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O adeus a José Ramos Tinhorão, crítico musical, aos 93 anos

Ao longo de sua carreira, o pesquisador, respeitado por encarnar a figura de temido crítico musical, escreveu mais de 20 livros sobre música brasileira

O crítico José Ramos Tinhorão, em imagem do acervo do IMS.
O crítico José Ramos Tinhorão, em imagem do acervo do IMS.IMS

O Brasil se despede nesta terça-feira de um dos maiores nomes da crítica musical no país: o jornalista e pesquisador José Ramos Tinhorão faleceu aos 93 anos, conforme informou a Editora 34, que publicava seus livros. A causa do óbito não foi comunicada. Nascido em Santos (SP) e formado em Jornalismo no Rio de Janeiro, Tinhorão é uma referência no Brasil, com uma carreira respeitada por encarnar a figura de temido crítico musical— escreveu mais de 20 livros sobre música brasileira, fado e outras manifestações musicais de Portugal.

Aos nove anos, o paulista se mudou para o Rio, onde, ainda na infância, descobriu a paixão pela música brasileira. Decidiu cursar, no entanto, Direito e depois Jornalismo na Faculdade do Rio de Janeiro. Em 1951, começou a vida como jornalista freelancer, ao lado do amigo e fotógrafo Humberto Franceschi, pulicando na Revista da Semana. Em 1952, com 24 anos e ainda estudante, foi levado por Armando Nogueira, outro colega universitário, para o Diário Carioca. Foi naquela redação que José Ramos ganhou o apelido Tinhorão, nome de uma planta ornamental tóxica.

Suas opiniões fortes e cortantes contrastavam, por vezes, com o jeito e tom de voz amigáveis. Ele se justificava ao dizer que procurava ver a história “de uma forma dialética”, batendo de frente “com as coisas que são aceitas por comodidade e interesse”, como disse em uma entrevista a O Globo, em 2015. De personalidade reservada e pouco propenso a comparecer em eventos públicos, Tinhorão participou naquele ano da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip).

Ávido colecionador de discos, seu acervo chegou a ter cerca de 13.000 LPs e sua biblioteca contava com 14.000 mil obras sobre cultura popular e mais de 35.000 documentos, entre partituras, jornais e fotografias, de acordo com levantamento feito pelo jornal O Tempo, em 2010. Por conta desse acervo, Tinhorão passava as noites em um saco de dormir no quitinete para onde se mudou após a separação da mulher, conforme consta em sua biografia, Tinhorão - o legendário, de autoria de Elizabeth Lorenzotti.

Em 2001, o Instituto Moreira Salles (IMS) comprou o acervo e o crítico comemorou a venda, pois, segundo ele, isso permitira o acesso de um maior público ao que considerava um “patrimônio intelectual”.

Tinhorão não via com bons olhos a recente música popular brasileira. Considerava o iê-iê-iê “uma simplificação do rock, um rock trocado em miúdos para otário” e criticava Roberto Carlos por ter representado o ideal de bom moço durante a ditadura militar brasileira e Chico Buarque, a quem acusava de ter composto escassamente nas últimas duas décadas. Tampouco gostava dos artistas da bossa nova e do tropicalismo, movimentos que não considerava genuinamente brasileiros, mas sim um “ritmo de goteira” ou “puro jazz pasteurizado”. Naquela entrevista a O Globo, em 2015, fuzilou: “Não tem mais música brasileira para criticar.”


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