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Cacique Raoni e filha de Chico Mendes relançam a Aliança dos Povos da Floresta

Lideranças indígenas se reúnem no Mato Grosso contra políticas do Governo Bolsonaro nas áreas ambiental e indígena

Aliança dos Povos da Floresta
Ângela Mendes, Raoni Metuktire e Julio Barbosa.Helena Borges
Helena Borges
Terra Indígena Capoto-Jarina (MT) -

Quase quatro décadas depois de o ativista ambiental Chico Mendes lançar a Aliança dos Povos da Floresta, uma união entre extrativistas, ribeirinhos, quilombolas e indígenas para defender o desenvolvimento sustentável na Amazônia, mais de 500 lideranças indígenas se reúnem na aldeia Piaraçu, na Terra Indígena Capoto-Jarina, em Mato Grosso, para reativar os compromissos em comum. Liderados pelo Cacique Raoni e com a presença de Ângela Mendes, filha de Chico e presidente do comitê que leva o nome de seu pai, eles pretendem lançar um manifesto em defesa dos povos da floresta e cobrar do Governo Bolsonaro um maior compromisso com o meio ambiente e seus defensores. Entre os presentes, muitas das lideranças que participaram do movimento da década de 1980, que garantiu a participação dos povos da floresta na constituinte pós-redemocratização.

“Esse encontro não é para planejar uma guerra, um conflito. Estamos aqui para defender nosso povo, nossa causa, nossa terra”, afirmou Raoni, que no ano passado esteve na Europa para buscar apoio para a defesa da Amazônia. Encontrou-se com o Papa Francisco e com o presidente francês, Emmanuel Macron, e acabou se tornando alvo do presidente Jair Bolsonaro em seu discurso de abertura da Assembleia-Geral da ONU, que o chamou de “peça de manobra” de Governos estrangeiros. “Bolsonaro, faça coisas bonitas, faça as coisas direito. Ajude seu povo. Ajude o povo indígena. Você vem fazendo as coisas querendo destruir”, afirmou o cacique kayapó durante o encontro.

Ângela foi recebia por cerca de trinta lideranças kayapó. Sua presença foi anunciada a todos por Raoni como “uma pessoa que honra o legado de seu pai, o seringueiro que morreu defendendo a floresta”. Emocionada, ela lembrou dos últimos anos de vida de seu pai e fez um comparativo com o momento atual: “Meu pai dizia que a floresta nos une frente ao perigo comum, mas hoje é o Governo que nos trata como se fôssemos um inimigo. Tentamos contato com o Governo assim que assumiram, como foi feito com todos os anteriores. Mas os órgãos que eram nossos interlocutores estão fechando as portas”, afirmou.

Para ela, este é um “momento histórico” de reaproximação de extrativistas, indígenas e quilombolas. “Esse convite veio como um respeito à ancestralidade, que é uma questão muito importante para os povos indígenas. Venho representando a luta e a memória do meu pai, pela preservação da floresta. Estamos no momento de unificar forças e dialogar.” Nesta sexta-feira, data final do encontro, haverá a divulgação de uma carta aberta que será encaminhada ao Ministério Público e ao Congresso Nacional.

Ângela chegou a aldeia Piaraçu, acompanhada do presidente do Conselho Nacional dos Seringueiros (CNS), Julio Barbosa. Ele foi um dos seringueiros que, ao lado de Chico Mendes, se reuniram às lideranças indígenas e quilombolas no encontro dos Povos da Floresta. E explica a importância da reunião: “Vamos conversar sobre a reconstrução da aliança dos povos da floresta e a retomada de uma agenda comum.” Fundada nos anos 80 a Aliança perdeu seu idealizador menos de uma década depois. Chico Mendes foi assassinado em 1988, quando a articulação estava em seu momento crucial. “Quando Chico foi assassinado nossa luta estava no auge da união. Desde então as nossas conquistas foram muitas. Nosso legado é enorme. Ele morreu sem ver nenhuma reserva extrativista reconhecida, hoje são 682 territórios. Mas, particularmente, eu que passei por dezenas de empates achava que mais de 30 anos depois não precisaria estar fazendo tudo isso novamente”, afirma Barbosa.

Encontro no Xingu 2020 - Angela Mendes Raoni
Helena Borges

Crime organizado

O encontro acontece na mesma semana em que a Human Rights Watch (HRW), ONG internacional que atua em defesa aos direitos humanos, publicou seu relatório global, em que afirmou que a política ambiental de Bolsonaro deu “carta branca” às redes criminosas que atuam na destruição da floresta. A organização também pediu que o Ministro da Justiça, Sergio Moro, inclua a Amazônia nas políticas de combate ao crime organizado.

Neste último ano, o primeiro do Governo Bolsonaro, o desmatamento aumentou mais de 80% entre janeiro e outubro de 2019, em relação ao mesmo período de 2018. Ao mesmo tempo, o relatório aponta que o número de multas por desmatamento ilegal emitidas pelo Ibama caiu 25% entre janeiro e setembro de 2019 comparado ao mesmo período do ano anterior. Ao menos 160 casos de extração ilegal de madeira, invasões e outras infrações foram contabilizados nos territórios indígenas entre janeiro e setembro do ano passado, apontou a ONG.

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