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Juiz norte-americano confirma proteção legal a Michael Townley

Ex-agente da ditadura chilena é acusado do matar o ex-diplomata espanhol Carmelo Soria

Michael Townley.
Michael Townley.

“Não podemos obrigar Michael Townley a pagar”, disse o juiz norte-americano John Bates neste mês. Nem mesmo 75 dólares (240 reais) por semana. A família do ex-diplomata espanhol Carmelo Soria tentou em vão que o ex-agente da Diretoria Nacional de Inteligência do Chile (DINA) – testemunha sob proteção nos Estados Unidos – pague sete milhões de dólares como indenização pela tortura e morte de Soria, enquanto no Chile e na Espanha os tribunais ainda discutem o caso.

Em sentença de 13 páginas a que o EL PAÍS teve acesso, o juiz distrital John Bates reconheceu que seu veredicto “não ajuda nada” Laura González-Vera, viúva de Soria, apesar de a Justiça ter anteriormente determinado que Townley pagasse o dinheiro.

Townley, de nacionalidade norte-americana, foi agente da DINA, a polícia secreta do ditador Augusto Pinochet, e participou do sequestro e assassinato do diplomata espanhol em 1976. Há mais de 30 anos vive nos EUA sob o programa de proteção a testemunhas do Governo federal. Antes passou cinco anos preso pelo assassinato do embaixador chileno nos EUA, Orlando Letelier.

O fato de estar no programa de proteção a testemunhas impede informar seu paradeiro, situação financeira, atividades etc. Isso limita a capacidade, por parte dos advogados, de forçar o pagamento. Embora a família tenha pedido ao Governo dos EUA que entregue dados do ex-agente, até agora o Gabinete do Promotor Geral insiste em que fazer isso põe em risco a vida da testemunha.

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Em 2005, a Justiça determinou que Tonwley pagasse a González-Vera, mas ele se negou. Depois de uma batalha legal que durou pelo menos cinco anos, fez o primeiro pagamento. Só que deixou de pagar de junho de 2013 a janeiro de 2014.

A viúva de Soria voltou a pedir o pagamento, mas agora o juiz Bates respaldou a posição do Governo dos EUA: “A Lei de Reforma da Segurança para Testemunhas não autoriza os tribunais a interpretar as atividades do promotor geral em relação a uma pessoa sob proteção”. “Seria perigoso divulgar a identidade e localização de uma testemunha protegida, inclusive a um tutor”, explicou o magistrado.

Ali Beydoun, o advogado nos Estados Unidos da família do diplomata espanhol morto, assegurou que insistirão para a se faça justiça. “Cada vez que fomos ao tribunal ou enviamos cartas ao Departamento de Justiça nos dizem que o risco à segurança é muito alto. Mas continuaremos pedindo à agência que considere a injustiça que prevalece nesta situação. Não se trata do dinheiro, e sim de que Townley esteja em liberdade.”

Carmelo Soria (leia sobre sua morte aqui, em espanhol) era editor-chefe na sede da CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe) em Santiago do Chile e militava no Partido Comunista da Espanha (PCE). Em 1976 foi sequestrado na rua por militares vestidos de carabineiros (policiais). Seu cadáver foi encontrado dois dias depois, com sinais de tortura.

Desde o início dos anos noventa, sua família tenta em vão mandar para a prisão os responsáveis pelo crime, encontrando barreiras como a lei de anistia chilena ou a condição de testemunhas sob proteção.

Em 2002, o Governo do Chile concordou com uma indenização de 1,5 milhão de dólares para a família, depois que ela interpelou o Estado na Comissão Interamericana de Direitos Humanos. A ratificação pelo Congresso demorou cinco anos. Em 2013 o juiz chileno Lamberto Cisternas determinou que fosse reaberto o caso do assassinato de Soria, mas o nome de Townley foi o grande ausente entre os acusados. “No Chile não se julga Townley. Nâo sabemos por quê e esperamos que façam uma emenda para mudar isso”, afirma Beydoun.

Enquanto isso, na Espanha a Audiência Nacional processou vários agentes pelo assassinato de Soria e alegou que não havia sido efetivo o processo contra esses crimes no Chile. Os agentes foram responsabilizados pelos crimes de genocídio, assassinato e prisão ilegal.

A Espanha pediu ao Chile a extradição de José Ríos San Martin; Jaime Lepe Orellana; Pablo Belmar Labbé; Guillermo Salinas Torres; René Quilhot Palma e Manuel Contreras Sepúlveda, ex-diretor da DINA, mas a Justiça chilena rejeitou o pedido porque o caso estava sob investigação no país. Em 2014 a Audiência Nacional espanhola pediu aos EUA, sem sucesso, a extradição de Townley.

Em 7 de abril o Tribunal Supremo da Espanha decidirá se arquiva ou não os casos ligados à “Justiça universal”, ou seja, a capacidade dos juízes espanhóis de investigar crimes cometidos fora do território do país, entre os quais está o caso do diplomata Carlos Soria. A reforma legal promulgada na Espanha no ano passado pelo Governo do presidente Mariano Rajoy limitou o alcance da Justiça universal. O Supremo deverá deliberar se os tribunais espanhóis têm a competência legal para investigar esses casos.

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