Chavismo prepara medidas para controlar as redes sociais e o trabalho das ONGs na Venezuela
Assembleia Nacional eleita em dezembro segue as instruções de Nicolás Maduro no início de seu trabalho legislativo
A Assembleia Nacional eleita em 6 de dezembro na Venezuela e controlada pelo chavismo apresentou nesta semana seu primeiro pacote de medidas. Neste novo Parlamento – resultante de um pleito sem a participação da oposição, com denúncias de irregularidades e elevada abstenção do eleitorado –, a coalizão de partidos que apoia o Governo de Nicolás Maduro usará o terreno legislativo para consolidar seu poder, e o primeiro passo será estabelecer um controle sobre as redes sociais e o trabalho das ONGs que operam no país.
As 33 propostas já apresentadas receberam o aval de Maduro. Serão reformadas leis comerciais, territoriais e relativas à organização e participação popular baseada em comunas. O falecido presidente Hugo Chávez já buscou implantar um modelo de organização semelhante na sua fracassada reforma constitucional de 2007. Se for adiante, será o primeiro passo para suprimir a atual estrutura de poder, baseada em governos estaduais e municipais.
Uma das normas que mais causaram preocupação foi a chamada reforma da Responsabilidade Social em Rádio, Televisão, Redes e Meios Eletrônicos, por incluir uma regulação das redes sociais que, segundo críticos, pode aprofundar a censura na Internet. “Aqui se agregará um capítulo especial para as redes sociais e a responsabilidade social das redes sociais em território venezuelano”, disse Maduro nesta semana. Em novembro passado, no contexto da campanha eleitoral para a Assembleia, o presidente já havia defendido a regulação destas plataformas. “Que limites cumprem essas redes que já conhecemos? Nenhum. É um assunto para a próxima Assembleia Nacional”, afirmou na ocasião.
Bloqueios digitais
O Governo venezuelano tem aplicado bloqueios seletivos a sites informativos críticos ao chavismo, segundo os dados de organizações como o Instituto de Imprensa e Sociedade e Espaço Público. Também prendeu tuiteiros, amparando-se na Lei contra o Ódio, aprovada em 2017 pela Assembleia Nacional Constituinte, o Parlamento paralelo que Maduro criou para se contrapor à maioria opositora no Legislativo da época. A lista de projetos apresentados nesta semana também inclui a Lei do Espaço Cibernético, um instrumento pensado para regular a internet.
A oposição também vê com receio a chamada Lei de Cooperação Internacional, que permitirá ao Governo regular o financiamento das ONGs. O deputado Diosdado Cabello, considerado o segundo homem forte do chavismo depois de Maduro, tem em várias ocasiões atacado as organizações humanitárias, especialmente as que denunciam a situação no país. Documentos redigidos por essas organizações engrossam uma série de relatórios e decisões das Nações Unidas e do Tribunal Penal Internacional a respeito de violações dos direitos humanos e de crimes contra a humanidade cometidos na Venezuela.
Em outra frente política, a Assembleia, onde o partido governista PSUV detém 257 dos 277 assentos, revogou a Lei de Regularização de Períodos Constitucionais, facilitando assim que o próximo Conselho Nacional Eleitoral promova eleições estaduais e municipais simultaneamente. A estratégia consiste em fortalecer a hegemonia política do chavismo sobre o mapa. Maduro tem se valido de processos desse tipo para fragmentar de vez oposição, dividida pelo dilema de participar dos processos eleitorais sem garantias, garantindo um mínimo de representação, ou se abster para tentar boicotá-los.
Enquanto a Assembleia foi controlada pela oposição, entre 2015 e 2020, Maduro bloqueou seu funcionamento através do Supremo Tribunal, com a criação da Constituinte e perseguindo diretamente os deputados contrários. Agora, novamente com um Parlamento dócil, a ofensiva chavista para se manter no poder em meio a um cenário altamente adverso – com rejeição quase total dos cidadãos e sob sanções financeiras e diplomáticas – ganha uma frente no terreno legislativo.