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A 'mãe coragem' da Argentina consegue uma grande vitória judicial

Os dez acusados pelo sequestro e prostituição da sua filha, Marita Verón, foram condenados a penas entre 10 e 22 anos

Francisco Peregil
Susana Trimarco em Madri, em 2010.
Susana Trimarco em Madri, em 2010.CRISTÓBAL MANUEL

Susana Trimarco, a mãe coragem argentina, a heroína que chegou a se disfarçar de prostituta para procurar a filha nos prostíbulos mais escuros do país, o símbolo da luta contra o tráfico de mulheres, a mãe de María de los Ángeles, Marita Verón -vista por última vez há 12 anos na província argentina de Tucumán- pôde hoje respirar mais tranquila. Sua filha continua desaparecida. Mas um tribunal de Tucumán formado por três juízes condenou os 10 acusados a penas entre 10 e 22 anos por sequestrar e promover a prostituição de Marita Verón.

“A justiça foi feita”, declarou Susana Trimarco enquanto ouvia a sentença. “Esperava bem mais, mas estou satisfeita. Eu não quero dizer com isto que não vou continuar lutando. Vamos seguir até o dia que saibamos o que fizeram com Marita (…) Há um antes e um depois desta sentença. (…) Após 12 anos de luta, algo conseguimos”.

Em dezembro de 2002, depois de um julgamento de dez meses pelo qual desfilaram mais de 100 testemunhas, a Sala II da Câmara Penal de Tucumán ditava por unanimidade a absolvição dos 13 acusados que havia na época. Enquanto eles choravam e se abraçavam, as testemunhas insultaram os juízes e um advogado de Trimarco declarou: “Isto é um ato de corrupção”.

Trimarco, sem derramar uma lágrima declarou naquele dia: “Estou mais forte que nunca. Sou uma pessoa muito forte porque eles me fizeram assim. Mica [a neta Micaela, que agora tem 15 anos, filha de Marita Verón] se criou dormindo nas janelas dos tribunais. Não vou parar até que estes tipos sejam julgados. Estou muito tranquila por todo o que fiz e todas as garotas às que resgatei. Isto termina aqui mas amanhã começa um luta nova”.

Em dezembro passado, a Corte Suprema de Tucumán revogou parcialmente a sentença, confirmou a absolvição de dois acusados e arquivou o processo de outro, que estava morto. Restavam 10 para serem julgados. E na terça-feira os juízes Emilio Páez de la Torre, Dante Ibáñez e Juana Juárez ditaram sentença. Depois de escutá-la, Susana Trimarco declarou: “Não encontrei Marita, mas aqui se fez justiça por tantas outras garotas às quais estas pessoas fizeram muitíssimo mal e ainda hoje vivem com medo”. Trimarco acrescentou que com essa sentença acaba uma etapa mas se inicia outra: a da busca de sua filha. Para isso, Trimarco espera que os condenados “abram seu coração” e lhe digam onde está sua filha. “Não pode ser que uma pessoa se aproprie assim de outra e a faça desaparecer. Todos os que estavam sentados no banco sabem”.

Trimarco dirigiu palavras de agradecimento à presidenta, Cristina Fernández de Kirchner, quem público e privadamente lhe expressou várias vezes seu apoio. “Cristina me disse que não temos que ficar quietos, que temos que continuar lutando e dar uma resposta para Mica -sua neta. Cristina me disse que vai estar do meu lado como mãe, não como presidenta. De mãe para mãe é uma mulher excelente e sinto que está comigo”.

Em 2007 o Governo dos Estados Unidos deu a Trimarco o Prêmio Internacional às Mães com Coragem. Nesse ano criou a fundação María de los Ángeles destinada ao resgate de prostitutas. Três anos depois, em 2010, seu esposo Daniel Verón morreu. Ele caiu em uma depressão depois do desaparecimento de Marita. E tinha advertido à Susana muitas vezes que não mexesse com as máfias dos prostíbulos. Mas ela continuou sua luta. Uma novela chegou a ser feita baseada em suas vivências.

Há dois anos, durante uma entrevista concedida a este jornal, Trimarco mencionou os acusados do sequestro de sua filha: “Conheço muito bem estes mafiosos. Para mim, tê-los aí [no banco dos réus]  já é uma grande vitória. Porque me diziam que com o mesmo dinheiro que ganhavam com a minha filha iam pagar os juízes”.

Finalmente, nove dos dez acusados serão presos e uma mulher cumprirá prisão domiciliar por 15 dias. As penas maiores, de 22 anos, foram dadas aos irmãos José, Chenga, Gómez e Gonzalo Gómez, supostos culpados pelo desaparecimento.

Marita Verón tinha 23 anos quando desapareceu. Sua filha Micaela tinha apenas três anos. “Mica tem o mesmo caráter alegre de minha filha”, assinalou a este jornal Susana Trimarco. “Porque desde bem garota Marita foi muito alegre, gostava de andar de patins, pintar, desenhar, cantava muito bem. Era também muito solidária. Tinha uma ótima comunicação com as crianças. Relacionava-se rápido com outras pessoas. Desenhava muito bem, fazia estudos de Belas Artes, fazia esculturas, reciclava os móveis, também fez cursos de decoração, de doces... Tinha uma loja de alimentos que montamos eu e meu marido”.

Agora o objetivo de Trimarco é encontrar a sua filha.

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