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‘Dia da Marmota’: Por que o tempo passa mais rápido à medida que envelhecemos?

Para evitar que o tempo passe voando o segredo é evitar os 'dias da marmota' Novas experiências impactam na percepção da passagem do tempo

Jaime Rubio Hancock
Bill Murray em 'Feitiço do Tempo'.
Bill Murray em 'Feitiço do Tempo'.

Já é 2 de fevereiro. E, em alguns países do hemisfério norte, como nos Estados Unidos, já é o Dia da Marmota outra vez. Sim, parece que o do ano passado foi ontem. Ou antes de ontem, não exageremos. À medida que envelhecemos, temos a impressão de que o tempo transcorre mais depressa. E, precisamente, o Dia da Marmota ou, melhor dizendo, os dias da marmota têm muito a ver com isso.

Não esqueçamos que Feitiço do Tempo (Groundhog Day) estreou há 22 anos. Ou seja, já estamos há mais de 20 anos comentando que hoje é o dia em que a marmota Phil sai de sua toca para comprovar se consegue ver a própria sombra ou não –nesta terça-feira, em Punxsutawney, na Pensilvânia (EUA), o Phil original previu que o inverno será curto neste ano.

Em um artigo sobre essa sensação que nos aterroriza porque sentimos que a vida nos escapa das mãos e nos aproximamos da morte – talvez eu esteja ficando intenso –, a revista Scientific American cita o psicólogo William James, que recorda que à medida que ficamos mais velhos passamos por menos experiências novas, temos menos primeiras vezes. Já não há “primeiro dia do colégio”, “primeiro amor” ou "primeiras férias com amigos". Agora é outro dia no escritório, outra manhã no shopping e um terceiro pedido de divórcio.

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Outro estudo sugere que, na realidade, não existe tanta diferença entre idades na percepção do tempo, exceto quando se pergunta: com que velocidade transcorreu a última década? Para as pessoas de 50 anos parece ter passado mais rápido que para os mais jovens. Segundo esse estudo, também ocorre que, ao recordar nossa vida, temos a sensação de que os primeiros anos passaram mais lentamente que os posteriores, embora não sentíssemos essa diferença enquanto os vivíamos.

Todos vamos morrer

Outro fator que influi nessa percepção é que recordamos os eventos memoráveis como mais recentes do que foram na realidade. Surpreende-nos que o Unplugged, do Nirvana, já tenha mais de 20 anos porque gravamos o vídeo do show em uma fita VHS que assistimos dezenas de vezes e quase somos capazes de recordar a ordem das músicas. Trata-se de uma lembrança que mantemos mais nítida na memória que outras que ocorreram mais tarde, por isso nos parece mais recente. Não surpreende, portanto, que existam Tumblrs como o do Hematocrítico que registram efemérides como essa e nos recordam que todos vamos morrer.

Diga “já” quando achar que já passou um minuto

A Scientific American acrescenta que, com a idade, nosso relógio biológico desacelera, por isso o tempo exterior parece ir mais depressa. Quanto mais velhos somos, mais nos custa calcular quando passou um minuto sem olhar o relógio: tendemos a acreditar que demora mais a passar.

Também prestamos menos atenção às datas à medida que envelhecemos. Não nos concentramos tanto em esperar nosso aniversário ou as férias, mas estamos mais dependentes do dia a dia. Do mesmo modo, o estresse e a sensação de que não temos tempo de terminar tudo contribuem para nos dar a impressão de que o tempo passa mais depressa.

A vida é curta (ou pelo menos parece)

Outro fator importante é a relação entre o tempo passado e a idade, como também diz a Scientific American citando um estudo da Universidade de Hokkaido (Japão). Para um menino de cinco anos, doze meses é 20% de toda sua vida, enquanto para alguém de 40, um ano é 2,5%.

Medimos o tempo levando em conta os eventos memoráveis e, se tivermos vidas rotineiras, não haverá muitos desses momentos

Para citar um exemplo do Washington Post: esperar 24 dias antes de abrir os presentes de Natal aos cinco anos é proporcionalmente o mesmo que esperar um ano quando se tem 54. Esse exemplo foi tirado de uma apresentação interativa do desenhista austríaco Maximilian Kiener que ilustra a ideia muito bem usando o mouse. “Como muitas coisas, isso requer um pouco de paciência. Mas ao final terá terminado antes do que pensava ou queria”, escreve Kiener nesse site instrutivo e, ao mesmo tempo, um tanto triste.

“Quando você tem 35 anos, um ano é 2,86% de sua vida. Veja como o tempo passa rápido quando você tem trinta e tantos”. (Da página de Maximilian Kiener).
“Quando você tem 35 anos, um ano é 2,86% de sua vida. Veja como o tempo passa rápido quando você tem trinta e tantos”. (Da página de Maximilian Kiener).

Segundo essa ideia, proposta pela primeira vez pelo filósofo Paul Janet em 1897, “se chegar aos 100 anos, metade do que percebe que é sua vida terá terminado aos 7 anos”. Mas se levarmos em conta que “não lembramos muito bem o que aconteceu nos três primeiros anos”, então essa metade seria aos 18. Mas tecnicamente é possível viver a crise dos 40 aos 7.

“A vida é curta – escreve Kiener. Faça as coisas agora!”.

Isso, faça coisas (desde que você goste)

Uma forma de evitar que o tempo passe em um piscar de olhos é precisamente evitar os dias da marmota: as novas experiências nos levam a criar novas lembranças. É diferente lembrar que simplesmente trabalhamos e fizemos mais ou menos as mesmas coisas todos os dias, de segunda a sexta, do que poder associar experiências concretas a esses dias.

A sensação de que não temos tempo de terminar tudo contribuem para nos dar a impressão de que o tempo passa mais depressa

Medimos o tempo levando em conta os eventos memoráveis e, se tivermos vidas rotineiras, não haverá muitos desses momentos. A isso é preciso acrescentar que essas rotinas não costumam ser especialmente agradáveis. Infelizmente, não passamos o dia deitados, lendo e escutando música, mas no escritório tentando pagar o aluguel.

Também é preciso ter em conta que, embora valha a pena tentar experiências novas e aprender cada dia mais coisas (é óbvio), em geral, o tempo passa mais depressa quando nos divertimos. Como diz na BBC Future Claudia Hammond, autora de Time Warped, sentimos que o tempo passa especialmente devagar quando temos uma febre muito alta, quando nos sentimos rejeitados e quando passamos por uma depressão.

Ou seja, não precisamos nos sentir pressionados a aprender mergulho ou paraquedismo. Podemos voltar para o sofá e ler outro livro. Afinal de contas, não só é importante criar novas lembranças, como também gostar de recordá-las. Mesmo que seja à custa de sentir que o tempo passa voando.

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