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Canta, Mário de Andrade

Gravações inéditas descobertas no Rio de Janeiro revelam a voz do escritor brasileiro

Mário de Andrade em sua casa, em 1938.
Mário de Andrade em sua casa, em 1938.Acervo IEB-USP

Não bastassem as homenagens e os lançamentos ao redor de Mário de Andrade este ano, seus admiradores podem agora se deliciar com o som da sua voz, até pouco tempo inédito. No mês passado, foram reveladas gravações da voz (de barítono) de Mário feitas no Rio de Janeiro por Lorenzo Turner, um linguista afro-americano que veio ao Brasil em 1940 para registrar heranças da cultura negra – de que ele era estudioso – na música do Brasil.

Reuniu nada menos que Mário de Andrade, a escritora Rachel de Queiroz e a pesquisadora Mary Pedrosa para cantar cinco cantigas populares brasileiras e depois comentá-las ao lado do escritor Pedro Nava. São elas Aribu, do Ceará, Zumzum, usada comumente nas rodas de bebida de Minas Gerais, Tava muito doentim, de Pernambuco, Deus lhe pague a santa esmola, típica de mendigos no interior da Paraíba, e Toca zumba, “uma canção de negros do tempo da abolição”, como explica o próprio Mario de Andrade na face B da gravação.

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“Mário de Andrade estudou alucinadamente a origem dessas cantigas. Vemos aí uma inversão de papeis: ele, que normalmente era o pesquisador, se tornou o pesquisado”, afirma a professora e pesquisadora Flávia Toni, do Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo, uma das maiores especialistas em Mario de Andrade no país.

Para Flávia, que alerta que obra musical do modernista – que era professor de piano e, dizem, tinha um ouvido apuradíssimo – é vasta e pouco estudada, o mais interessante da descoberta é “entender por que ele fazia tudo isso”. “Todo mundo tenta interpretar esse amor que ele tinha pelo Brasil e pela cultura popular brasileira. É generosa a pesquisa que ele fez sobre o país, dotada de uma entrega muito grande.

Nessas gravações de Turner, dá pra notar a emoção na voz dele, mesmo depois de conviver por mais de 10 anos com essas músicas”, opina. Ecos do trabalho de Mário de Andrade com as cantigas populares brasileiras podem ser encontrados no CD Na pancada de Ganzá, de Antonio Nóbrega. Trata-se de uma reunião de cantos tradicionais do povo brasileiro – canções de autoria de Nóbrega e de outros compositores pernambucanos –, feita com base no material de pesquisa de Mario. De cara, o título do álbum é do modernista: esse seria o nome que ele daria ao conjunto dos registros musicais que fez em suas viagens ao Norte e Nordeste do Brasil, em 1927 e 1928.

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