Lula vai a Brasília discutir ministério e impacto da delação de Delcídio
Ida de ex-presidente para gabinete era dada como certa até acusações de senador virem a público
O Governo Dilma Rousseff tinha partido para o tudo ou nada. Depois de dias de especulações, a presidenta se preparava para oficializar que seu antecessor e padrinho político, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), seria ministro, o mais provável que da Secretaria de Governo, pasta até então ocupada pelo petista Ricardo Berzoini. A informação, na segunda-feira, era que faltava apenas uma reunião entre Lula e Rousseff para discutir os últimos detalhes. A viagem do ex-presidente para debater o tema está mantida para a tarde desta terça, mas as tratativas para o novo gabinete foram atropeladas pelo impacto político da homologação da delação do senador Delcídio do Amaral, o que poderia adiar ou mudar os planos de anúncio.
A cartada de Lula no ministério é considerada arriscada tanto para a presidenta como para o ex-metalúrgico. O argumento oficial para que Lula aceite é que ele precisa ajudar o Governo na articulação política junto ao Congresso Nacional, onde a gestão vê sua base aliada se esfacelar a cada dia enquanto a ameaça do impeachment se torna cada vez mais concreta. Se assumir um cargo na Esplanada dos Ministérios, Lula ganha também a prerrogativa de foro privilegiado. Ou seja, só pode ser julgado pelos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Antes, sem nenhum cargo no Executivo ou no Legislativo, Lula poderia sentar no banco dos réus diante de Sérgio Moro, o juiz da Operação Lava Jato que agora concentra todos os casos em curso envolvendo o ex-presidente.
Segundo fontes ligadas ao Planalto, Dilma também quer conversar com Lula para "delimitar" o campo de atuação de cada um neste inédito arranjo com dois "presidentes" no palácio _a Secretaria de Governo, que cuida da interlocução com sindicatos e movimentos sociais, fica no edifício. Seja como for, se oficializada, a presença de Lula de volta em Brasília é interpretada como um sinal de que Dilma Rousseff aceitou dividir o poder com o antecessor e engolir a imagem de tutelada pelo mentor porque não lhe restou mais escolha. Ao integrar Lula ao gabinete, a mandatária se enfraquece mais ainda e traz para o palácio o atual centro da Lava Jato. Ela reconhece a auxiliares, no entanto, que Lula pode ser sua última cartada para tentar conter a debandada de aliados do PMDB no Senado, até então fiéis. No sábado, a sigla, maior aliada do Governo, decidiu dar um aviso prévio ao Governo: em 30 dias decidirá se deixa ou não a coalizão.
Para Lula voltar ao Governo também embute riscos. O convite ao ex-presidente foi feito na semana passada, e, segundo aliados, ele chegou a avaliar que aceitar o cargo seria uma admissão tácita de culpa por causa do foro privilegiado. Há também a leitura de que Lula, se integrado ao gabinete, pode acabar minando suas chances de concorrer em 2018 ao se fundir ao Governo que enfrenta crise econômica e exibe baixíssimos índices de popularidade. A aprovação de Rousseff é uma das menores entre os presidentes brasileiros já registrada. Atualmente, conforme a última pesquisa Datafolha do fim de fevereiro, a rejeição chegou aos 64%. No ano passado atingiu 71%.
"Se Lula for ao ministério é uma cartada de alto risco. Uma aposta nas bases e na capacidade de articulação política de Lula. Simbolicamente, no entanto, fica um amargo gosto de desespero, da perda de pulso firme para segurar as rédeas da nação. Quem foi para as ruas neste domingo contra o Governo ficará indignado. É tudo ou nada", diz Rosana Pinheiro Machado, professora de antropologia na Universidade de Oxford.
Já petistas, como o ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, dizem que o foro privilegiado a que Lula teria direito nem sempre é benéfico e negam que a motivação do ex-presidente teria sido a de se proteger da Justiça. “O mensalão foi todo julgado aqui [no STF] e isso não me parece que é um território de privilégio”, lembrou Wagner. No caso do mensalão, boa parte dos políticos envolvidos, acabou condenada, entre eles antigos membros da cúpula do PT, como os ex-deputados José Dirceu, José Genoíno, João Paulo Cunha e o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares. O oposicionista, DEM, no entanto, já prometeu questionar na Justiça a nomeação por meio de uma ação popular.
Os opositores já preparam seus argumentos contrários à possível nomeação. Dizem que ela seria "desvio de finalidade", porque teria como único objetivo dar a ele um "abrigo no STF". O advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, se prepara para uma batalha jurídica. "Não há óbice legal na nomeação dele. Desde o primeiro mandato, a presidenta só nomeia com base na Lei da Ficha Limpa, que prevê que estão limpas as pessoas que não tem condenação em segunda instância. E até o momento, o ex-presidente é um investigado. Ter foro privilegiado não é fugir da Justiça", disse Cardozo.
Nas mãos de Moro
O PT e boa parte de seus filiados vinham pressionando Lula a assumir um ministério, mas o assunto ganhou ainda mais fôlego depois que a juíza da 4ª Vara Criminal Estadual de São Paulo, Maria Priscilla Veiga Oliveira, decidiu, na segunda-feira, remeter um processo que tramitava no Estado contra ele para o juiz da Lava Jato, da Justiça Federal de Curitiba. A magistrada, que também indicou que é Sérgio Moro quem deve julgar se é pertinente ou não o pedido de prisão preventiva feita por promotores paulistas, entendeu que, como já há um processo investigando Lula por lavagem de dinheiro na esfera federal, não caberia a ela, da Justiça estadual, julgá-lo.
A defesa do ex-presidente reagiu. Anunciou ter pedido que o Supremo analise com urgência se o caso de Lula deve ficar em São Paulo ou com Moro. Na argumentação dos advogados de Lula, a investigação deve ficar no nível estadual, longe da Lava Jato. O ex-presidente Lula é suspeito de ocultar seu patrimônio e de receber favores de empreiteiras que tinham contrato com o Governo, como a OAS e a Odebrecht. Os alvos dos investigadores são um sítio em Atibaia e um apartamento tríplex no Guarujá, ambos em São Paulo. No âmbito da Lava Jato, também são investigados um dos filhos do ex-presidente, além de sua mulher, Marisa Letícia. A princípio, só Lula seria julgado no Supremo.
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