Abstenção é a mais alta desde 1998
Cerca de 38 milhões de pessoas não escolheram candidato nesta eleição
Os protestos de junho de 2013 fizeram os congressistas temer pelas suas cadeiras. As manifestações representavam um enorme descontentamento político e, no ano anterior à eleição, poderiam ter servido de munição para um debate mais amplo e, talvez, para uma mudança social. Esses gritos das ruas, porém, acabaram não chegando às urnas neste domingo. Mas o silêncio de milhões de eleitores confirma uma tendência crescente de abstenção que vem se repetindo em diversos países. As motivações dos que ficaram em casa ou anularam seu voto nesta eleição compartilham dois elementos comuns: desmotivação e falta de alternativa. “Eu não queria participar desta farsa”, afirma uma jovem advogada do Rio. “Anulei meu voto porque não consegui identificar uma possibilidade real de mudança”, justifica um fotógrafo de Recife. “Eu acredito mais na força da organização autônoma apartidária do que no poder do voto, especialmente nos cargos executivos”, diz um professor de São Paulo.
Assim, esse protagonista silencioso conquistou um lugar destacado nestas eleições. O número de abstenções (27,6 milhões), os votos brancos (4,4 milhões) e os votos nulos (6,6 milhões) somaram neste pleito 29,03%. Isto significa que quase três em cada dez eleitores não escolheram candidato. O número é maior que os 34,8 milhões de votos conseguidos por Aécio Neves. Em São Paulo, onde governador Geraldo Alckmin, do PSDB, ganhou com grande margem no primeiro turno, mais de 36% dos eleitores não votaram em nenhum candidato a governador. No Rio, esse número chega a 37,6%. As duas capitais foram os principais focos dos protestos de 2013.
Marco Antonio Teixeira, do Departamento de Gestão Pública da FGV/EAESP aponta várias razões que poderiam explicar estes números. “Existe uma grande desmotivação, os políticos e os partidos são – segundo as pesquisas – os menos valorizados das instituições brasileiras, e o perfil de muitas candidaturas não conseguiu convencer o eleitor”, avalia. “Outra explicação é o fato da política estar afastada da própria sociedade”, completa.
Teixera acredita que se trata de um dado muito relevante em um contexto de voto obrigatório. A cientista política Maria Socorro Braga, da Universidade Federal de São Carlos, sustenta posição parecida. “Eu falaria de um voto de protesto de um classe média mais informada e inconformada com o sistema”.
O número no Brasil, porém, não é tão expressivo em comparação com algumas democracias onde o voto é voluntário.
Em outros países, onde não é obrigatório ir às urnas, os governantes têm visto com certo espanto o aumento da abstenção. Na Espanha, por exemplo, onde as eleições de 2011 vieram justo depois das grandes marchas populares do movimento que ficou conhecido como 15 M (aconteceu no dia 15 de março), o conservador Mariano Rajoy ganhou com uma das taxas mais altas de abstenção e votos nulos e brancos da democracia: 31,06%. Nas eleições presidenciais francesas de 2012, 22% dos eleitores ficaram em casa ou anularam o voto. Nas legislativas, porém, essa opção disparou a uma cifra recorde de 44,6%. E nos EUA, apesar do fato de que cada vez existem mais fórmulas para garantir a participação – como o voto antecipado –, atingiu 41,8% em 2012.
Na Argentina, onde o voto também é obrigatório, a abstenção e os votos brancos e nulos atingiram 25% do eleitorado nas presidenciais de 2011.
Os números deste ano são os mais altos desde 1998, quando Fernando Henrique Cardoso ganhou em primeiro turno de Luiz Inácio Lula da Silva, e a abstenção e os votos nulos chegaram ao 36%. Para três dos cinco especialistas ouvidos por EL PAÍS, o número aferido nas eleições deste ano, porém, não é tão significativo, tendo em conta o histórico dos últimos 12 anos. “Não há evidências para sustentar a teoria do voto de protesto. A abstenção registra uma variação histórica nas eleições e flutua por diversas causas, mas não necessariamente representa um protesto. Acho que os resultados destas eleições estão muito próximos da média histórica. É um aumento modesto – do 27% ao 29%. Se tivesse dado um salto de um terço pelo menos, poderíamos procurar explicações sociológicas”, argumenta o cientista político Fernando Azevedo, da Universidade Federal de São Carlos.
“Realmente não são números significativos em relação a eleições anteriores e não acho que seja tão alto assim. Tem ficado dentro da nossa expectativa”, diz Cristiano Noronha, analista sênior da Arko Advice. Ele reconhece que em alguns Estados há uma variação maior, mas que depende muito das opções que o eleitor tem. “Pode ser que o eleitor não esteja satisfeito com nenhuma dessas alternativas, mas, no plano nacional, não foi um aumento considerável”, afirma.
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