nas palavras de Delcídio, Renan é “muito cuidadoso e discreto nas suas articulações”, e “normalmente se serve de terceiros” nas negociatas. "O presidente da Eletronorte atual é indicação de Jader (Barbalho, senador pelo Pará) , e a Eletronorte atende Raupp, Jader e Juca", afirma o delator.
Além da Eletronorte, o arco de influência deste grupo se estende à Eletrosul, à Eletronuclear e às diretorias abastecimento e internacional da Petrobras. "A ação desse grupo se fez presente em subsidiárias da Petrobras como, por exemplo, a Transpetro. Lá reinou, absoluto, durante 10 anos, Sergio Machado, indicado por Renan Calheiros. Seguidas vezes o vi, semanalmente, despachando com Renan na residência oficial da presidência do Senado".
Esse “núcleo duro” do PMDB no Senado seria destinatário da cota do partido nas propinas pagas pelas empreiteiras por contratos firmados com a Petrobras e outras obras do Governo, como a hidrelétrica de Belo Monte.
Teriam “jogado pesado” ainda na indicação para as Agência Nacional de Saúde e para a Agência Nacional de Vigilância Sanitária. “Com a decadência dos empreiteiros, as empresas de planos de saúde e laboratório se tornaram os principais alvos de propina para os políticos e executivos do Governo”, descreve a delação.
Michel Temer
O senador Delcídio insinua que há uma relação suspeita do vice-presidente Michel Temer com um ex-diretor da Petrobras, João Augusto Henriques, que dirigiu a BRDistribuidora entre 1998 e 2000. Desde setembro Henriques está preso em Curitiba por operar em nome do PMDB na Petrobras. Segundo Delcídio, Henriques teria participado de uma compra ilícita de etanol entre 1997 e 2001, sob apadrinhamento de Michel Temer. Segundo o relato de Delcídio, “a relação de João Henriques e Michel Temer é antiga e explica a sucessão de Nestor Cerveró na diretoria Internacional da Petrobras”. Henriques teria sido indicado para suceder Cerveró, mas Dilma vetou a nomeação. Assumiu Jorge Zelada, preso por burlar regras de governança da Petrobras para favorecer contratos que lhe garantiram propina milionária. Zelada foi indicado por Henriques.
Gleisi Hoffman e Humberto Costa
Segundo Delcídio, é notória a relação da senadora petista do Paraná, Gleisi Hoffmann, com a empresa Consist, que teria atuado como braço financeiro dela e seu marido, o exministro Paulo Bernardo, desde que trabalharam no governo de Zeca do PT, no Matro Grosso do Sul, em 1999. Delcídio afirmou que “existem provas incontestáveis sobre isso”. Aponta, ainda, a passagem da senadora pela diretoria da hidrelétrica de Itaipu, entre 2003 e 2006, quando ela teria gerenciado muitos aditivos de contratos de obras. O mesmo valeria para o porto de Santos, enquanto ela foi ministra da Casa Civil (2011 e 2014).
Delcídio aponta, ainda, que o senador Humberto Costa (PT-PE), que agiria como parceiro da empresa White Martins, grande contribuinte das suas campanhas e que teria proximidade com o ex-diretor da Petrobras, Paulo Roberto Costa.
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