Trump troca afagos com Bolsonaro e reforça imagem de aliança entre os dois países
Presidentes reiteram apoio a Guaidó e a eleições na Bolívia, e sinalizam ampliar relação comercial. Governo cortou a Folha de S. Paulo da cobertura do jantar, repetindo gesto de Trump com CNN
Donald Trump jantou lado a lado com o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, neste sábado, na Flórida, no complexo de férias de Mar-a-Lago, a que o mandatário norte-americano gosta de se referir como “a Casa Branca do sul”. Numa mesa grande, com outros participantes, como o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, o mandatário americano colocou Bolsonaro ao seu lado e trocou afagos públicos, retribuídos pelo brasileiro. “Este é um homem brilhante, tem feito um trabalho fantástico. Nunca estivemos tão próximos”, disse Trump. Bolsonaro respondeu que estava muito feliz de estar ali. “É uma honra muito grande para mim e para o meu país. É muito bom, para um futuro próximo, ter um bom relacionamento de direita”, replicou.
Esta é a quarta visita de Bolsonaro aos Estados Unidos desde que assumiu em janeiro de 2019 com a promessa de que iria estreitar laços com Trump, fonte de inspiração na área econômica, no discurso verborrágico e nos ataques à imprensa. Na Flórida, o Palácio do Planato decidiu excluir a Folha de S. Paulo da cobertura do jantar, repetindo o ataque que Trump já havia promovido contra a rede CNN em 2018, quando lhe cortou a credencial de cobertura da Casa Branca – depois restaurada.
Na campo diplomático, os dois países reiteraram o apoio ao papel de Juan Guaidó como presidente da Venezuela, além do apoio “aos esforços da Bolívia para a realização de eleições livres e justas”, diz comunicado conjunto dos dois países. “O Presidente Bolsonaro e o Presidente Trump reiteraram o apoio de seus países à democracia na região, incluindo apoio ao presidente interino da Venezuela, Juan Guaidó, e à Assembleia Nacional da Venezuela democraticamente eleita”, afirma o comunicado.
A crise na Venezuela é uma prioridade da Administração Trump na América Latina. O Brasil está alinhado à estratégia de Washington de isolamento total ao regime de Nicolás Maduro, e nesta mesma semana o Governo do Brasil ordenou a retirada de todos os seus diplomatas ligados ao chavismo que se encontravam na Venezuela.
Os dois assumiram compromisso com a paz no Oriente Médio também, muito embora os dois tenham promovido fissuras na região. Bolsonaro ao insisitr que pretende transferir a embaixada brasileira de Telaviv para Jerusalém, ponto sensível para os países árabes, e Trump que liderou um conflito com o Irã ao ordenar um bombardeio que matou o principal general do país, Qassem Soleimani. Agora Trump trabalha num acordo de paz entre Israel e Palestina, mas seu acordo vem sendo rebatido pela Liga Árabe.
Alumínio, comércio e OCDE
Esta é a primeira reunião entre os dois líderes populistas de direita desde que Trump desconcertou Bolsonaro com o anúncio, em dezembro do ano passado, de novos impostos ao aço e alumínio brasileiros. O líder brasileiro afirmou que Trump não levará adiante sua ameaça, mas o norte-americano ainda não a retirou formalmente e nem falou do assunto publicamente durante o encontro.
O comunicado da Casa Branca que detalhava a pauta do encontro antes do jantar, não mencionava esses tarifas. Em comunicado conjunto, anunciaram que ”trabalham por um pacote bilateral de comércio este ano, visando à intensificação da parceria econômica entre os seus dois países”, e especialmente, a reiteração de apio dos Estados Unidos ao início de processo de entrada do Brasil na Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). “O Presidente Trump reiterou o apoio dos Estados Unidos ao início do processo de acessão do Brasil à Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) e exorta seus parceiros na OCDE a trabalhar em conjunto com os Estados Unidos para esse objetivo, que ajudará o crescimento da economia brasileira e o aumento de sua competitividade.”
A agenda de Bolsonaro que deve ficar nos Estados Unidos até terça, inclui uma visita neste domingo, na cidade de Doral, ao Comando Sul dos Estados Unidos, que coordena as operações militares no Caribe, Centro e América do Sul. Bolsonaro vai assinar lá um “acordo de projetos de pesquisa” para “compartilhar informação no desenvolvimento de novas capacidades de defesa”. Na segunda-feira terá um encontro com empresários dos dois países, e na terça-feira, depois de um encontro com o senador republicado da Flórida, Mark Rubio, visitará em Jacksonville a fábrica da empresa brasileira de aviões Embraer. O Governo brasileiro informou que o presidente Bolsonaro se reunirá com membros da comunidade brasileira da Flórida, formada por 400.000 pessoas.
Para Bolsonaro, a viagem também será uma oportunidade de se reunir com empresários à procura de investimentos. O PIB de 2019 de 1,1% (contra 1,3% em 2018 e 2017) anunciado na última quarta (4) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) , e a ameaça de uma queda global provocada pela crise do coronavírus, pode nublar ainda mais o horizonte de uma economia que não consegue se recuperar após a grave recessão de 2015 e 2016. Na sexta-feira, a Associação Nacional de Fabricantes de Veículos (Anfavea) já anunciou o risco de paralisar a produção de carros em função do coronavírus que afeta a China, seu principal fornecedor de autopeças.
O presidente vai testar seu talento para convencer empresários a investir num momento de incerteza na economia, estimulada por ele mesmo, como afirmou o presidente da Câmara do Brasil, Rodrigo Maia. “O governo gera uma insegurança grande para a sociedade e para os investidores. As pessoas estão deixando de investir pela questão do meio ambiente e pela questão democrática”, disse Maia em evento em São Paulo, nesta sexta.
No comunicado conjunto, Bolsonaro e Trump anunciaram discutir o projeto Um Trilhão de Árvores, de replantio até 2050, o que soa irônico para o Brasil diante do avanço do desmatamento e do avançø sobre reservas ambientais estimuladas por um discurso de desprezo do presidente brasileiro com o meio ambiente.
O encontro entre os dois presidentes ocorre um ano depois de Trump receber Bolsonaro na Casa Branca. Os dois políticos têm o mesmo estilo de conservadorismo populista, e Bolsonaro baseou sua bem-sucedida campanha de 2018 na que levou Trump à Casa Branca em 2016. Para o mandatário brasileiro, o encontro gerou imagens que fortalece o apoio da sua base num momento em que reforça o clima bélico com outros poderes e incentiva o ataque à imprensa. Em seu twitter, partilhou a notícia de que havia cortado a Folha de São Paulo da cobertura do jantar.