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O fluxo migratório na União Europeia chega ao limite

Bruxelas registra 42.000 chegadas ilegais desde janeiro O conflito sírio e o descontrole na Líbia triplicam as tentativas de entrada na UE

Centenas de imigrantes sem papéis na Líbia.
Centenas de imigrantes sem papéis na Líbia.SABRI ELMHEDWI (EFE)

África e Oriente Médio batem nas portas da Europa em busca de um futuro melhor. A pressão migratória sobre as fronteiras do bloco aumentou consideravelmente desde o início do ano, com cifras três vezes maiores do que no mesmo período de 2013. O número de pessoas em situação irregular nas fronteiras subiu para 42.000 entre janeiro e abril deste ano, segundo dados da Frontex, a agência europeia de controle de fronteiras. Dessa forma, os fluxos se aproximam do nível recorde registrado em 2011, com as revoltas da primavera árabe. Naquele ano, mais de 140.000 pessoas entraram na comunidade europeia.

A União Europeia investe tempo e dinheiro para reforçar suas portas de entrada, mas as turbulências do exterior tornam praticamente insignificantes as tentativas de conter o êxodo. Assim demonstram os dados sobre a origem desses imigrantes. Cerca de 25.000, mais da metade dos detidos, partiram da Líbia, um autêntico coador devido à ausência de um Estado que controle as saídas.

Os números apresentados na última terça-feira a um grupo de jornalistas em Bruxelas são preliminares e pouco abrangentes, mas permitem constatar a força com que os fluxos migratórios têm crescido nos últimos meses. Os números da Frontex incluem todas as entradas por fronteiras marítimas e terrestres detectadas pelas forças de segurança dos países da UE, que divulgam a informação.

Fuente: Frontex
Fuente: FrontexEL PAÍS

Apenas alguns dias depois da última tragédia de Lampedusa, com pelo menos 17 mortes e mais de 200 pessoas resgatadas nas portas da Europa, os dados preliminares da Frontex atribuem à Itália a pior parte do panorama. A chamada rota do Mediterrâneo Central —barcos que partem principalmente da Líbia com estrangeiros vindos do Nordeste Africano— concentrava mais da metade dos imigrantes em situação irregular até abril, afirmou a agência europeia.

O impacto é bem mais leve na rota que afeta diretamente a Espanha, a do Mediterrâneo Ocidental. Pouco mais de 2.200 de pessoas tentaram entrar por Ceuta e Melilla, número que representa o triplo do mesmo período do ano passado, mas ainda é pouco significativo no quadro global. Apesar de tudo, o dado mostra um significante aumento em relação a 2013, quando as entradas por esta via cresciam a uma taxa de 7%.

Além de fatores externos, alguns especialistas destacam a intervenção europeia como um fator que determina os fluxos

A procedência daqueles que tentam cruzar o outro lado do mundo reflete com nitidez a origem dos problemas. A Síria se tornou a maior emissora de imigrantes em situação irregular no relatório —a Frontex não detalha a informação, no aguardo dos dados finais—, seguida de outros Estados subsaarianos. Ao mesmo tempo, o Afeganistão, durante muitos anos principal foco de emigração, retrocedeu.

Além de fatores externos, alguns especialistas destacam a intervenção europeia como um fator que determina os fluxos. Depois do naufrágio de Lampedusa que sacudiu a Europa no ano passado, a Itália decidiu estabelecer uma missão naval de vigilância de fronteiras e resgate de imigrantes. “É um debate difícil. É uma obrigação humana salvá-los mas, a curto prazo, essa missão funciona como um fator que estimula as saídas. Se os imigrantes sabem que vão ser salvos, podem correr o risco”, argumenta Elizabeth Collett, diretora para a Europa da organização Migration Policy Institute.

Um total de 63% de pessoas deslocadas em 2013 de seu país por motivos de violência, intimidação às minorias, aos menores e às mulheres e conflitos veio de diversos pontos da Síria, Colômbia, Nigéria, República Democrática do Congo e Sudão

Por mais trágico que seja o resultado, a fome, o medo, a guerra e outras dificuldades empurram muitos a se arriscar. Depois que são localizados no mar, as autoridades devem trazer os imigrantes para solo europeu, onde têm a possibilidade de pedir asilo e esperar —em centros especiais de detenção— até que seus pedidos sejam avaliados. Se não solicitam asilo ou não cumprem os requisitos são deportados, mas o processo é complexo, especialmente se não existe acordo de retorno com o país de origem. A maioria, além disso, se recusa a informar sua procedência, especialmente na Espanha. A metade daqueles que se dirige à fronteira espanhola tem nacionalidade desconhecida.

Para evitar tentativas perigosas para cruzar as fronteiras, a especialista propõe reforçar os chamados reassentamentos, que permitem àqueles que necessitam fugir de seu país organizar a viagem legalmente, com a ajuda da agência da ONU para os refugiados (ACNUR). Mas essa fórmula é pouco utilizada na UE. “É uma decisão muito política. Alguns dirigentes têm medo do debate público. E, além disso, não sabem onde termina o assentamento”, afirma Collett.

Durante 2013, 8,2 milhões de pessoas tiveram que deixar suas casas, 1,6 milhão a mais do que em 2012, com uma fuga concentrada em 43% na Síria

O mapa elaborado pelo Observatório de Deslocamento Interno (IDMC) da Noruega, apresentado também na terça-feira em Genebra com o respaldo da ACNUR, mostra uma alarmante faixa vermelha muito bem delimitada no centro da África. O IDMC monitora estes movimentos forçados no mundo todo com dados proporcionados pelos Governos, pelas ONGs e pelas agências da ONU. Em 1998, foram registrados 19,3 milhões de deslocamentos. Desde então, a tendência tem sido sempre de alta. Em dezembro de 2013 chegaram a ser contabilizados 33,3 milhões, um crescimento de 4,5% em relação ao ano anterior.

Um total de 63% de pessoas deslocadas de seus países em 2013 por motivos de violência, intimidação às minorias, aos menores e às mulheres, e conflitos veio de diversos pontos da Síria, Colômbia, Nigéria, República Democrática do Congo e Sudão. Neste ano, pela primeira vez são incluídos dados da Nigéria, totalizando 3,3 milhões de cidadãos obrigados a abandonarem sua terra natal. Nesse caso destaca-se a positiva colaboração do governo nigeriano ao facilitar o trabalho, ao contrário do que ocorre na Síria, onde as autoridades boicotam a ajuda humanitária internacional e estrangeiros são sequestrados.

Tanto Jan Egeland, secretário-geral do órgão norueguês, quanto António Guterres, alto comissionado da ACNUR, destacaram a preocupação com os números e com a tendência de alta, para alertar que alguma coisa está muito errada na hora de se enfrentar este problema, onde é necessária uma solução solidária.

Durante 2013, 8,2 milhões de pessoas tiveram que sair de suas casas, 1,6 milhão a mais do que em 2012, com uma fuga concentrada em 43% na Síria. Apenas 2% (cerca de 108.000 pessoas) moram em campos de refugiados nas fronteiras com a Turquia. O relatório classifica a crise na Síria, em guerra civil desde 2011, “como a maior e a que mais rapidamente avança no mundo”.

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