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Câncer de mama supera o de pulmão e se torna o mais comum do mundo

Maior monitoramento da população e fatores sociais como o envelhecimento e o atraso da maternidade influem no aumento da detecção de casos

Uma mulher faz uma mamografia em um hospital da Catania (Itália), no ano passado.
Uma mulher faz uma mamografia em um hospital da Catania (Itália), no ano passado.Fabrizio Villa (Getty)
Andrea Arnal Martín
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Aos 36 anos, Kylie Minogue enfrentou e superou a doença. Na época, a cantora namorava com o ator Olivier Martínez que foi seu grande apoio. Desde então é uma mulher comprometida com esta causa.
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O câncer de pulmão foi durante anos o mais diagnosticado de todos, mas as estatísticas mostram que outro tipo de tumor acaba de superá-lo em número de casos: o câncer de mama. Com uma estimativa de 2,3 milhões de diagnósticos em 2020 (11,7% do total), segundo um relatório recente da OMS, acaba de se tornar o câncer mais comum do mundo.

Que seja o câncer com maior incidência obedece principalmente a “uma conjunção de diversos fatores”, como observa Álvaro Rodríguez-Lescure, presidente da Sociedade Espanhola de Oncologia Médica (SEOM) e chefe de Serviço de Oncologia Médica do Hospital Geral Universitário de Elche. Entre eles, o médico destaca, por um lado, “um maior número de diagnósticos pelas técnicas de triagem populacional” e, por outro, fatores sociais como o envelhecimento da população, o atraso da maternidade, redução da lactação materna, não ter filhos, tomar a pílula anticoncepcional, ter a primeira menstruação a uma idade precoce ou uma menopausa mais tardia. Também a “obesidade, o sedentarismo, o consumo de álcool e as dietas inadequadas” desempenharam um papel relevante.

Como a maioria destes fatores de risco ocorre historicamente em países desenvolvidos, a incidência neles também é maior. Entretanto, o recente relatório da OMS aponta a que a incidência “está crescendo rapidamente na América do Sul, África e Ásia, assim como no Japão e Coreia do Sul”, regiões onde tradicionalmente era mais baixa. Mudanças sociais como a incorporação destas mulheres ao mercado de trabalho, o que as obriga a adiar a gravidez, ou no estilo de vida, como uma redução da atividade física, fazem, segundo os autores, que as mulheres destes países tenham um perfil cada vez mais parecido com as populações dos países desenvolvidos, razão pela qual as cifras de mortalidade por câncer de mama também tendem a se igualar.

Na Espanha, por exemplo, estima-se que uma em cada oito mulheres sofrerá câncer de mama ao longo de sua vida. A boa notícia é que as cifras de mortalidade são cada vez mais baixas: a taxa de sobrevivência total nesse país europeu é de 85,5% após cinco anos do diagnóstico desse tumor, segundo a AECC (Associação Espanhola Contra o Câncer). Estes dados tão positivos se devem em boa medida ao imenso esforço da comunidade científica para compreender e tratar melhor a doença: segundo dados da AECC, o de mama é, de longe, o tipo de câncer que mais ensaios clínicos gera.

A maioria dos estudos está focada sobretudo em melhorar os tratamentos, que variam principalmente em função do subtipo de câncer de mama. Há três tipos de tumores em função de se expressarem ou não os receptores de estrogênio, progesterona e/ou HER2. Cristina Saura, chefa da unidade de câncer de mama do Departamento de Oncologia Médica do Hospital Universitário Vall d’Hebron (Barcelona) e pesquisadora principal do grupo de câncer de mama e melanoma do hospital, explica que “o subgrupo mais frequente é o tumor luminal, que tem expressão de receptores de estrogênio ou progesterona. Representa 70% dos tumores diagnosticados”.

A grande revolução no tratamento destes tumores chegou há poucos anos, com a aprovação dos inibidores de ciclo celular ―os populares palbociclib, ribociclib, e abemaciclib―, que são parte das chamadas “terapias dirigidas”. No caso destes inibidores, eles evitam a proliferação das células e reduzem assim a progressão da doença, o que “permite um controle duradouro da enfermidade em estágios avançados, assim como uma maior sobrevivência das pacientes, além de um atraso no uso da quimioterapia, com o subsequente benefício na qualidade de vida”, afirma Rodríguez-Lescure. Atualmente, vêm sendo testados também em estágios iniciais da doença, diz Saura, para observar até que ponto são também nesses casos efetivos para prevenir recaídas.

