Maduro ordena mobilização militar frente à escalada da crise na Venezuela
Presidente apela a um estado de exceção por tempo indeterminado e cita crise no Brasil Oposição qualifica a medida de “autogolpe” ao Estado venezuelano
Nicolás Maduro, presidente da Venezuela, dirigiu toda a sua artilharia para sufocar a oposição. O chefe de Estado declarou na sexta-feira um estado de exceção e emergência econômica que suspende garantias constitucionais diante da possibilidade de um “golpe” contra seu Governo. “Decidi aprovar um novo decreto que me dê poder suficiente para derrocar o golpe de Estado, a guerra econômica, para estabilizar socialmente o nosso país e para enfrentar todas as ameaças internacionais e nacionais que existem contra a nossa pátria neste momento”, disse.
Neste sábado, Maduro anunciou igualmente sua decisão de iniciar exercícios militares da Força Armada Venezuelana (FANB) para se preparar para “qualquer cenário”, depois de informar sobre supostos planos de intervenção previstos no exterior.
“No sábado eu convoquei exercícios militares nacionais da Força Armada, do povo, e das milícias, para nos prepararmos contra qualquer cenário, porque esta terra é sagrada e devemos fazer com que seja respeitada”, disse o chefe de Estado num comício com milhares de simpatizantes em uma rua no centro de Caracas.
Além disso, o presidente venezuelano pediu ao poder judiciário e ao Ministério das Relações Exteriores que iniciem os procedimentos para abrir um julgamento internacional contra o ex-presidente colombiano Álvaro Uribe por instar governos estrangeiros a colaborar com uma intervenção militar no país: “Um julgamento internacional deveria ser feito a Uribe Vélez por ameaçar com o uso da força a nossa pátria, a pátria de Bolívar”.
“Estão ativando medidas desde Washington, pedidas e promovidas por representantes da direita fascista venezuelana, encorajados pelo golpe de Estado no Brasil”, disse Maduro
O alcance do estado de exceção é incerto neste momento. Maduro não detalhou como aplicará esse novo “estado de exceção” que, de acordo com a oposição, poderia restringir os importantes protestos de rua contra seu Governo. Jesús “Chuo” Torrealba, secretário-geral da coalizão Mesa da Unidade Democrática (MUD), qualificou a medida de “autogolpe” ao Estado venezuelano. “Isso é tecnicamente um ‘autogolpe’ porque ignorou o Parlamento. Para que esse decreto tenha validade legal, deveria ter sido discutido antes pela Assembleia Nacional da Venezuela e isso não foi feito”, comentou na sexta-feira durante uma concentração da oposição realizada em Caracas para pedir ao Conselho Nacional Eleitoral (CNE) –controlado pelo chavismo– que agilize os trâmites para convocar neste ano um referendo revogatório contra o mandato do sucessor de Hugo Chávez.
O decreto é uma carta em branco ao Governo. Além de suspender alguns dos direitos estabelecidos na Constituição da Venezuela, a medida concede a Maduro o poder de agir contra quem considerar inimigos da economia ou da soberania do país.
O ardil do golpe
A crise econômica resultou numa tensão máxima no país. Nos últimos dois meses houve fortes protestos de rua e saques em diferentes regiões da Venezuela, sufocados apenas pela intervenção policial. A alta inflação (180,9% em 2015), a escassez de alimentos e medicamentos, os cortes de energia e o racionamento de água e os obstáculos para a saída do Governo Maduro colocaram a população à beira da hostilidade.
Mas o chavismo não cede aos reclamos. Vladimir Padrino López, ministro da Defesa, expressou seu apoio incondicional ao presidente venezuelano: “A FANB (Força Armada Nacional Bolivariana) se une a todo o poder nacional contra a ingerência, o golpe de Estado e a guerra econômica”.
Maduro acusa o ex-presidente colombiano Álvaro Uribe de ser o líder de um plano que supostamente pretende erradicar os governos de esquerda na América do Sul
O decreto de emergência econômica, que originalmente durou 60 dias, foi aplicado pela primeira vez em meados de janeiro pelo Governo. Atingido pela perda do Congresso, Maduro aprovou essa medida para supostamente enfrentar com plena liberdade de critérios a derrocada financeira do país.
Mas a Assembleia Nacional –dominada pela MUD– rejeitou as intenções presidenciais considerando que a crise poderia ser resolvida sem a necessidade de conceder poderes especiais ao Executivo que, supostamente, só acentuariam a intervenção do Estado no setor empresarial.
