O crescente poder do vice-chanceler Gabriel ameaça ofuscar Merkel
O vice-chanceler alemão Sigmar Gabriel encabeça a revisão da política europeia de austeridade
Enquanto a chanceler Angela Merkel se comprometia na sexta-feira com os demais líderes da União Europeia a aplicar com “flexibilidade” as normas fiscais que apertam o sul da Europa, Sigmar Gabriel observava de bom grado como avançava seu projeto. Com o sinal verde do Bundestag para a controvertida lei sobre energias renováveis, o número dois do Governo alemão e líder do Partido Social-Democrata (SPD) marcava um ponto e fechava com chave de ouro um período em que ocupou, por motivos muito distintos, o centro da cena política. A hiperatividade de Gabriel mostra sua crescente influência e deixa no ar uma pergunta que estes dias muitos se fazem em Berlim: será que esse poder cada vez mais patente é um perigo para a democrata-cristã Merkel?
As duas semanas de estrelato de Gabriel começaram no dia 16. Na ocasião, ele aproveitou uma visita à França para estender a mão aos países com mais problemas para sair da crise, pedindo que Bruxelas não levasse em conta certos gastos na hora de medir seu déficit. A chanceler reagiu com uma sonora negativa a trocar uma vírgula do Pacto de Estabilidade. A solução final acertada em Bruxelas dá razão aos dois – o acordo não será modificado, mas serão buscadas fórmulas para aplicar a famosa flexibilidade –; só que o anúncio de Gabriel na França lhe permitiu tomar a dianteira política em relação à chefe de Governo. Essa iniciativa se viu reforçada pelas fotografias de uma cúpula socialista na qual o ministro alemão se sentou em igualdade de condições ao lado de presidentes como François Hollande ou primeiros-ministros como Matteo Renzi. “Ninguém quer tocar no Pacto de Estabilidade, apenas redefini-lo de maneira criativa”, explicou Gabriel mais tarde, recordando que os alemães, quando tinham necessitado, também haviam desfrutado de uma atitude mais tolerante por parte de Bruxelas.
O dirigente do SPD ganha influência por sua defesa das energias renováveis
“É evidente que há uma luta no seio do Governo. É a primeira vez que Merkel não impõe sua agenda, algo que também ficou patente em sua evolução sobre a candidatura do Jean-Claude Juncker à Comissão Europeia. A novidade é que a chanceler sofre pressões por vários flancos: no externo, de líderes como Renzi, e no interno, do SPD”, resume a analista política Ulrike Guérot, diretora do Laboratório sobre Democracia Europeia.
É certo que o poder de Gabriel só tem crescido no meio ano que ele leva no comando do superministério de Economia e Energia. No entanto, ainda é cedo para saber se o SPD, que melhorou seus resultados nas eleições europeias em relação às alemãs de nove meses atrás, mas ficou a oito pontos dos democrata-cristãos, converteu-se em uma ameaça para a União Democrata-Cristã (CDU). Stefan Kornelius, jornalista do Süddeutsche Zeitung com bons contatos no círculo de Merkel após escrever sua biografia autorizada, acredita que a chanceler está medindo suas possibilidades. “Gabriel viu margem para atuar e mostrar sua independência em relação a Merkel em uma questão mais simbólica do que real. Mas se meteu em muitos assuntos de uma vez, e resta ver se vai se sair bem em todos. Questionar a austeridade pode fazê-lo ganhar muitos amigos na Grécia, mas não tantos na Alemanha. O grande beneficiado de tudo isto é Renzi, não Gabriel”, dispara.
Os assuntos que menciona Kornelius vão de uma briga com Bruxelas pela lei de energias renováveis – que o levou a acusar o comissário europeu para a Concorrência, Joaquín Almunia, de querer tomar a Alemanha refém – a uma reunião secreta com os líderes do partido esquerdista Die Linke para medir as possibilidades, no momento bastante reduzidas, de futuros acordos de coalizão. Um encontro sobre o qual, segundo a Spiegel Online, não havia informado a Merkel.
O homem que lidera os social-democratas há cinco anos e foi chefe de Governo do Estado da Baixa Saxônia e ministro do Meio Ambiente sabe quando deve lutar e quando é melhor render-se. Demonstrou isso na semana passada, quando aceitou que a CDU é que escolhesse o comissário alemão à custa de jogar um jarro de água fria na candidatura de Martin Schulz, que voltará a presidir o Parlamento Europeu. “Ficou evidente que para o líder do SPD é mais importante preservar a paz na grande coalizão, e por consequência seu poder dentro dela, do que satisfazer as ânsias de Schulz para entrar na Comissão”, comenta com ironia o deputado dos Verdes Manuel Sarrazin.
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