O segundo tipo de tumor mais frequente é o subgrupo HER2-positivo que, independentemente da expressão dos receptores de estrogênio ou progesterona, causa uma expressão excessiva do HER2. Esses tumores, que afetam 15% das pacientes, costumam crescer mais rapidamente que outros e costumam ser tratados com uma combinação de quimioterapia e medicamentos que bloqueiam esta proteína.

Para isso, historicamente são usados anticorpos, mas nos últimos anos está sendo pesquisado o potencial das chamadas drogas imunoconjugadas (ADC, na sigla em inglês), uma espécie de quimioterapia que é associada a um anticorpo que reconhece o HER2. Isto permite que o tratamento seja liberado diretamente no interior das células tumorais, e não no sangue, de modo a “utilizar mais doses de quimioterapia e que ao mesmo tempo seja menos tóxica”, segundo Saura.

Embora medicamentos deste tipo já tenham sido aprovados há alguns anos para casos de tumores HER2-positivos, como o T-DM1, “encontrou-se outro, o trastuzumab-deruxtecan, que utiliza esta tecnologia, mas é muito mais ativo”, afirma Saura. De fato, este novo tratamento foi recentemente aprovado pela Agência Europeia de Medicamentos e em breve poderá começar a ser usado no continente. Junto a este há outro fármaco muito promissor, o tucatinib, um inibidor de HER2 que demonstra “um benefício no controle da doença e na sobrevivência das pacientes com enfermidade cerebral” e que deixa os médicos “muito entusiasmados”, conclui Saura.

O último subgrupo de tumor é o triplo negativo, que se chama assim porque não representa uma expressão excessiva de nenhum dos três receptores. Afeta 10% das pacientes, mas é o que mais preocupa a comunidade científica, por estar associado a uma menor sobrevivência ―em estágios avançados, menos de 15% das pacientes sobrevivem além de cinco anos. Conta, além disso, com um menor arsenal terapêutico: “Necessitamos urgentemente de novas opções de tratamento eficazes para nossas pacientes”, aponta Rodríguez-Lescure.

O mais inovador nesta área é curiosamente a imunoterapia, que, embora não pareça ser tão efetiva no câncer de mama em geral como em outros tumores, parece estar trazendo bons resultados tanto em pacientes com metástase como naquelas com a doença detectada precocemente.

Alternativas à mamografia

De todos os desafios relativos ao câncer de mama, os médicos consultados consideram que melhorar a detecção precoce é o mais urgente: “Deveríamos poder diagnosticar os tumores antes, porque sabemos que a chance de cura das pacientes é quando a doença se diagnostica localizada”, observa Saura.

Por enquanto, a principal forma de detecção precoce do câncer até o momento continua sendo a mamografia, que, segundo Rodríguez-Lescure, “demonstrou reduzir a mortalidade em até 40% nas mulheres de 50 a 69 anos”. Entretanto, nos últimos anos a eficácia desse exame de diagnóstico tem sido questionada, e todos os especialistas concordam que a redução de mortalidade graças a ele é, em todo caso, insuficiente.

Por isso, a ciência também investe tempo e dinheiro em procurar um teste eficaz de screening (monitoramento), não só para a população em geral, mas sobretudo para pacientes que já passaram pela doença. “Estamos fazendo o mesmo que fazíamos há 20 anos: que a paciente, depois da cirurgia, faz uma mamografia a cada três ou seis meses, e se aparecer essa recaída a tratamos”, afirma Miguel Ángel Quintela, chefe da Unidade de Pesquisa Clínica de Câncer de Mama do Centro Nacional de Pesquisas Oncológicas (CNIO) da Espanha. “Entretanto, quando os médicos a detectam, já estamos agindo tarde: o tumor já cresceu muito e se disseminou”, lamenta o especialista.

Para chegar antes, a grande promessa é a biópsia líquida, um exame de sangue que busca detectar genes mutantes do câncer antes que este seja visível por outros meios. “Já há dados que demonstram que as pacientes nas quais começa a se detectar esse DNA alterado estão a ponto de recair”, diz Quintela.

O problema da biópsia líquida é que ainda não tem suficiente sensibilidade, o que faz muitas pacientes continuarem tendo recaídas sem que seja detectada evidência alguma de DNA tumoral no exame. Mesmo assim, os médicos estão otimistas quando ao desenvolvimento dessa técnica e preveem que pouco a pouco sua sensibilidade aumentará. “Isto permitirá detectar este DNA tumoral na grande maioria das pacientes”, conclui o especialista.

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