Maduro venceu em seu propósito naquela ocasião. O Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) –controlado pelo Governo– anulou por meio de uma sentença a decisão dos parlamentares. Foi apenas uma das jogadas do Supremo contra o Parlamento, porque desde que a oposição conquistou a maioria na Assembleia Nacional –nas eleições de 6 de dezembro– desencadeou-se um confronto entre os poderes públicos no país.
Agora, o estado de exceção e emergência econômica não tem data de validade. Maduro adiantou que a medida pode se prolongar até o próximo ano: “Isso nos permite, durante os meses de maio, junho, julho e toda a extensão que faremos constitucionalmente durante 2016 e, provavelmente, até 2017, recuperar a capacidade produtiva do país”.
Para a oposição esse decreto é apenas mais uma artimanha com a qual o impopular presidente venezuelano tenta pressionar. Nada impediu a estrepitosa queda da economia da nação rica em petróleo. Pelo contrário, as previsões são desalentadoras. O Fundo Monetário Internacional já vaticinou um aumento de 700% da inflação para este ano no país.
A crise econômica não é a única fraqueza do governo de Maduro. Luis Almagro, secretário-geral dessa organização internacional, disse que cogita convocar um conselho de emergência para avaliar a situação da Venezuela: “Trabalho em um relatório sobre direitos humanos, poder judiciário, presos políticos, escassez de alimentos e de medicamentos, equilíbrio de poderes, equilíbrio de poderes e corrupção”, disse na sexta-feira em sua conta no Twitter.
Venezuela, em estado de alerta
O recente colapso dos governos que apoiavam o chavismo na América Latina colocou o Governo da Venezuela em estado de alerta. Depois da derrota dos aliados de esquerda na Argentina e no Brasil, o Governo venezuelano denunciou com frequência que está sendo forjado nos EUA um suposto plano de golpe contra Maduro.
De acordo com o sucessor de Chávez, o ex-presidente colombiano Álvaro Uribe Vélez é o líder desse plano que supostamente pretende erradicar os governos de esquerda do continente. “A Venezuela está sendo ameaçada internacionalmente neste momento (...). Hoje (sexta-feira), em Washington, houve uma reunião de conspiração contra a Venezuela”, disse.
O presidente mais uma vez acusou a oposição venezuelana de envolvimento no suposto plano: “Estão ativando medidas desde Washington, pedidas e promovidas por representantes da direita fascista venezuelana, encorajados pelo golpe de Estado no Brasil”.
A LUTA CONTRA O RELÓGIO PARA O REFERENDO
A oposição ao chavismo concentrou-se na sexta-feira em Caracas, a poucos metros de uma mobilização pró-governo, para exigir que o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) –dominado pelo chavismo– conclua verificação das assinaturas coletadas para iniciar uma consulta popular de destituição do presidente Nicolás Maduro.
Esta é a segunda manifestação realizada nesta semana para exigir celeridade ao Conselho Nacional. Mas o órgão eleitoral continua sem dar respostas à coalizão Mesa da Unidade Democrática (MUD). Portanto, Henrique Capriles, governador do estado de Miranda e ex-candidato presidencial, convocou uma nova mobilização nacional para a próxima quarta-feira até a sede do Conselho Eleitoral.
A oposição luta contra o relógio. Se conseguir realizar o referendo antes de 10 de janeiro e Maduro perder, novas eleições presidenciais seriam convocadas. Mas se o referendo revogatório for realizado depois de janeiro, o vice-presidente assumiria o poder até 2019.
O processo revogatório é longo e tem várias etapas. A MUD conseguiu recolher quase dois milhões de assinaturas, que consignou no dia 3 de maio junto ao CNE.
Esse organismo, no entanto, levou mais de um mês para entregar à oposição o formato dos formulários necessários para recolher as primeiras assinaturas de 1% do padrão eleitoral. Só concordou com o pedido da MUD depois de uma ameaça de mobilização nacional em protesto contra a demora.
O próximo passo é que o CNE valide essas assinaturas e em seguida entregue novos formulários que devem ser assinados por 20% dos eleitores (quase quatro milhões) em três dias consecutivos. Num eventual referendo, os adversários de Maduro deverão obter um voto a mais do que os obtidos pelo presidente nas eleições de 14 de abril de 2013. Esse processo pode demorar mais de sete meses.
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