A Black Friday do Brasil na Cop26: país manipula números para seduzir o mundo
Antes de anunciar o compromisso de redução de 50% nas emissões até 2030, o país permitiu um aumento exponencial do desmatamento e das próprias emissões
Golpe. Essa é a única palavra capaz de traduzir a operação de sedução que o governo brasileiro promove durante a Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas. Nas ruas de Glasgow, a batalha pelos corações e mentes da sociedade civil está perdida, com manifestantes levando bonecos imitando um Jair Bolsonaro algemado. Ele encarna a figura do “delinquente ambiental”.
O governo, ainda assim, optou por tentar desarmar uma bomba diplomática, principalmente depois do constrangimento vivido pelo presidente na cúpula do G20, em Roma. Ali, ficou claro que não existia apenas um homem isolado, mas um país que perdeu seu lugar no mundo. Deixou não apenas de ser protagonista, mas tornou-se tóxico. O resultado: um papel irrelevante no palco mundial, justamente numa era que vai redefinir nossa geração.
Assim, no espaço de apenas alguns dias, o governo proliferou anúncios espetaculares, numa espécie de corrida para quitar “hipotecas climáticas”. Mas, no fundo, elas não passam de fraudes e repetem a única política constante do atual governo: a da mentira.
Um dos anúncios foi a de que o Brasil irá erradicar o desmatamento ilegal até 2028. Como? Simples: legalizando a mineração, o garimpo, as madeireiras e a exploração em terras que, até agora, deveriam estar preservadas. Projetos de Lei prestes a serem votados no Congresso já garantiriam esse caminho, transformando o ilegal em legal. Sem uma fronteira entre o moral e imoral, a manobra permitiria que o país anuncie ao mundo que atingiu seus “objetivos”.
No que se refere às emissões, a fraude também é amplamente comentada entre ambientalistas. Nos corredores da COP26, um termo já ganhou espaço para designar a estratégia do Brasil: “Black Friday”. Ou seja, antes de anunciar o compromisso de redução de 50% nas emissões até 2030, o país permitiu um aumento exponencial do desmatamento e das próprias emissões. Assim, quando fixou a meta, a base de cálculo já era outra e o esforço será menor.
Nenhum dos protocolos que o Brasil aderiu gera qualquer tipo de constrangimento legal para o país. Não há nada que o governo tenha de fazer a partir de segunda-feira. Não há nenhum tratado a ser ratificado no Congresso ou exigência de reconstrução dos órgãos de fiscalização. Tudo é voluntário e, na melhor das hipóteses, recairá no colo de um futuro governo.
Assim, com anúncios vazios, mentirosos e manipulados, Bolsonaro transforma a participação do único país com nome de árvore na conferência climática em um espelho de sua gestão.
Há quem diga que, mesmo assim, ninguém deveria se surpreender se o cinismo dos negociadores em Glasgow prevalecer. Mas quando o mundo voltar a se reunir para a 27ª “cúpula da última chance”, a floresta estará menor, grupos indígenas estarão mais vulneráveis e o medo daqueles que tentam defender o planeta ganhará novas dimensões.
Indecente, o golpe brasileiro em Glasgow entrará para os anais como o momento em que um governo acusado de ecocídio tentou enganar o mundo.
A história não lhes poupará.
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