Sem Bolsonaro, América Latina pede financiamento internacional para enfrentar as mudanças climáticas

Argentina, país sede do Diálogo de Alto Nível sobre Ação Climática nas Américas, solicita novos mecanismos financeiros para impulsionar a economia circular e reduzir as emissões

Na tela, o presidente da Argentina, Alberto Fernández, e o enviado especial para o Clima dos Estados Unidos, John Kerry.- (AFP)
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Nenhum país da América Latina está entre os dez mais poluentes do mundo, mas a região com maior biodiversidade do planeta sofre como poucas com as consequências das mudanças climáticas. Para enfrentar este desafio global, vários líderes latino-americanos solicitaram nesta quarta-feira financiamento de organismos internacionais e intercâmbio de dívida externa em troca de resultados ambientais durante a Cúpula Latino-Americana sobre Mudanças Climáticas realizada virtualmente. O presidente Jair Bolsonaro não esteve presente e o Brasil não enviou outro representante.

“Não há crise ecológica alheia à crise social e alheia à necessidade de repensar os pilares da arquitetura financeira internacional. Precisamos de financiamento e novas regras para que a transição seja justa“, disse o presidente argentino, Alberto Fernández, na abertura do encontro. O anfitrião do Diálogo de Alto Nível sobre Ação Climática nas Américas pediu incentivos fiscais para atividades e empregos sustentáveis que contribuam para construir uma economia circular e reduzir as emissões de gases de efeito estufa, entre outras metas internacionais.

“Os empregos do futuro serão sustentáveis. Do contrário, não existirão“, disse Fernández. Ele também solicitou que os organismos internacionais de desenvolvimento vinculem pelo menos 50% de suas carteiras de crédito às ações ambientais e à construção “de uma nova economia que descarte a política de descarte”.

Em seu discurso ele destacou a urgência de uma mudança planetária, mas não colocou na mesa compromissos concretos, com exceção do aumento de 2% em sua contribuição para a ação climática e ambiental, que formalizará na cúpula mundial do clima que acontecerá em Glasgow. a partir de 31 de outubro. Outros líderes, por outro lado, detalharam os roteiros projetados para combater as mudanças climáticas, como o colombiano Iván Duque, que planeja plantar 180 milhões de árvores até 2022 e reduzir as emissões atuais em 51% em 2030.

O presidente da Argentina tomou a posição de líder entre os reunidos em parte porque o Governo Bolsonaro não enviou um representante brasileiro para a Cúpula. A ausência do presidente brasileiro é previsível, mas não esvaziou a reunião. Bolsonaro esteve presente em manifestações de apoiadores durante a terça-feira, 7 de setembro, em Brasília e São Paulo. Já no dia 8, data da reunião virtual, constava em sua agenda oficial apenas um encontro com o subchefe para assuntos jurídicos da Secretaria-Geral da Presidência da República, das 15h às 15h30. Coube a Fernández chefiar o diálogo sobre a ação climática nas Américas com o país mais importante do continente, os Estados Unidos.

O enviado especial dos Estados Unidos para o Clima, John Kerry, não se esquivou da responsabilidade de seu país, o segundo maior poluidor do mundo, atrás apenas da China. “A menos que cada um dos países não faça o suficiente, principalmente os 20 maiores emissores, responsáveis por 80% das emissões mundiais, o resto do mundo será condenado por suas ações ou por sua inércia”. Os Estados Unidos pretendem reduzir as emissões pela metade até 2030 e, cinco anos depois, que toda a sua produção de eletricidade venha de fontes livres de carbono e que 50% de sua frota de automóveis seja elétrica.

O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, concordou com o presidente argentino sobre a necessidade de mudanças no sistema de financiamento do desenvolvimento: “Deve oferecer opções que vinculem a ação climática à sustentabilidade da dívida para criar empregos e amenizar as dificuldades que a dívida gera“. Duque também pediu soluções financeiras, como estabelecer um sistema de perdão de dívidas para os objetivos ambientais alcançados ou incluir a sustentabilidade nos critérios de produção.

Os representantes dos países insulares, os mais afetados pela subida do nível das águas e pelos fenômenos climáticos extremos, foram os mais contundentes quando se tratou de exigir a mudança do leme. “O que precisa mudar para salvar a nós mesmos e ao planeta?”, lançou ao ar o presidente da Costa Rica, Carlos Alvarado. “A realidade da natureza está sendo muito clara. Vemos inundações, incêndios florestais, derretimento de geleiras, perda de biodiversidade... Ironicamente, neste ano, os gastos militares mundiais voltaram a crescer. Onde está a prioridade do mundo? Estamos nos armando para um conflito armado quando nossa principal ameaça é a sobrevivência de nossa casa comum“, disse.

“Estamos decepcionados”, disse a primeira-ministra de Barbados, Mia Amor Mottley, minutos antes, após relatar as consequências nesta ilha caribenha, em julho passado, do furacão Elba, que destruiu centenas de casas, escolas, hospitais e outros edifícios. Mottley disse que os pequenos países da América Central não são os causadores da crise climática, mas suas consequências os obrigam a se endividar para se reconstruírem continuamente.

Também participaram da cúpula Laurentino Cortizo Cohen, pelo Panamá, Luis Abinader (República Dominicana), Mario Abdo Benítez (Paraguai), a presidenta da COP25 e ministra do Meio Ambiente do Chile, Carolina Schmidt, além do presidente da COP26, Alok Sharma.

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