_
_
_
_
CONFERÊNCIA DE GENEBRA II

O Governo da Síria e a oposição iniciam o diálogo com duras acusações

O enviado de Bashar al-Assad acusa várias pessoas presentes à reunião de promover o terrorismo. John Kerry lembra que o protesto popular começou de forma pacífica e o regime reprimiu

Demoraram quase três anos em iniciar um diálogo, deixando no caminho 130.000 mortos e nove milhões de deslocados. Quando nesta quarta-feira, por fim, se viram frente a frente, o regime e os opositores da Síria só trocaram duras acusações,  atribuindo por separado a representação legítima da cidadania de seu país. Os prenúncios da conferência de paz de Genebra II, que começou nesta quarta-feira na localidade suíça de Montreux, não são bons. Mas conforme reconheceu a maioria dos representantes da comunidade internacional, convidados a participar pelas Nações Unidas, é a única opção que existe de pôr um fim negociado, que pare de somar mais morte e destruição a um conflito, cujo fim não se vislumbra próximo.

“Não há outra alternativa senão acabar com a violência com uma solução política. Por isso estamos aqui”, disse o secretário geral de Nações Unidas, Ban Ki Moon, quem qualificou a jornada como um dia de “esperança frágil”. Tão frágil, que ficou arranhada na primeira intervenção da delegação Síria. Em uma longa apresentação, o ministro de Exterior, Wallid ao Muallem, acusou os opositores, com os que se supõe que deve dialogar, de “traidores” e “agentes assalariados do inimigo” e aos países que participaram da Conferência, como a Arábia Saudita e Turquia, de “promover o terrorismo”. Quando Ban tentou interrompê-lo, pois excedia os sete minutos permitidos, ele lhe respondeu: “Você vive em Nova York, eu na Síria! Este é meu direito”.

A oposição estava representada por Ahmad Jarba, líder da Coalizão Nacional Síria, enfraquecida por deserções e o aumento das milícias jihadistas no bando rebelde. Ele recusou frontalmente a ideia de que o presidente Bachar el Asad participe de um período de transição, apesar de que este revelou recentemente que avalia apresentar-se à reeleição neste ano. “Quero saber se de verdade temos com quem negociar nesta sala. Temos?”, disse Jarba, sem obter resposta. Posteriormente pediu à comunidade internacional que pesquise as torturas que um recente relatório jurídico atribui ao governo de El Assad, algo que foi apoiado pelos EUA.

Na quinta-feira, as delegações sírias vão se reunir separadamente com Lakdar Brahimi, o enviado especial da ONU à Síria. Na sexta-feira retomarão o diálogo, de forma direta, em Genebra. As conversas devem demorar o que o regime e a oposição queiram. A equipe de El Assad chegou à Suíça acompanhado de um séquito de jornalistas que aplaudia as intervenções de seus delegados e doutrinava jornalistas árabes que considerava partidários da revolta. Quando intervinha o líder opositor Jarba, a televisão pública síria emitia imagens de ataques com vítimas sob o rótulo “crimes terroristas”. E enquanto a cúpula se tornava um cruzamento de amargos monólogos no cenário de uma pitoresca localidade turística nos Alpes em frente ao lago de Genebra, na Síria a destruição da guerra avançava imbatível, com o regime atacando de novo a província de Hama com mortíferos barris explosivos.

A principal novidade da cúpula, além do início do diálogo, foi o regresso do regime de El Assad aos foros internacionais. Durante quase três anos, boa parte da comunidade internacional deu sua queda por segura e lhe exigiu que se resignasse a entregar o poder. Nesta quarta-feira, porém. os líderes mundiais escutaram seus argumentos, escuras histórias de conspirações terroristas que são comuns em Damasco, mas não em cúpulas promovidas pela ONU. É comum entre os altos servidores públicos sírios, como fizeram ontem, pôr em dúvida a existência mesma de ataques com armas químicas, que a comunidade internacional dá por provados.

O secretário de Estado norte-americano, John Kerry, viu-se obrigado a destacar que sua posição é, ainda, que El Assad renuncie. “Um homem e os seus seguidores não podem continuar tendo como refém a toda uma nação”, disse. “O direito a liderar um país não lhe concede a tortura”.

Ao final da sessão inaugural, os diplomatas norte-americanos disseram que o isolamento do regime do El Assad durante o encontro ficou evidente. “Todos os participantes assumiram os princípios de Genebra I com uma onerosa exceção”, disse Kerry em coletiva de imprensa. Naquela cúpula organizada pela ONU e celebrada em junho de 2012, decidiu-se que a solução ao conflito sírio devia ser um período de transição política, algo que não assumiu o regime abertamente, apesar de sua participação agora em Genebra II.

Rússia foi a única voz de apoio ao regime de El Assad, mas com mesura. O ministro de Exteriores Sergéi Lavrov defendeu a necessidade de uma solução dialogada  para o conflito sírio, mas pediu às partes implicadas que “se abstenham de qualquer tentativa de predeterminar o resultado deste processo”. Também criticou que Irã, outro fiel aliado da Síria, não esteja presente no fórum. O Secretário Geral da ONU convidou o governo iraniano no domingo, embora tenha voltado atrás menos de 24 horas depois pela negativa de Teerã a aceitar os princípios de Genebra I e pelas pressões dos EUA. Por sua vez, Kerry, o chefe da diplomacia norte-americana, disse que se quisesse, “o Irã ainda pode ser de ajuda e marcar uma diferença” neste processo de diálogo.

O único avanço, por enquanto, desta cúpula é ter as partes dialogando, que é algo que nem sequer se dava por seguro apenas alguns dias atrás. E, segundo apontou o ministro francês de Relações Exteriores, Laurent Fabius, em sua intervenção, não há muitas mais opções. “Se falharmos, então chegará a verdadeira crise”.

Tu suscripción se está usando en otro dispositivo

¿Quieres añadir otro usuario a tu suscripción?

Si continúas leyendo en este dispositivo, no se podrá leer en el otro.

¿Por qué estás viendo esto?

Flecha

Tu suscripción se está usando en otro dispositivo y solo puedes acceder a EL PAÍS desde un dispositivo a la vez.

Si quieres compartir tu cuenta, cambia tu suscripción a la modalidad Premium, así podrás añadir otro usuario. Cada uno accederá con su propia cuenta de email, lo que os permitirá personalizar vuestra experiencia en EL PAÍS.

En el caso de no saber quién está usando tu cuenta, te recomendamos cambiar tu contraseña aquí.

Si decides continuar compartiendo tu cuenta, este mensaje se mostrará en tu dispositivo y en el de la otra persona que está usando tu cuenta de forma indefinida, afectando a tu experiencia de lectura. Puedes consultar aquí los términos y condiciones de la suscripción digital.

Arquivado Em

Recomendaciones EL PAÍS
Recomendaciones EL PAÍS
_
_