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Coliseu recupera a cor do Império

Anfiteatro romano está sendo restaurado graças a um patrocínio de uma empresa privada

Os magnatas Diego e Andrea Della Valle, donos da Tod's, diante do Coliseu.
Os magnatas Diego e Andrea Della Valle, donos da Tod's, diante do Coliseu.R. L. (AP)

Da mais alta cornija do Coliseu, na qual só é possível chegar através do andaime colocado para sua restauração, desfruta-se de uma vista maravilhosa da cidade de Roma. Os 42 metros de altura e uma manhã transparente permitiam, na última sexta-feira, divisar o monte Mario – a colina mais alta da cidade –, a bandeira do palácio do Quirinal, a cúpula da basílica de São Pedro, o Panteão de Agripa e até mesmo, mais abaixo, a fachada avermelhada do ático de Gep Gambardella, o protagonista do filme A grande beleza. Mas também, com a visão aérea, enquanto a restauradora Cinzia Conti, a arquiteta Pia Petrangeli e o engenheiro Stefano Podestà explicavam com paixão seus esforços para restaurar as feridas que os séculos e os homens vêm causando ao anfiteatro romano, era possível dispor de uma clara perspectiva da estupidez humana. Duas patrulhas dos Carabinieri chegavam a toda pressa para deter um turista russo de 42 anos que, utilizando uma pedra afiada, havia gravado a inicial de seu sobrenome, um “k” de dimensões consideráveis, em um muro da casa dos gladiadores.

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O “senhor K”, que coroou sua visita a Roma dormindo na prisão, não é mais que o herdeiro de uma antiga estirpe de bárbaros que, mancomunados com o incêndio do ano 217 ou o terremoto de 1349, foram encarregando-se de desmoronar o anfiteatro que o imperador Vespasiano começou a construir. De fato, um bom número de suas pedras originais foi utilizado para construir palácios e igrejas – incluindo o Vaticano – e muitas joias do barroco foram levantadas sobre o travertino retirado do Coliseu. Por isso o ditado: “O que os bárbaros não fizeram, os Barberini fizeram”. A tendência não se inverteu até o século XIX e começaram – ainda que sempre abaixo do necessário – as obras de restauração. Durante os últimos tempos, rara era a semana que os jornais locais não mencionavam algum incidente relacionado com a má conservação do monumento. O Estado italiano mal conseguia manter um patrimônio infinito, sua maior glória e também sua maior vergonha, e pedaços do próprio Coliseu ou da Fontana di Trevi se desprendiam e quase acertavam algum turista.

Por isso a iniciativa privada, e em especial o empresário Diego Della Valle, dono do grupo de artigos de luxo Tod's, começou a explorar a possibilidade de ajudar nas obras. A restauração do Coliseu, cujo orçamento é avaliado em 25 milhões de euros (79 milhões de reais), está por sua conta. Pia Petrangeli, a arquiteta responsável pelo projeto de patrocínio, explica que “a Superintendência de Bens Culturais de Roma continua destinando parte dos fundos procedentes dos ingressos – por volta de dois milhões de euros (6 milhões de reais) por ano – para a manutenção do monumento, mas isso não é suficiente para dar conta da restauração do Coliseu em seu conjunto. Portanto, a ideia não é substituir o trabalho do Estado, mas garantir a conservação de um monumento que pertence a todos nós”. O projeto, como explica Cinzia Conti, a responsável pela restauração da superfície, pode ser resumido em duas fases: “A primeira é eliminar o depósito de sujeira que os séculos deixaram sob a pedra. E, quando descobrirmos a verdadeira cor do travertino, chegamos ao segundo objetivo: identificar as lesões do monumento”. A limpeza, acrescenta, “é realizada com água atomizada, que é economicamente mais vantajosa – é água de torneira – e sobretudo, menos dano para a superfície. Porque a sujeira não só nos esconde a cor verdadeira, como também os danos estruturais”.

E é aí onde o engenheiro Stefano Podestà entra em ação: “Debaixo da sujeira encontramos fragmentos de pedra de 20 e 25 quilos que estão prestes a se desprender, e precisamos avaliar se devemos fixá-los ou se é melhor retirá-los definitivamente pelo bem da estrutura geral do monumento”. A arquiteta Petrangeli e a restauradora Conti estão de acordo que em nenhum caso trata-se de devolver o Coliseu, de forma artificial, para sua estrutura original, mas sim de respeitar a passagem do tempo: “O caráter atual do Coliseu é o de uma estrutura descontínua, uma geometria arruinada pelo tempo e pela história. Não precisamos repetir o passado, mas revalorizar o que já temos”.

Um monumento que, seja dos 42 metros de sua cornija mais alta ou das galerias subterrâneas pelas quais leões, tigres ou búfalos eram içados para a arena, continua oferecendo um testemunho fiel da grandeza do Império aos milhares de turistas que o visitam por dia. Apesar dos terremotos, os bárbaros locais e estrangeiros e a estupidez do “senhor K”.

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