UTC, a construtora que cresceu e multiplicou doações eleitorais

Construtora do novo homem-bomba da Petrobras doou 103 milhões para 687 candidatos

Dilma participa de inauguração de obra da UTC, na Bahia, em 2012.Divulgação UTC

De um pequeno ator no mercado das construtoras a um dos maiores prestadores de serviços para a Petrobras. De um minúsculo doador de campanhas eleitorais a um dos principais financiadores de partidos políticos e candidatos. Em pouco mais de 12 anos, a UTC passou por uma revolução. O responsável por isso foi o engenheiro civil Ricardo Pessoa, o sócio majoritário da empresa que agora é considerado o novo homem-bomba da Petrobras e um dos investigados pela Operação Lava Jato.

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Até 2002 a UTC mal aparecia entre as maiores construtoras do país, apesar de já estar atuando no mercado nacional desde 1974. Fundada pelo Grupo Ultra, foi adquirida em 1991 pela empreiteira OAS - que também é alvo da Lava Jato - onde Ricardo Pessoa fez carreira. Ao lado de outros três executivos Pessoa comprou a UTC em 1996 da própria OAS.

No princípio, focou os negócios em pequenas empreitadas. Mas seu crescimento vertiginoso ocorreu durante o Governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) (2003-2010), quando a Petrobras se tornou sua principal cliente. Segundo a revista especializada Portos e Navios, dos 16 grandes contratos de engenharia da UTC, dez são firmados com a Petrobras. A mesma revista aponta que entre 2000 e 2012 a empresa cresceu três vezes mais que a média do setor.

Em um relatório de 2014 da Câmara Brasileira da Indústria da Construção e da revista especializada O Empreiteiro, ela apareceu em dois importantes rankings do setor. Foi a primeira entre as empresas de Construção Mecânica e Elétrica e a 17ª entre as maiores empreiteiras nacionais – nesse caso, seu braço de construção civil, conhecida como Constran. Segundo esse mesmo levantamento, a UTC (junto com a Constran) registrou receita bruta de 4,4 bilhões de reais em 2013.

Nesse mesmo período a empresa aumentou em quase cem vezes os valores doados em campanhas eleitorais. Em 2002, a UTC doou 1,04 milhão de reais para nove candidatos (dois do PT, dois do PSB, e um de cada uma das seguintes legendas: PSDB, PDT, PTB, PPS e PMDB). De lá para cá, com exceção das eleições municipais de 2012, a empreiteira só aumentou os valores entregues aos políticos até chegar à quantia de 103,6 milhões de reais no ano passado, cinco vezes mais que o valor doado nas presidenciais de 2010. Na eleição passada, 687 candidatos foram agraciados com recursos da UTC.

85% dos contratos da UTC são públicos

Considerada uma das maiores empreiteiras brasileiras, a UTC tem 10 bilhões de reais em contratos com a Petrobras, sendo, 4,2 bilhões de reais em contratos exclusivos e 5,8 bilhões de reais como participante em consórcios formados com outras construtoras. A maior parte de seus contratos, 85%, são públicos e apenas 15% privados.

Entre as obras públicas em que já atuou estão a Refinaria Alberto Pasqualini, no Rio Grande do Sul, a Refinaria Presidente Getúlio Vargas, no Paraná, e o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro, o Comperj. Esta é uma das obras em que há várias suspeitas de sobrepreços e outras irregularidades investigadas pela operação Lava Jato.

A investigação do esquema de corrupção atingiu em cheio a empresa, que teve de demitir 15.000 dos 30.000 funcionários desde novembro, e está vendendo participações em negócios importantes, como o aeroporto de Viracopos, em Campinas.

A pecha de empresa envolvida com a Lava Jato não a impede de ser contratada para obras públicas. Até o momento, apenas a Petrobras fechou suas portas para as quase três dezenas de empresas investigadas no escândalo.

No mesmo período também cresceu o número de petistas receptores de recursos da empresa. Em 2014, por exemplo, o PT foi o partido com maior número de beneficiados: 125 no total, que receberam ao todo 43,6 milhões de reais. Foi seguido pelo PCdoB (76), DEM (51), PDT (47) e Solidariedade (34). Entre os tucanos, foram 32, mas em termos absolutos, o PSDB foi o segundo partido que mais recebeu verbas: 21,1 milhões de reais. A então candidata a presidência, Dilma Rousseff, obteve 7,5 milhões. Já Aécio Neves teve 2,3 milhões de reais para sua campanha.

Ao menos teoricamente não é possível afirmar que há algo ilegal nessas doações, já que todas foram registradas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Quem diz que houve algo irregular em algumas delas é o próprio Ricardo Pessoa. Em sua delação premiada, ele afirmou que parte dos recursos desviados da Petrobras abasteceu campanhas políticas como a de Rousseff e a do senador Aloysio Nunes (PSDB). Ambos negam as fraudes.

Na semana passada, quando teve seu termo de delação premiada homologado pelo Supremo Tribunal Federal, Pessoa passou a ser visto como um novo homem-bomba da Petrobras. As informações prestadas por ele implicam ao menos 16 políticos brasileiros e preocupam outras dezenas que foram beneficiados por suas contribuições. Desses casos citados pelo empreiteiro, apenas está integralmente registrado no TSE o da campanha à reeleição de Rousseff.

A ponte

Segundo as investigações, o papel da UTC era de protagonismo entre as empreiteiras que agiam para fraudar as licitações da estatal. Seu presidente era o responsável por fazer a ponte entre as empresas e o doleiro Alberto Youssef. Este, por sua vez era um dos operadores do esquema, e distribuía os recursos das construtoras entre alguns dos diretores da Petrobras e políticos.

Ele ficou pouco mais de quatro meses preso na carceragem da Polícia Federal, em Curitiba. Só foi autorizado a cumprir prisão domiciliar depois de assinar um acordo de delação premiada e aceitar usar uma tornozeleira de monitoramento eletrônico.

Indagada sobre os critérios para definir quem seriam os beneficiados pelas doações, a UTC não se manifestou. Os defensores de Pessoa não retornaram aos recados deixados pela reportagem.

Em nota, o PSDB informou que todas as doações recebidas por seus diretórios e candidatos seguem às regras vigentes. O PT e o senador Aloysio Nunes não responderam aos questionamentos da reportagem.

Ricardo Pessoa, quando foi preso pela PF.Z. Fraissat (Folhapress)

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