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O Brasil volta a ser um paraíso para os investidores, mas pelos motivos errados

Inflação alta, rebaixamento da nota pela agência S&P e a incerteza em torno das eleições presidenciais de outubro ajudam o país a bater recorde de investimento estrangeiro em renda fixa

A bolsa de valores de São Paulo.
A bolsa de valores de São Paulo.EFE

Contrariando as apostas de uma avassaladora fuga de capitais ao longo deste ano, o Brasil entrou de vez no radar dos investidores internacionais. Mas pelos motivos errados. Em vez de atrair recursos menos voláteis por conta de uma melhor percepção do mercado quanto ao desempenho da economia, o país tem sido escolhido pela estratégia de defesa adotada para lidar com a inflação. Para baixar a febre desse dragão, a taxa de juro se mantém alta, em 11%, e a perspectiva é de que ela possa subir mais, uma vez que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) teima em encostar no teto da meta de 6,5%. O resultado dessa dinâmica no mercado financeiro é o resgate da velha fórmula de carry trade: os estrangeiros captam recursos baratos no exterior e aplicam em papéis atrelados a juro no Brasil, que oferece um retorno quase três vezes maior do que em aplicações em outros países.

Há um ditado no mundo dos negócios que se aplica ao panorama atual, explica um analista: uma má notícia pode ser uma boa notícia para quem está atento aos movimentos financeiros. Assim, a expectativa no fim do ano passado era de que o Brasil enfrentaria uma grande fuga de capitais estrangeiros em 2014, sobretudo por conta da recuperação dos Estados Unidos, que viria a despontar como alternativa aos emergentes. A cada anúncio da retirada de estímulos do Federal Reserve na economia norte-americana, a bolsa brasileira caía e o dólar subia.

Some-se a isso, ainda, outro emaranhado de más notícias, como a desaceleração chinesa, principal mercado das exportações brasileiras, e a persistente alta inflacionária, além de uma política fiscal deteriorada, que culminou com a revisão da nota de risco pela agência Standard & Poor’s. O cenário para uma “tempestade perfeita” do Brasil nas praças financeiras estava pronto.

Só no primeiro trimestre, o investimento estrangeiro em renda fixa chegou a 11,6 bilhões de dólares, o maior já registrado para o período

De lá para cá, porém, a reação tem sido distinta. Só no primeiro trimestre, o investimento estrangeiro em renda fixa no Brasil chegou a 11,6 bilhões de dólares, o maior valor já registrado para o período. Ao mesmo tempo, a bolsa brasileira entrou no foco. Desde a segunda semana de abril teve início um movimento de valorização do Índice Bovespa, mesmo com previsões negativas do Fundo Monetário Internacional (FMI) em relação ao desempenho da economia do país. De lá para cá, o principal índice da Bolsa brasileira vem oscilando em torno dos 53 mil pontos -nesta sexta-feira, por exemplo, fechou em 52.980 pontos, o maior nível de encerramento desde novembro do ano passado.

Os recursos que estão invadindo o país, no entanto, são voláteis, podendo ser retirados a qualquer momento, embora ajudem a conter momentaneamente o déficit brasileiro nas contas externas -de janeiro a março deste ano, por exemplo, o Banco Central informou o registro de um rombo de 25,19 bilhões de dólares nas operações do país com o exterior, o maior em um período de três meses desde 1970, quando teve início a série histórica do BC.

Claudio Frischtak, presidente da Inter.B Consultoria, avalia que o ciclo de aumento da taxa de juros leva os fundos a voltar a comparar as alternativas globais existentes, o que torna o Brasil mais atraente. “Para quem pretende comprar, por exemplo, títulos do Tesouro, que acompanham a Selic, os potenciais de ganhos se ampliam”, afirma. Ele também ressalta que as perspectivas globais estão embaralhadas neste momento, o que favorece papéis brasileiros.

O problema atual do Brasil não é econômico, mas sim político André Perfeito

“Há uma série de reposicionamentos: as tensões atuais na Europa, com o conflito na Ucrânia, enfraquecem a posição da Rússia como centro atrativo de capitais. O bloco europeu também tenta sair de seu quadro de deflação, ao injetar mais dinheiro nos mercados. Os Estados Unidos voltam a crescer. Já a China se prepara realizar reformas. Por fim, a Índia realizou sua eleição agora, cuja política precisa de mais tempo para ser definida e no Brasil o cenário eleitoral ainda está em aberto”, acrescenta.

Já Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimentos, explica que os investidores estrangeiros estão colocando os emergentes em sacos separados. “As taxas de crescimento econômico dos emergentes estão em níveis muito distintos. Além disso, começou a ser percebida uma renovação da agenda política, com o diagnóstico de que o atual Governo brasileiro conduziu de modo desacertado as empresas mistas e que isso pode, eventualmente, mudar caso o resultado das eleições seja desfavorável ao PT”, diz.

A opinião é compartilhada por outros especialistas. “O problema atual do Brasil não é econômico, mas sim político”, reforça André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos, que prevê uma taxa de juros de 11,25% até o final do ano, com a inflação oficial acima do teto da meta, em 6,54%.

Perfeito, entretanto, lembra que há muita água para rolar ainda debaixo da ponte até as eleições presidenciais e não se sabe ao certo qual será o efeito da Copa do Mundo na cabeça do eleitor. “Se o Brasil for campeão do mundial de futebol a situação pode até ser mais tranquila para a presidenta. No entanto, se perder há uma chance não desprezível de a maioria da população transformar a frustração em ressentimento e canalizá-lo em cima da presidente Dilma”, completa.

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