Hillary Clinton entra em campanha com suas memórias da Administração Obama
A ex-primeira-dama adia para 2015 a decisão sobre sua candidatura à presidência, mas está tudo encaminhado para quando ela der esse passo
Poucos lerão do começo ao fim as 600 páginas de Hard Choices (decisões difíceis), o novo livro do Hillary Clinton. O livro, memórias de seus anos como secretária de Estado de seu ex-rival Barack Obama, oferece poucas novidades. Como ocorre com a maioria de livros de políticos nos Estados Unidos, não foi escrito por ela. Nos agradecimentos, reconhece o trabalho de uma “equipe” que a ajudou a colocar as suas anotações em ordem.
O livro, que na terça-feira chegou às livrarias e já vendeu mais de um milhão de exemplares, é o de menos. A publicação de Hard Choices abre uma campanha que em 2017 pode transformar a ex-primeira-dama na primeira presidenta dos EUA.
As multidões que se congregaram na livraria Barnes & Nobre da Union Square, em Manhattan, para a sessão de autógrafos – o primeiro ato em uma excursão por shoppings, universidades e estúdios de televisão de todo o país – evocam cenas parecidas de oito anos atrás. Na época, quem provocava as filas era um jovem senador por Illinois, Barack Obama, autor de outro best-seller, A Audácia da Esperança. Aquilo foi uma antecipação da campanha para a eleição presidencial de 2008, que levaria Obama à Casa Branca. Era o início da obamamania.
Só em 2015, depois das eleições legislativas de novembro próximo, Hillary Clinton anunciará se será candidata, disse ela na noite de segunda-feira à veterana jornalista Diane Sawyer, na rede ABC. Mas a excursão para divulgar o livro é o sinal mais evidente de que dificilmente haverá recuo na candidatura. Ready for Hillary (preparados para Hillary), um grupo de arrecadação de fundos que conta em suas fileiras com alguns dos cérebros das campanhas de Obama, tem um ônibus que a seguirá pelas escalas de sua turnê. Outra organização, Correct the Record (corrija os registros), encarrega-se de replicar a todas as acusações, fundadas ou não, contra a candidata mais temida pela direita.
A viagem para divulgar o livro tem um ar pré-eleitoral: recorda a que impulsionou a ‘obamamania’ em 2006
Adrienne Elrod é uma antiga conhecida da família Clinton. Seu pai, um reputado advogado em Arkansas, o Estado de Bill Clinton, conhece o ex-presidente desde que ambos eram adolescentes, conforme contam os jornalistas Jonathan Allen e Amie Parnes em ‘HRC’, um dos livros recentes sobre sua etapa à frente do Departamento de Estado, entre 2009 e 2013. Elrod participou da equipe de campanha de Hillary Clinton em 2008, quando a candidata, que partia como favorita, perdeu nas primárias do Partido Democrata para o novato Obama. Agora, atua como diretora de comunicações do Correct the Record.
Perguntada sobre se já começou a corrida presidencial de Clinton, Elrod responde com um sucinto “não”. Ela escreveu um livro de memórias, acrescenta. Nada mais.
Nos anos noventa, Clinton denunciou a existência de uma “vasta conspiração” da direita extrema contra ela e seu marido. Nas primárias de 2008 a imagem dos Clinton como matrimônio propenso à manipulação e ao cinismo a prejudicou. Seus partidários querem assegurar-se de que isso não voltará a ocorrer.
A missão do Correct the Record: “Frear a desinformação negativa”. O objetivo é que, caso a ex-primeira-dama decida se candidatar, veja-se “na melhor posição e no melhor lugar”.
Elrod é uma peça em uma vasta constelação de colaboradores e simpatizantes de Hillary Clinton, um exército preparado para entrar em campanha quando a política democrata ordenar.
“O momento de outra decisão difícil chegará logo mais”, escreve Hillary Clinton ao final de ‘Hard Choices’
As primeiras escaramuças começaram. Na entrevista com Sawyer, Clinton disse, para justificar as centenas de milhares de dólares que ela e seu marido cobram por proferir conferências, que, ao abandonar a Casa Branca, os Clinton estavam “arruinados”. Em um país com desigualdades crescentes, as palavras da multimilionária Clinton reabriram a crítica sobre sua identificação com o establishment e desconexão com a classe média, que decide as eleições.
Hard Choices não é o livro de um ex-político, e sim um documento de campanha que busca lavar uma imagem danificada pelos escândalos nos anos de primeira-dama e a derrota de 2008, humanizá-la – sua iminente condição de avó merece uma menção – e afiançar seus créditos como estadista.
Clinton se distancia de Obama, mas apenas o necessário. Em política externa, se mostra mais agressiva, mais convencida da necessidade de uma liderança forte dos EUA. Explica, por exemplo, que na Síria ela defendeu armar os rebeldes, contrariando o critério da Casa Branca. E acredita que os EUA deveriam ter sido mais cuidadosos na hora de permitir a queda do líder egípcio Hosni Mubarak, depois dos protestos de 2011 na praça Tahrir, e que o presidente foi muito severo com Binyamin Netanyahu.
Ao mesmo tempo, dedica elogios inflamados a Obama. Diz que sua decisão de ordenar a operação que acabou com Osama bin Laden foi uma das exibições de liderança “mais vigorosas e valentes” que ele já havia presenciado. Não está mal, vindo de uma mulher que conviveu com outro comandante-em-chefe durante oito anos na Casa Branca e que, durante as primárias de 2008, questionou a experiência internacional do seu rival e a sua capacidade de decisão em momentos críticos.
Clinton também admite que votar a favor da guerra do Iraque em 2002, quando era senadora, foi um engano e que deveria ter deixado claro seu arrependimento antes. Mas rechaça qualquer culpa pela morte do embaixador norte-americano na Líbia durante o atentado de 2012 em Bengazi, um episódio em que os republicanos veem um ponto frágil da ex-secretária de Estado.
Uma pesquisa do The Washington Post/ABC News dá a Clinton mais de 50 pontos de vantagem frente a outros possíveis candidatos nas primárias democratas, e um mínimo de dez pontos sobre os candidatos republicanos na eleição presidencial geral.
“Serei candidata a presidenta em 2016?”, pergunta-se ela, nas páginas finais do livro. “O momento de outra decisão difícil chegará logo mais”, conclui.
Tu suscripción se está usando en otro dispositivo
¿Quieres añadir otro usuario a tu suscripción?
Si continúas leyendo en este dispositivo, no se podrá leer en el otro.
FlechaTu suscripción se está usando en otro dispositivo y solo puedes acceder a EL PAÍS desde un dispositivo a la vez.
Si quieres compartir tu cuenta, cambia tu suscripción a la modalidad Premium, así podrás añadir otro usuario. Cada uno accederá con su propia cuenta de email, lo que os permitirá personalizar vuestra experiencia en EL PAÍS.
En el caso de no saber quién está usando tu cuenta, te recomendamos cambiar tu contraseña aquí.
Si decides continuar compartiendo tu cuenta, este mensaje se mostrará en tu dispositivo y en el de la otra persona que está usando tu cuenta de forma indefinida, afectando a tu experiencia de lectura. Puedes consultar aquí los términos y condiciones de la suscripción digital.