Neymar, da chegada triunfal em Paris à permanência indesejada no PSG
Com imagem desgastada e superprotegido pelo pai, atacante tentou forçar retorno ao Barcelona, mas ficará no PSG após fechamento da janela de transferências
Chegadas triunfais, despedidas frustrantes. Assim, repleta de altos e baixos, tem sido a trajetória do maior craque brasileiro da atualidade pelas equipes que já defendeu. O episódio mais recente desse roteiro de constrangimentos protagonizado por Neymar é a tentativa frustrada de sair do Paris Saint-Germain, clube que há dois anos o converteu no jogador mais caro da história e pagou 821 milhões de reais para tirá-lo do Barcelona. Com a carreira conduzida pelo próprio pai, ele segue em evidência por polêmicas, atritos com companheiros, rivais e torcedores, litígios na Justiça e até uma acusação de estupro —arquivada por falta de provas—, enquanto as tão sonhadas premiações individuais passam longe de consagrar seu talento.
A janela europeia de transferências fechou nesta segunda-feira, sem que a arrastada negociação com o Barça se concretizasse. Dirigentes catalães chegaram a oferecer um pacote de jogadores além da quantia em dinheiro, mas não alcançaram o valor ao redor de 1 bilhão de reais pretendido pelo PSG para ceder sua grande estrela. No mesmo dia, frustrado pelo desfecho da novela, Neymar se apresentou à seleção brasileira nos Estados Unidos, onde disputará amistosos contra Colômbia e Peru. Ele não atua desde o início de junho, quando lesionou o tornozelo em partida diante do Catar. Pelo time parisiense, a última exibição do craque foi em 27 de abril, na surpreendente derrota para o Rennes na final da Copa da França. Depois, ficou afastado dos jogos enquanto não definia seu futuro. Nesse período, treinou separadamente dos colegas, prestigiou um show da cantora Paula Fernandes em Portugal e anunciou uma ponta como ator coadjuvante na série espanhola La Casa de Papel.
Em duas temporadas no PSG, o atacante não conseguiu conquistar o almejado título da Champions League nem voltar a figurar entre os três melhores jogadores do mundo. Pelo segundo ano consecutivo, sequer apareceu no top 10 eleito pela FIFA. Acumulou rompantes de rebeldia, como a guerra de egos com Cavani pelo posto de batedor oficial de pênaltis, suspensões por reclamar com árbitros e revidar os xingamentos de um torcedor com agressão. Na estreia do PSG no Campeonato Francês, torcedores o hostilizaram com cânticos e faixas favoráveis à sua saída. Uma delas se referia a uma entrevista que soou como provocação ao clube francês —Neymar disse que o jogo mais marcante de sua vida foi a virada do Barcelona por 6 a 1 sobre a equipe que atualmente paga seus salários.
Por trás de cada polêmica costuma emergir a figura paterna, que foi capaz de contrariar a vontade da mãe para batizar o filho com seu nome. “Neymar pai”, como ficou conhecido, cumpre o papel de gestor da carreira e porta-voz do jogador. Seu perfil no Instagram, com mais de 1 milhão de seguidores, serve de tribuna para defender Neymar Júnior nos entreveros midiáticos. “Meu filho é atleta do PSG, mas não pode ignorar sua história”, justificou o pai ao explicar que o atacante não estava zombando de torcedores e dirigentes franceses ao relembrar a remontada pelo Barça. “Essa superproteção acaba impedindo que o Neymar amadureça”, avalia Zetti, ex-goleiro e tetracampeão mundial com a seleção brasileira, em 1994. “Pelo nível que atingiu no futebol mundial, ele deveria separar a carreira do pai. Não pode ser tratado para sempre como um menino.”
Em 2017, Neymar saiu chamuscado do Barcelona e deixou torcedores culés irritados por causa da postura enigmática que selou sua transferência ao PSG. Novamente, o pai-empresário entrou em ação com um drible nos dirigentes do Barça pelo pagamento dos 26 milhões de euros referentes à renovação de contrato, que até hoje está pendente em uma disputa judicial. Neymar pai também chamou para si a responsabilidade pelos processos de sonegação de impostos, tanto no Brasil quanto na Espanha, derivados da transferência do Santos em 2013. Chegou a ameaçar tirar o filho do Barcelona caso as autoridades locais não lhe garantissem “tranquilidade tributária” no país.
A saída do Santos, clube que revelou o jogador, foi igualmente tumultuada. O time alvinegro acusa o staff de Neymar de ocultar o verdadeiro valor da negociação com o Barça e briga em tribunais esportivos para receber mais de 50 milhões de euros pela transferência, assim como a DIS, que detinha 40% de seus direitos e denunciou a empresa liderada por Neymar pai às autoridades espanholas por fraude. Nem ele nem dirigentes santistas descartam um retorno no futuro, mas a idolatria que despertou desde seus primeiros passos na base ficou estremecida.
Neymar chegou ao Santos aos 12 anos. Aos 14, seu antigo empresário o levou à capital espanhola para um período de testes no Real Madrid. Treinou por três semanas com o time juvenil, conheceu Ronaldo e Roberto Carlos, ídolos brasileiros que atuavam pelo clube, e assistiu a dois jogos das tribunas. Na época, a diretoria merengue sinalizou a intenção de contratar o jovem atacante, que iria para a Europa com a família, por 50.000 euros, mas a negociação emperrou após a renúncia de Florentino Pérez à presidência.
Porém, o interesse do Real Madrid repercutiu no Brasil e fez com que o Santos, temeroso em perder sua revelação, fechasse o primeiro contrato milionário do jogador. “Foi uma grande jogada de marketing para valorizá-lo”, diz Reginaldo Fino, um dos técnicos que descobriu Neymar. “O pai sempre foi inteligente ao negociar as coisas para o filho.” Hoje, Neymar pai, que se refere a Neymar Júnior como “meu cliente”, se orgulha de ter transformado o primogênito em um dos jogadores mais bem pagos do mundo. Ainda sem saber como será acolhido por dirigentes, companheiros e torcedores depois de deixar claro o desejo de não permanecer no PSG, o frenesi de sua passagem por Paris pode se encaminhar, na próxima janela de transferências, para uma nova novela, mas sem final feliz e com desfecho já interpretado pelo craque: a porta dos fundos.
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